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sábado, 31 de agosto de 2019

Reintegração de terras e Epistemologias do Sul


A realidade atual foi toda construída visando a perpetuação e o sucesso da lógica capitalista que tanto beneficia um seleto grupo de indivíduos na contemporaneidade. A organização política, influência midiática, e é claro, o ordenamento jurídico, são mecanismos utilizados para alcançar esse fim. Em sua tese, Sara Araújo reflete acerca da ação do direito dito ocidental, o eurocêntrico, na manutenção das amarras coloniais e imperialistas existentes desde o século XV.
Há uma constante hipervalorização do direito “posto”, positivado, com fortes influências europeias; e a conseqüente desvalorização daquele considerado como “local”, que expande as ferramentas para a resolução de conflitos (deixam de usar apenas o meio judicial), e busca uma justiça verdadeiramente mais justa, ao invés de favorecer, na maioria das vezes, os donos do poder e do capital. Enquanto o primeiro está ligado à ideias de monoculturas (tanto as literais, quanto as figurativas), produtividade e lucro; este se volta para a Ecologia dos Saberes, valorizando as Epistemologias do Sul (o conhecimento e modo de produzir tal conhecimento que estão fora das discussões centrais, sendo, muitas vezes, considerados inferiores).
É conforme essa visão que podemos analisar o Agravo de Instrumento nº 70003434388 do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ajuizado pelo senhor Plinio Formighieri, na busca pela reintegração de terras de sua propriedade em Passo Fundo, RS, que fora ocupada por membros do MST. Tal pedido foi negado pelo tribunal da região após a comprovação da improdutividade da dita terra, baseando-se na função social da propriedade (condição sob a qual a propriedade é utilizada para o “bem social”, ou seja, mesmo pertencendo e dando lucros a particulares, possui um impacto positivo no resto da sociedade, sendo a produção de alimentos um bom exemplo), presente nos art. 5º (inciso XXIII) e 186 da Constituição Federal de 1988.
Apesar de se tratar de uma norma já positivada, é possível enxergar a construção de uma nova exegese da norma, voltada para os conceitos de Epistemologia do Sul, na qual os direitos sociais (moradia, subsistência) são postos acima de alguns outros particulares (posse da propriedade, independente de nenhum outro critério, como produtividade). Nessa situação, e em tantas outras que envolvem a desapropriação de terras, ou a negação de um pedido de reintegração de posse, vemos o bem coletivo sendo colocada acima dos interesses do mercado, contrariando a lógica capitalista liberal; sendo esse um aspecto positivo para Sara Araújo.

Julia Parreira Duarte Garcia - Direito Matutino

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