Total de visualizações de página (desde out/2009)

quinta-feira, 28 de junho de 2018

A ocupação do direito na sociedade contemporânea


Observando a realidade brasileira contemporânea, nota-se que há entre os indivíduos uma divergência social dispare, derivado, principalmente, do acesso à posse e propriedade da terra, enquanto uns possuem muita terra, outros se subordinam para viverem nelas. Boaventura relata em seus estudos que para chegar nessa estrutura, no decorrer da história, o direito e o sistema judicial foram utilizados para legitimar e consolidar essas situações injustas, incidindo no direito dos 99%, os menos favorecidos, e dos 1%, os mais favorecidos. Em sede disso, o autor acredita em uma mudança social, isto é, processos políticos cujo objetivo é incluir na sociedade os grupos sociais isolados socialmente, visando a concretização de uma justiça social, para tanto os movimentos sociais são de suma importância para a mobilização desse direito que por muito tempo desigualou os entes, acarretando em uma hermenêutica diferenciada, derivando em movimentos contra-hegemônicos. Sabendo disso, movimentos como o MST (Movimentos dos Trabalhadores Sem Teto) cumpre a função de mudar o paradigma vigente, estimulando a ocupação do direito.
Em meados de 2001, por meio de um agravo de instrumento interposto por Formiguieri, o poder judiciário lidou diretamente com o que foi retratado por Boaventura e posicionou-se favorável a mudança social, negando o agravo. No caso, os envolvidos relatam que a sua propriedade foi ocupada por pessoas que são membros do MST, isto é, pessoas que não possuem residência e propriedade, e acabam ocupando o território. Em termos legais, seguindo a letra da lei, essa ocupação é ilegítima, pois fere um dos princípios constitucionais, todavia, nesse caso, também é inconstitucional a situação na qual a propriedade se encontrava e a situação dos membros do MST, uma vez que o direito a uma vida digna não foi concretizado, afinal, a moradia é o pilar da dignidade. Os desembargadores em todo momento seguiram o princípio constitucional da função social da propriedade, que incide no fato de que a propriedade deve deter de uma utilidade. Ou seja, a propriedade que foi ocupada não exercia função social e com a chegada do MST passou a possuir isso.
Essa decisão recai sobre um direito contra-hegemônico. Ao longo da história do MST, poucos juízes foram favoráveis àqueles que Boaventura chamaria de 99%, uma vez que a estrutura social começou a mudar com o advento da Constituição de 1988 que engendrou diversos elementos dos direitos de caráter cosmopolita, os diretos humanos. Nessa nova organização, as universidades começaram a ensinar aos futuros doutrinadores e operadores do direito conceitos que tangenciam as novas propostas e demandas sociais, entre elas a função social da propriedade. Isso fortaleceu os movimentos contra-hegemônicos, entre eles o MST, que encontrou nessas lacunas que demandam de interpretação, uma forma de ocupar o direito. Como no caso apresentado, o direito à moradia foi conquistado, correlacionando a propriedade com a função social. Para tal ato, houve a necessidade do acesso à justiça, algo que começa a ser acessado pela população. Tudo que foi salientado, condiz com o que Boaventura chama de direito reconfigurativo, isto é, remodelar a hegemonia presente, utilizando de artifícios que o próprio direito concede.
Sendo assim, Boaventura acredita que determinados grupos podem angariar ganhos superiores em relação as restrições que detinham até determinado momento, emancipação por meio do direito. Para isso os movimentos sociais devem estabelecer estratégias políticas e jurídicas, como ocupações coletivas, como feito no caso exposto, a Fazenda Primavera, e mobilizar de maneira proativa o judiciário, estabelecendo recursos que apresentam reinvindicações em prol do cumprimento do direito que foi positivado na Constituição Cidadã, a título de exemplo: direito à moradia e a exigência do cumprimento da função social da propriedade. Dessa forma, para Boaventura, a mudança social virá com o uso do direito como instrumento emancipatório e com a reformulação da democracia, reconfigurando as relações de poder, quando o direito que os 1% possuem passarem a ser usados em prol dos 99%.

Joelson Vitor Ramos dos Santos - Matutino, Turma XXXV


Nenhum comentário:

Postar um comentário