Resumo do caso real: A PGR, em 2019, suspendeu liminar impetrada pelo TJ-
RJ para proibir venda e circulação e propunha a apreensão de livros infantojuvenis sob a
alegação de conteúdo homotransafetivo das publicações citadas supostamente danoso
para o público amparado pelo Estatuto da Criança e Adolescente.
Em sua argumentação a PGR defende que:
- o ato da prefeitura do Rio de Janeiro (cidade à época governada por Marcelo
Crivella) fere frontalmente a liberdade de expressão e o direito à informação, além de
ser discriminatório contra diversas pessoas por suas orientações sexuais e identidade de
gênero, além de ferir à CF em seus artigos 5 e 220;
- a ADI 4.275 reiterou que o direito à igualdade sem discriminações a liberdade
de identidade de gênero;
- há impossibilidade de invocação do ECA (Estatuto da Criança e do
Adolescente), pois o tema em questão não é agressivo a valores éticos da família;
- não cabe ao Estado definir previamente o que pode ou o que não pode ser dito
por jornalistas e indivíduos;
- existe irrestrito amparo dos tribunais a relacionamentos homoafetivos
(formação de família) e impossibilidade de definir como inadequados os conteúdos dos
livros, pois o artigo 79 do ECA trata de bebidas alcoólicas, tabacos e munições;
- a decisão do TJ-RJ relaciona que conteúdos homoafetivos seriam inadequados
à infância e à juventude.
A decisão do TJ-RJ causou reação contrária por parte de:
- Aliança Nacional LGBTI+ (https://www.metropoles.com/brasil/direitos-
humanos-br/entidades-lgbt-acusam-crivella-de-pratica-de-censura-e-homofobia) e;
- Felipe Netto, blogueiro e influencer que adquiriu vários livros e depois os
distribuiu.
É possível perceber relação da reação da PGR contra a decisão do TJ-RJ e contra
a ditatorial atitude do prefeito do Rio de Janeiro que mandou recolher, bem como as
reações de grupos, como a Aliança Nacional LGBTI+, com o texto de Michael
McCann, que trata de mobilização do direito como estratégia de ação coletiva. Vejamos:
- aumento da demanda por conhecimento de direitos e garantias individuais por
parte da sociedade, o que McCann interpreta como necessidade de advocacia
organizada. No caso da Bienal do RJ de 2019, a tentativa de censura por parte da
prefeitura do RJ (amparada por decisão do TJ-RJ) é tão indecente que parte da
sociedade reagiu, pois princípios democráticos são valores inegociáveis e os preceitos
do artigo quinto da CF é assunto sobejamente disseminado pela sociedade;
- fortalecimento da atuação de tribunais decorre de sociedades complexas, com
interesses diversos. O tema do já citado artigo quinto da CF e sua importância histórica
nas últimas três décadas é fator de atuação dos tribunais (no caso a PGR), especialmente
em um país saído de ditadura militar com ambiente de cerceamento de liberdades
coletivas e individuais;
- tribunais, apesar de reativos, são fundamentais para o funcionamento de
escolhas políticas de uma sociedade. A escolha política pela liberdade de opinião e de
organização familiar preconizada pela CF de 1988, foram escolhas da Assembleia
Nacional Constituinte de 1985-1988. A importância história de tal carta deve ser
preservada pelos tribunais. Isso é uma fortíssima opção de preservação pela estabilidade
do texto magno brasileiro;
- a reação contrária de grupos LGBTI+ à tentativa medieval prepretada por Pr.
Crivella de recolhimento de livros pode ser interpretada como o direito
instrumentalizado para reivindicações e mobilizações sociais. Ou seja, no texto de
McCann, o usuário dos tribunais (grupos LGBTI+) lançou mão do conceito do direito
como recurso de interação social e política, configurando a mobilização por direitos;
- a decisão da PGR em nível estratégico foi marcante, pois analisou a reação da
sociedade contra a decisão do TJ-RJ e em nível de poder constitutivo da autoridade
judicial também, pois ao suspender a proibição estadual apresentou visões
encorajadoras da defesa dos direitos e garantias individuais preconizadas pela CF;
- os precedentes legais considerados pela PGR, como a organização familiar
homoafetiva, intensificaram a demanda de retorno da circulação dos livros
supostamente ofensivos (interpretação do Pr. Crivella);
- decisão mostrou-se de destacado vigor democrático, pois ratificou preceitos da
carta maior de 1988 em seu artigo quinto.
- McCann destaca que no Brasil o maior poder dos tribunais pós CF-88 pode ser
explicado como maior acesso de partes mais vulneráveis socialmente ao direito, o que
pode aumentar a pressão sobre os tribunais por celeridades de decisões. Muitas vezes,
os tribunais podem silenciar-se para a massa de cidadãos comuns e que o status quo
nem sempre é instigado por provocações. No caso da Bienal do RJ de 2019, a
velocidade foi adequada.
CURSO: DIREITO – Período Noturno
Disciplina: Sociologia do Direito
Ricardo Camacho Bologna Garcia – Número UNESP: 211221511
Nenhum comentário:
Postar um comentário