No
período dado como atual, faz-se presente comportamentos, muitas vezes esporádicos,
conservadores a fim de uma prévia determinação de comportamentos sociais,
determinando, assim, o que é concebido como certo ou errado. Vê-se, ainda, uma
nova cadência que busca uma vigência de padrões de um intimo grupo social a determinar
os conceitos morais. Logo, por consequência é de se notar a presença relativa
de um avanço conservador – a se ignorar os conceitos econômicos – no pensamento
majoritário da sociedade brasileira.
Em
vista disso, questionamentos são elencados, muitas vezes diante de um dado
discurso relativo entre o progressismo e o conservadorismo, a respeito do ditame
da vida em sociedade, conceitos sobre certo e errado ou sobre os preceitos morais
e valorativos que afirmam a vigência constitucional do ordenamento jurídico em
associação com a sociedade. Tem-se como um destes, um tema de grande importância
e relevância no cenário da modernidade, não só no Brasil como no mundo todo. Esse
tema é o aborto.
Atualmente,
a questão do aborto tem ultrapassado os limites que o delimita como uma questão
criminal, que teria por infringir o conceito de vida. O aborto, passa, agora, a
fazer parte das considerações pessoais de cada gestante – ou melhor, de cada
mulher – como uma escolha que engloba tanto a respeito da liberdade de
expressão como a questão de ter autonomia quanto ao seu próprio corpo. De antemão,
o aborto é tipificado como conduta criminal no Código Penal dos artigos 124 ao
128, nessa diagramação normativa há diversas espécies de aborto a serem tratadas
e associadas a penas privativas de liberdade.
Contudo,
um fato primordial a ser levado em conta é o seguinte: o aborto não deixa de
ser realizado só por ser tipificado como um crime, assim como assassinatos, latrocínios
ou, até mesmo, a sonegação de impostos. Entretanto, em uma sociedade em que o
aborto não é regulamentado, mas sim criminalizado ocorrerão casos de que, na clandestinidade,
um alto número de mulheres sujeita-se a correr um grande risco de morte, visto que
não há a devida regulamentação dos procedimentos e clinicas abortivas. Sendo assim,
há inúmeros dados de países nos diversos continentes que adequaram o aborto e
são satisfatórias as condições de vida dos habitantes em questão.
“Um estudo
inédito da Organização Mundial da Saúde (OMS) concluiu que países com leis que
proíbem o aborto não conseguiram frear a prática e que, hoje, contam com taxas
acima daqueles locais onde o aborto é legalizado. Já nos países onde a prática
é autorizada, ela foi acompanhada por uma ampla estratégia de planejamento
familiar e acesso à saúde que levaram a uma queda substancial no número de
abortos realizados.”
Diante da disposição dos fatos trabalhados, há no dado momento
presente, em primeiro caso, a aprovação da PEC 181 que criminaliza os casos de
abortos em que o feto é oriundo de estupro. Todavia, os resultados são oriundos
de uma votação de 19 integrantes, onde 18 votaram a favor e apenas 1 integrante
contra. Um fato de útil conhecimento é que apenas 1 integrante era mulher e votou,
esta, de forma contrária.
Outro caso que envolve o aborto é a ADPF 54 que busca interpretar uma
possível violação de preceitos fundamentais oriundos de uma
inconstitucionalidade dada pela criminalização de abortos em casos de fetos anencefálicos.
Esta um pouco menos atual do que a anterior, foi posta em questionamento no que
tange sua constitucionalidade no STF, onde o resultado procedeu-se favorável perante
o descumprimento de preceito fundamental.
Ambas situações foram determinadas por votos, de pessoas oriundas
de diversos moldes sociais. Devido a isto, uma alusão sociológica, vinda do pensador
francês Pierre Bourdieu, emerge em vista de todos os discorrimentos tratados. O
conceito de habitus, mantendo-se no
olhar legislador da PEC 181 ou no olhar que concerne ao judiciário na
respectiva ADPF, o fato de como as pessoas que formam e delimitam padrões
sociais, são influenciadas pela própria sociedade, podendo-se dizer: uma
estrutura estruturante. A forma de se comportar segue padrões sociais e se
delimitam devido as concepções, próprias, de vida de cada deputado que votou
contra a referida PEC ou a cada ministro. Exemplo disso é que a única mulher da
comissão votou contra, bem como a afamado voto feminista da Ministra Cármen Lúcia.
O habitus, deste modo, se torna mais
evidente, onde é possível delinear que: as aspirações sociais são transcendidas
nas atitudes tomadas por elas. Os 18 deputados que participaram da PEC, por sua
vez são de maioria evangélica, não obstante serem homens, são a maioria
influenciados por vieses religiosos, que expressam um outro habitus, que como estrutura
estruturante, influenciam a modulação da sociedade.
O capital cultural, também tratado por Bourdieu, se mostra como um
fator importante nas determinantes formas de mudança social. A moeda de dominância,
que se dá pela cultura implica na estratificação social velada. Ao se dar um
maior foco a ADPF 54, ou em todos os casos que o STF atua, há uma distinção no
comportamento, voto e ideal de cada ministro lá presente, com comportamentos
que se expressam como culturalmente elitistas ou como mais simplórios, como as
participações dos ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli, respectivamente,
devido ao fato sujeição de situações que cada um passou na vida.
As formas de pensamento em relação com o direito ao determinar a
mudança social, apresentam-se como voláteis. O habitus faz-se real e presente nestas expressões sociais. Os
operadores do direito partem da constituição dele, a partir da influência que
sofreram com o tempo e sofrem cotidianamente, sendo um fator essencial para a
transformação social. O Direito então, a Bourdieu, tende a divergir do que foi
postulado por Hans Kelsen, como algo independente do social, como o direito
puro; o direito, na verdade, por mais que seja estático, ele é adequado e
modulado a sociedade, que não se encontra nas mesmas formas.
Em suma, o instrumento judiciário, no Brasil, tem como ultimo a
definir os moldes legislativos, como algo constitucional ou não, devido ao seu
controle de constitucionalidade. A diferença crucial entre a PEC 181 e a ADPF
54 é que a primeira se encontra no âmbito legislativo, e a segunda no âmbito jurídico.
A dicotomia citada no início do texto, logo, faz-se presente devido a percepção
de que há, uma vez que a ADPF 54 foi julgada procedente, a dicotomia entre conservadorismo
e progressismo na realidade atual. O direito, entretanto, deve ser elucidado
como mais importante, por em situações extremas poder dialogar e mudar uma consideração
tomada no legislativo, e nesse caso o parecer que se elucida é de que há uma concepção
liberal no poder judiciário que emana de constatações advindas dos preceitos
individuais de cada um que forma o direito e em seu todo social constrói outra
realidade. As demandas sociais, também, quando por necessidade devem ser
satisfeitas pelo direito, fazem com que o próprio direito e seus operadores se
tornem sujeitos a uma flexibilização, a fim de adequar-se a sociedade. O habitus se emana de forma velada na
crença de cada ministro do que tem por ser como certo e errado, bem como nos
intuitos de cada deputado.
Referência: http://saude.estadao.com.br/noticias/geral,paises-que-liberaram-aborto-tem-taxas-mais-baixas-de-casos-que-aqueles-que-o-proibem,10000050484
Pedro Henrique Lourenço Pereira - Matutino
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