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domingo, 10 de junho de 2018

A transformação dentro do espaço dos possíveis


                O Ministro Ricardo Lewandowski, em seu voto, defende que o direito para o caso de interrupção terapêutica da gestação de fetos anencefálos não deve ultrapassar a lei.
“Compreender os textos, incluindo os normativos, exigem um esforço hermenêutico de quem quer dele extrair sentido. Logo raramente o espírito da lei se revela de imediato. É preferível interpretar a lei conforme a Constituição ainda mais se tratando de preceitos oriundos daqueles que a produziram: o legislador.  Não pode o interprete confrontar-se com a lei. Muito menos contrariar o legislador ou substituí-lo”.
Mais adiante o Ministro destaca a importância do legislador, pois
“O poder legislativo tem o poder e o batismo popular e não o judiciário. É o legislativo quem cria o direito positivo e rege as relações sociais. A interpretação só é válida quando existe espaço para ela. Não se admitindo jamais interpretação contra a lei”

                Percebemos pela fala do Ministro Lewandowski a defesa de limites de interpretação, tornando o direito mais independente e autônomo, enquanto também constatamos, à luz de Bourdieu, o direito como “espaço dos possíveis”. Afinal, é possível a transformação do direito?
                Bourdieu, compreende que o direito é uma ciência que deve evitar o instrumentalismo e o formalismo. Critica Kelsen e seus seguidores, devido ao entendimento de que o direito possui autonomia e independência, por isso estaria alheio às pressões sociais, tendo nele mesmo seu fundamento. E, critica Marx e seus seguidores por acusarem o Direito como ferramenta a serviço de uma classe dominante.
                Na perspectiva do autor, o campo jurídico se constitui em uma dupla lógica. Neste campo é que se dá o conflito de forças e recorre a ele quem necessita e é por meio de sua lógica interna de obras jurídicas que se delimita o conflito, tornando-o em um “espaço dos possíveis”. No julgado, por exemplo, vemos o Conselho Nacional dos Trabalhadores de Saúde recorrendo ao judiciário para modificar o entendimento da justiça, que é o de criminalizar os profissionais que interrompem a gestação de fetos anencefálos, que não alcançarão a vida extra-uterina. Logo, é um setor da sociedade que encontra espaço no universo jurídico para lhe solucionar um problema.
                Ademais, analisamos os limites à hermenêutica no campo jurídico, quando os magistrados a condiciona a interpretação em um espaço dos possíveis. É o caso do Ministro Lewandowski, quando se posiciona contra a interrupção da gestação à luz do Código Penal, como no caso do relator, o Ministro Marco Aurélio, quando interpreta os direitos à saúde, à liberdade, à dignidade da mulher à luz da Constituição Federal. De acordo com Bourdieu, “no texto jurídico estão em jogo lutas, pois a leitura é uma maneira de apropriação da força simbólica que nele se encontra em estado potencial”.
                Soma-se a essa constituição do campo jurídico, ou seja, a assimilação social e transformação balizada em seu próprio universo, a eficácia. Se a transformação corresponde à realidade. Isto é, se a dinâmica da lei tem probabilidade de êxito, se aquilo que se evoca advém da vontade.

Murilo Marangoni, aluno da XXXV Turma Direito – Matutino
Franca, 10 de junho de 2018

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