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sábado, 8 de agosto de 2020

Entre fato social e influências comportamentais

        Para Émile Durkheim, importante sociológo do século XIX e considerado um dos fundadores da sociologia, a sociedade impõe-se ao indivíduo determinando suas ações. Portanto, as ações individuais são desprezíveis para a sociologia: a essa interessa as ações que são de natureza social. Além disso, para ele, a sociologia deveria ser uma ciência da realidade, e, para isso, defendia a objetividade do pesquisador em relação ao seu objeto, ou seja, o sociólogo deve distanciar-se de seu objeto e interpretar a sociedade e os fatos sociais como coisas. Desse modo, antes de começar a análise social tal pesquisador já teria pressupostos, pré-noções e conhecimento dos fatos.

        Nesse contexto de imposição da sociedade ao indivíduo, é inquestionável que, a partir do momento em que uma pessoa é inserida na sociedade, torna-se impossível que ela se desvencilhe dos fatos sociais. Tais fatos sociais, por sua vez, são todos aqueles que independem do indivíduo e têm como substrato o agir do homem em sociedade, de acordo com as regras sociais. Eles influenciam, portanto, na maneira de agir, pensar e sentir dos cidadãos, imprimindo no cotidiano códigos de compartamento, gostos e as estatísticas que representam a dinânima social.

        Ademais, é válido apontar que um fato social apresenta sempre três características: coercitividade (o fato social exerce uma força sobre os indivíduos, inclusive levando-os a adotar determinado comportamento; se a pessoa não corresponde a esse padrão, ele sofre uma sanção - seja ela legal ou espontânea, na medida em que a resistência é seguida pela reação punitiva que busca reestabelecer a norma); generalidade (o fato social existe para a coletividade, por isso ele acaba resultando em tendências comportamentais e padrões como moda, idioma e hábitos alimentares) e, por fim, exterioridade (os fatos sociais são sempre externos aos indivíduos e estranhos a ele, parecendo que sempre existiram. Dessa forma, tais fatos não dão às pessoas possibilidade de escolha e argumentação, devem ser aceitos e pronto - caso contrário, a pessoa sofrerá coerção).

        Desse modo, segundo Durkheim, todas as ações humanas, por mais individuais que pareçam, são condicionadas para serem socialmente aceitas e muitos pensamentos, sentimentos e comportamentos que nos parecem individuais e nossos, são, na verdade, sociais, traduzindo hábitos de origem coletiva. Diante desse contexto de reproduções de um modelo coletivo, tem-se que o enraizamento de um fenômeno está inscrito na estrutura social. Desse modo, diversas instituições modernas acabam influenciando e impondo visões e comportamentos aos indivíduos, aos quais não se chegaria espontaneamente. Assim, a escola, a família, o estado e os grupos coletivos em que as pessoas estão inseridas, por exemplo, imprimem regras que acabam sendo interiorizadas e enraizadas na sociedade, uma vez que, para manter a ordem e evitar o estado de anomia, as regras devem estar naturalizadas no pensamento coletivo. Para exemplificar tal situação tem-se sociedades consideradas tradicionalistas nas quais a propagação de ideais preconceituosos são, muitas vezes, comuns, como em sociedades patriarcais e racistas, onde indivíduos, desde seus nascimentos, são ensinados e moldados, mesmo que de forma implícita e inconsciente, a reproduzir  tais valores.

        Prova disso, é a sociedade estadunidense racista, patriarcal e conservadora dos anos 1970, que condenou a então militante de movimentos negros e feministas e professora Angela Davis, por crimes (de sequestro, conspiração e homicídio) os quais ela não cometeu, ou seja, evidenciando os preconceitos do sistema norte-americano, em que frequentemente negros eram acusados de crimes que não cometiam e eram vítimas de uma sociedade marcada por extrema repressão racial em que indivíduos, na verdade, eram exemplo da mecanicidade social de um sistema extremamente excludente. Analogamente, pode-se comparar essa sociedade conservadora dos anos 1970 com muitos governos da atualidade, ainda muito racistas, xenofóbicos, homofóbicos e machistas, inclusive com o próprio Estados Unidos, e com o Brasil, onde práticas preconceituosas e visões de mundo retrógadas persistem.

        Em suma, é evidente que a partir do momento que um indivíduo é inserido em uma sociedade, ele é moldado com os valores e fatos sociais existentes em tal cultura, passando, portanto, a reproduzir compartamentos dominantes, enraizados e aceitos nessa esfera social, ou seja, sendo muito (mas não totalmente) influenciados pelo meio em que vivem. Por fim é válido ressaltar que é muito importante que tais conservadorismos e preconceitos sejam superados nas sociedades para que os cidadãos possam viver com dignidade, contudo, como já argumentado no presente texto, para que isso aconteça, mudanças individuais e isoladas possuem um papel sucinto, isto é, para que haja perspectiva de mudança na conjuntura da sociedade é necessária uma mudança estrutural e coletiva, e, dessa forma, os novos fatos sociais de tal cultura poderão traduzir uma realidade mais plural e igualitária. 


Mariana Antonietto Alvares Cruz - 1º Ano Direito - Matutino

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