Os fatores que engendram as lutas
sociais foram amplamente discutidos ao longo da história: para os positivistas,
representavam uma desordem na estrutura social; já Karl Marx as interpretava
como uma dialética natural entre as classes oprimidas e dominantes; Pierre
Bourdieu, por outro lado, entendia essas lutas como um condicionamento
conflitante entre as relações simbólicas.
Traz um novo entendimento, nesse
sentido, o sociólogo Axel Honneth. Para ele, as mobilizações sociais não se dão
somente por interesse como os conflitos de classe, mas se movem a partir das lesões
dos sentimentos morais que impulsionam a luta, primeiramente individuais e
depois coletivos. Isto é, no momento em que o sujeito tem sua condição de igual
negada perante os demais devido a alguma particularidade sua, ele passa a
buscar um reconhecimento. Esse desrespeito, contudo, não fica apenas no âmbito privado,
já que através de uma ponte semântica cria-se uma identidade coletiva, uma
comunidade em que a dor é sentida por todos aqueles que não tem seus valores
legitimados pela sociedade.
À luz da formulação de Honneth,
assim, é possível entender como exemplo dessa luta o caso do casamento
homoafetivo, discutido pelo Supremo Tribunal Federal em 2011, o qual resultou
na legalização da união de pessoas do mesmo sexo, garantido aos homossexuais o
mesmo tratamento de casais heterossexuais. Essa busca por uma igualdade
civil-moral desse grupo, ademais, tenta abranger o ‘’pluralismo
sócio-político-cultural’’ da nossa sociedade atual desenvolvendo o sistema
democrático representando a respeitosa convivência dos contrários.
Os ministros, por fim, entenderam seu
veredito estava em conformidade com a Constituição Federal, na medida em que
ela proíbe o preconceito e prevê que cada um deve dispor de seu aparelho
reprodutivo como bem quiser. Ademais, a Carta Magna protege em seu Art. 1º,
inciso III, a dignidade da pessoa humana, assim como o direito à intimidade, à
privacidade, à liberdade e a livre disposição da própria sexualidade, trazendo
a aplicação de diversos Direitos Humanos na hermenêutica do texto
constitucional. A decisão final da Suprema Corte, portanto, foi imprescindível para
que mais uma minoria tivesse seus valores validados e legitimados perante a
sociedade, cessando a lesão aos seus sentimentos morais.
Axel Honneth, outrossim, consta que
existem três dimensões para o reconhecimento: a primeira é o amor materno (primeiros
contatos com o afeto que traz um sentimento de autoconfiança primordial), a
segunda pelo Direito (ocorre quando o sujeito expande sua estima social atingindo
o Estado, isso gera um respeito para consigo mesmo, uma vez que ele entendo que
a mesma lei que o rege também rege a vida dos demais) e a terceira, por fim, é
o reconhecimento dos pares que leva a uma solidariedade ou estima social.
Aqueles que sentiam atração por
indivíduos do mesmo sexo, dessa forma, antes do veredito do julgado, estavam
sujeitos a uma dupla lesão, uma vez que não possuíam nem o reconhecimento do
Direito e nem de seus pares. Isso leva, por conseguinte, a uma busca desse
grupo por uma luta de efetivação de seus valores no meio jurídico, pois, não obstante
não tenha o reconhecimento do todo, ao menos a força da lei lhe é favorável. Ademais,
quando a identidade se torna coletiva, o sujeito passa a ter seus valores
legitimados dentro do grupo, o que traz um empoderamento e um reconhecimento
antecipado, bem como uma perspectiva futura de legitimação social.
Os homossexuais, assim, constituem
um conjunto de pessoas com uma determinada identidade psíquica que demonstram
que a afetividade supera a biologicidade, a qual independe de qualquer vontade
por ser mecânica e automática. O conceito de família, além disso, também se
torna mais abrangente e subjetivo, pois é um fato cultural e espiritual, não necessariamente
biológico, portanto, entende-se que a união heteroafetiva não representa o
único tipo de entidade familiar possível e que legalizar o casamento entre as
pessoas do mesmo sexo não fere o direito dos casais compostos por indivíduos de
sexos diferentes, portanto, não há nenhum tipo de dano social na decisão do
Tribunal.
Diante do supracitado, por fim, conclui-se
que, a partir da perspectiva de Honneth, a legalização do casamento homoafetivo
se traduz em uma luta pelas condições intersubjetivas de integridade pessoal, objetivando
a validade dos sentimentos morais do indivíduo que aspira atingir todas as dimensões
de reconhecimento previstas pelo sociólogo.
LÍVIA MARINHO GOTO - TURMA XXXV- MATUTINO
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