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segunda-feira, 23 de novembro de 2015

O poder judiciário como contraponto ao avanço conservador no cenário político-social brasileiro atual: o apelo à efetividade dos direitos fundamentais e das políticas públicas

             O ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso assim conceitua a judicialização, com foco à sua ocorrência no Brasil: é o fenômeno de transferência do exercício decisório quanto à questões de ampla repercussão política ou social das instâncias tradicionais – o Congresso Nacional e o Poder Executivo – para os órgãos do Poder Judiciário. Como condicionamento histórico, Barroso aponta o avanço do neoliberalismo no período pós 2a Guerra Mundial como contribuidor para a geração desse fenômeno, tanto porque o modelo neoliberal implicita o afrouxamento das estruturas de direitos sociais, com a perda do Estado garantidor, e também com vistas ao estabelecimento das Constituições ocidentais como referenciais mais sólidos e fortes do Direito, de modo a disputar espaço político com a arbitrariedade do Poder Legislativo.
Ou seja, judicialização trata-se do apelo popular à juízes e tribunais para satisfazer a necessidade e a expectativa de efetivação de direitos e de políticas públicas; uma vez que parece evidente a crise de representatividade entre as camadas populares e o Legislativo atualmente, como explicitado pela caracterização do Congresso Nacional vigente como o mais conservador desde 1964 pelo Departamento Intersindical de Acessoria Parlamentar (Diap), ainda que em um momento de intensa demanda popular pela diversidade, pluralidade e renovação política.
            A partir dessas considerações, é possível compreender a agenda de atuação do Supremo Tribunal Federal nos últimos anos, como é o caso das decisões em Julgados como o da pesquisa com células tronco, em 2008, e da união homoafetiva, em 2012, a qual esse texto dará enfoque, em que o Judiciário transformou em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) feita pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro quanto ao tratamento e amparo jurídico dado aos casais homoafetivos em decisões judiciais que foram proferidas enquanto negando à essas uniões estáveis o mesmo repertório de direitos garantidos e reconhecidos à uniões estáveis de casais heterossexuais.
Este é um claro exemplo da atuação do Judiciário como agente capaz de interferir nas políticas públicas e integrar o ativismo pela efetividade dos direitos; atuação essa que, caso criticada como prejudicial por “desequilíbrio da harmonização dos poderes” (dentro do que é o conceito montesquieuano da tripartição), encontra como defesa a própria atribuição constitucional dada ao Judiciário de proteger os direitos fundamentais, tanto em aspecto negativo – garantindo a não violação destes – quanto em aspecto positivo – garantindo sua efetiva prestação, além de que a Teoria dos Freios e Contrapesos também salvaguarda o controle mútuo entre os três poderes e, ainda, é legítimo ao judiciário interferir em políticas públicas que visem garantir o “mínimo existencial”  – de acordo com a ADPF 45/DF: “Ementa: arguição de descumprimento de preceito fundamental. [...] Inoponibilidade do arbítrio estatal à efetivação dos direitos sociais, econômicos e culturais. Caráter relativo da liberdade de conformação do legislador. Considerações em torno da cláusula da ‘reserva do possível’. Necessidade de preservação, em favor dos indivíduos, da integridade e da intangibilidade do núcleo consubstanciador do ‘mínimo existencial’ [...]”.
Assim sendo, destaca-se a defesa dos direitos fundamentais manifestada na decisão do STF quanto à ADPF em questão, com base, principalmente, no direito fundamental do indivíduo de liberdade para dispor da própria sexualidade (expressão da autonomia da vontade particular), e na cláusula pétrea declarante do direito à intimidade e à vida privada; bem como no Princípio da Segurança Jurídica, que expressa a necessidade de se sanar a incerteza dos indivíduos integrantes de uma relação homoafetiva (e também do resto da sociedade) quanto ao reconhecimento de sua união em aspecto jurídico.
Apreende-se, então, que a elevada judicialização é um fenômeno reflexo da demanda popular por proteção, condicionado à estruturação social brasileira que, na atualidade, ainda está introduzida em uma lógica de baixa juridificação – conceito de Habermas referente à articulação dos processos macrossocietários com o sistema legal e o poder judiciário (SORJ, 2006, p. 102), isto é, o acesso à justiça e sua resultante efetividade pelas camadas populares. Isso se soma ao fato de que as minorias no Brasil (a população LGBT, mulheres e negros, majoritariamente) enfrentam as barreiras políticas instituídas e sustentadas pela Bancada Evangélica (popularmente, a “bancada BBB” – do boi, da bala e da Bíblia) no Congresso, em um Estado que é constitucionalmente determinado como laico. Faz-se do ativismo judicial, portanto, instrumento de primal importância, enquanto não é revertido esse panorama sócio-político.



Bibliografia:

BARROSO, Luiz Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática.

JUSBRASIL. É possível a judicialização de políticas públicas? Veja o entendimento do STF. 2008. Disponível em: <http://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/153577/e-possivel-a-judicializacao-de-politicas-publicas-veja-o-entendimento-do-stf> Acesso em: 23 nov. 2015.

SORJ, Bernardo. A nova sociedade brasileira. 3a ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006.

SOUZA, Nivaldo. Congresso eleito é o mais conservador desde 1964, afirma Diap. 2014. Disponível em: <http://politica.estadao.com.br/noticias/eleicoes,congresso-eleito-e-o-mais-conservador-desde-1964-afirma-diap,1572528> Acesso em: 23 nov. 2015.


Gabriella Di Piero 
Turma XXXII - Direito (Diurno)



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