O presente texto busca correlacionar a Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI 6.987 com a sociologia jurídica de Michael W. McCann. A referida ADI é atinente à equiparação da injúria racial ao racismo, como crime inafiançável e imprescritível.
Primeiramente, para McCann, a abordagem mais adequada para o entendimento do poder dos tribunais na contemporaneidade é a abordagem institucional histórica. Em síntese, isso significa que, nessa perspectiva, a atuação dos tribunais deve ser compreendida à luz de “complexidades e contingências das diversas conjunturas políticas e contextos históricos”. Com efeito, um dos conceitos essenciais dessa linha de pensamento do pesquisador é o de mobilização do direito, isto é, uma demanda passa ao âmbito jurídico em uma ação ou um conceito próprio do Direito. Os “usuários” (sujeitos de direito) se mantêm no centro desse processo, mas utilizam o Direito como meio de concretização para seus fins. Essa mobilização acontece em dois níveis, que não são excludentes, mas, sim, complementares: na dimensão estratégica e na dimensão constitutiva.
No plano estratégico, pois não determinam as ações judiciais que serão geradas, mas apenas ajudam a traçar o panorama no qual essas demandas seguirão seu curso, dentro de todo um contexto sociopolítico que as engloba. Já o plano constitutivo, devido a sua colocação dentro do contexto social, apropriando-se, conforme judicializadas as demandas, de pautas e formando um vocabulário particular atinente a determinado tema que foi objeto de sua análise. Como dito por McCann, “os tribunais determinam e convidam membros da sociedade, indivíduos , grupos, organizações a compartilhar um modo de ver, conhecer e falar”.
Na ADI previamente mencionada, todos esses aspectos podem ser observados. A mobilização do direito na dimensão estratégica, pois, ao equiparar a injúria racial ao racismo, isso molda as ações estratégicas do campo político em direção não somente a uma postura não-discriminatória, mas que luta ativamente e propõe ações contra as discriminações frequentemente observadas, como a do posto de gasolina. Também, no plano constitutivo, pois visa a responder uma demanda já existente de busca por reparação de danos históricos à população preta, conferindo a esse movimento uma nova roupagem por meio da linguagem jurídica. Nesse sentido, muito ilustrativo é o posicionamento do advogado Paulo Iotti, que sustenta a ideia de uma ofensa ao decoro do indivíduo (injúria) ser sempre uma ofensa à coletividade (racismo), de forma indireta
Assim, é possível concluir que o papel dos tribunais também, em certa medida, é de conferir ou restringir elasticidade aos conceitos, dado o panorama histórico em que está alocado. Mas, também, acaba por incitar movimentos estratégicos de grupos, em termos de recuos ou avanços em seus posicionamentos e propostas políticas. Com efeito, trata-se da dualidade e da amplitude da abordagem institucional histórica.
Isabela Mansi Damiski – matutino 2º semestre
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