O fenômeno da judicialização ganha espaço no mundo
ocidental, devido à crise da representatividade na política diante, por
exemplo, das denúncias de corrupção e do impeachment no Brasil; discursos de
ódio aqui, nos EUA e na Europa; e eleições em que grande dos votos foi de
nulos, anulados, ou elegeram um candidato com perfil mais conservador.
Assim, o Poder Judiciário tornou-se o “muro das
lamentações” do mundo moderno, por tornar possível a reclamação quanto a algum
amparo às reivindicações que são colocadas em “banho-maria” pelo Poder
Legislativo.
A solução seria uma reforma política? Penso que não, já
que estamos em um momento de tanto conservadorismo e expansão da direita e dos
discursos de ódio.
Frente a esses acontecimentos, deve-se lembrar dos
pensamentos de Barroso, que tratou da disfuncionalidade do equilíbrio e dos
pesos e contrapesos no Estado Democrático de Direito, bem como do fato de que o
Direito pode produzir mudanças, mas essas podem ser progressistas ou
conservadoras, isto é, ora se ganha, ora se perde – por exemplo, o Poder
Judiciário legitimou a união homoafetiva, mas não legitimou, ainda, o aborto. É
o ativismo judicial contra a auto-contenção judicial. Isso é a dialética e não
há nada de anormal nisso.
Ademais, para Barroso, considera que, na questão da
judicialização, “o ganho é maior que a perda” (p.2). Afirma ainda que “[...] a
redemocratização fortaleceu e expandiu o Poder Judiciário, bem como aumentou a
demanda por justiça na sociedade brasileira” (p.3); houve um fenômeno de
constitucionalização abrangente, pelo qual matérias, que seriam tratadas apenas
por leis ordinárias, passam a ser tratadas na própria constituição e, segundo o
autor, “[...] constitucionalizar uma matéria significa transformar
Política em Direito” (p.4).
No entanto, as causas ganhas
por meio da judicialização podem ter sua legitimidade democrática questionada. Quanto a
isso, penso que não há fundamentos para tal, já que, segundo Barroso, “a
Constituição brasileira atribui expressamente esse poder ao Judiciário e,
especialmente, ao Supremo Tribunal Federal. A maior parte dos estados
democráticos reserva uma parcela de poder político para ser exercida por agente
públicos que não são recrutados pela via eleitoral, e cuja atuação é de
natureza predominantemente técnica e imparcial. [...] De acordo com o
conhecimento tradicional, magistrados não tem vontade própria. Ao aplicarem a
Constituição e as leis, estão concretizando decisões que foram tomadas pelo
constituinte ou pelo legislador, isto é, pelos representantes do povo” (p.11).
No
mesmo sentido de que o Poder Judiciário não estaria legislando, no início do
mês do mês de novembro deste ano, Carmem Lúcia, ministra do
STF, disse sobre a judicialização da saúde – mas se pode aplicar a fala a
qualquer forma de judicialização: “Estamos aqui para tornar efetivo aquilo que
a Constituição nos garante”, ou seja, estão garantidos na Constituição esses
poderes atribuídos ao Judiciário, e, dessa forma, a judicialização é apenas uma
maneira de garantir anseios sociais que estão sendo ignorados, pelo menos por
enquanto, pelo Poder Legislativo. Assim, o Judiciário tem sido bastante
progressista em relação às demandas que não encontram espaço no espectro
político – a despeito de que a judicialização não substitui a política – o que
é de bastante eficácia perante a tanto conservadorismo percebido no Poder
Legislativo, demoraria ainda mais para que uma lei fosse criada como garantia
das demandas sociais urgentes.
Tal é o caso da união homoafetiva, a qual ainda suscita
grandes discussões, mesmo após ter sido aprovada pela ADPF 132 e pela ADI 4277
no STF. Neste caso, a judicialização garantiu o direito a uma minoria (já que,
segundo o próprio Barroso, “[...] a democracia não se resume ao princípio
majoritário” (p.11-12)), que estava em “banho-maria” no Poder Legislativo e que
dificilmente a aprovaria atualmente por causa de seu conservadorismo.
A união homoafetiva fora aprovada interpretando-se a
Constituição Federal brasileira de modo não reducionista e, assim, não de modo
a restringir direitos, mas abrangê-los, sempre, tentando angariar as demandas
de todas as minorias. (art. 226, CF); com base no art.5º, CF, que garante a
isonomia, o direito à vida, à liberdade e à igualdade; e considerando, também,
a proibição de discriminação das pessoas, a homenagem ao pluralismo, a
liberdade para dispor da própria sexualidade, inserida na categoria dos
direitos fundamentais do indivíduo, a expressão da autonomia de vontade, o
direito à intimidade e à vida privada e a interpretação do art.1723, CC de
acordo com a Constituição Federal.
Portanto, tal decisão encontra respaldos não só em normas
infraconstitucionais, mas também em normas constitucionais, inclusive nas
cláusulas pétreas. Ademais, sua legitimidade é assegurada pelas próprias
determinações que a Constituição faz ao Poder Judiciário e pelas demandas
sociais urgentes de uma minoria excluída em diversos aspectos.
(Dando lugar a emoção... O amor deve ser garantido,
independentemente de qualquer pré-conceito):
Nathalia Neves Escher – 1º
ano de Direito (noturno).
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