Quando alguém fica gripado, diversos sintomas aparecem, –dor de cabeça, dor no corpo, febre–, o organismo inteiro da pessoa é afetado pela doença. Para o sociólogo francês Émile Durkheim, a sociedade é um organismo vivo e funciona independentemente de ações individuais, as consciências particulares agem conforme a consciência coletiva, formando o que ele chama de coesão social. Um organismo saudável está dentro dos moldes da consciência coletiva, mas quando alguém age em desacordo da mesma, o comportamento é considerado desviante, e para que o organismo não adoeça são necessárias medidas que disciplinem essas ações. É nesse contexto que se faz presente o Direito.
Nas sociedades menos complexas
existiam regras de conduta, a coesão social nas mesmas gera a chamada
solidariedade mecânica, em que os indivíduos vivem em harmonia para benefício
de seu grupo e contribuem com a sua cultura, o bem estar geral é priorizado. O
Direito nessas sociedades é chamado por Durkheim de Direito repressivo, que se
apresenta como um agente punitivo, com penas não necessariamente proporcionais
ao delito.
Já nas sociedades mais complexas,
há a solidariedade orgânica, em que há a divisão social do trabalho, diferentes
classes sociais e certa interdependência entre os indivíduos. Como há essa
interdependência, devido ao fato de a sociedade ser um organismo que precisa do
todo para funcionar, o Direito é restitutivo, ou seja, não busca apenas punir o
indivíduo, mas tem a finalidade de colocá-lo nos moldes da consciência social
novamente.
De acordo com o artigo 10 da Lei
de Execução Penal brasileira “a
assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o
crime e orientar o retorno à convivência em sociedade”, portanto, é
estabelecido no Brasil que o propósito da detenção de uma pessoa é reinseri-la
na sociedade. Porém, a realidade nas prisões brasileiras é de caos:
superlotação, rebeliões, locais insalubres e com mais criminalidade ainda.
O Departamento Penitenciário Nacional (Depen) divulgou no
Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), seu sistema de
informações estatísticas, que no período de Julho a Dezembro de 2019 havia um
total de 747.336 indivíduos compondo a população carcerária e, nesse mesmo
período, 442.349 vagas no sistema penitenciário, gerando um déficit de 312.925
vagas. A superlotação faz com que os presos por crimes de menor potencial
fiquem com os outros presos considerados mais perigosos, pelo fato de não haver
uma distribuição individualizada, e eles acabam submetendo-se às facções que
comandam os presídios, com o objetivo de sobreviver em meio àquele caos. Ou
seja, o índice de reincidência aumenta e a criminalidade piora.
Além da superlotação, a corrupção de agentes penitenciários,
que permitem a circulação de dispositivos móveis, entorpecentes e diversos
outros contrabandos, também enfraquece o intuito original da detenção, que se
perde em meio ao crime organizado. Isso, somado também à falta de celeridade do
sistema judiciário, ao racismo estrutural e ao inexistente apoio ao
–teoricamente– ressocializado a inserir-se no mercado de trabalho, transforma a
prisão em uma escola do crime.
Assim, conclui-se que o sistema prisional brasileiro não está
colocando os indivíduos nos moldes da consciência social novamente,
fazendo com que o organismo vivo da sociedade e seu funcionamento coeso seja
prejudicado, pois, segundo Durkheim “em consequência de sua dependência mútua,
o que atinge um atinge os outros e, assim, toda mudança um tanto grave adquire
um interesse geral.” (p.213).
Referências:
DEPEN, Departamento Penitenciário Nacional. Infopen:
Levantamento Nacional. Disponível em: <http://depen.gov.br/DEPEN/depen/sisdepen/infopen>.
Acesso em 07 ago. 2020.
DURKHEIM, Émile. Da Divisão do Trabalho Social. 2 Ed.
São Paulo: Martins Fontes, 1999.
SOARES, Samuel Silva Basilio. A Execução Penal e a
Ressocialização do Preso. Disponível em: <https://ambitojuridico.com.br/edicoes/revista-156/a-execucao-penal-e-a-ressocializacao-do-preso/>. Acesso em 07 ago. 2020.
VILLAS
BÔAS FILHO, Orlando. Tomo Teoria Geral e Filosofia do Direito. Émile
Durkheim. 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
2017. Disponível em: <https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/140/edicao-1/emile-durkheim>. Acesso em 07 ago.
2020.
Bianca Vipieski Araujo - 1º Ano de Direito - Matutino
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