A
questão da opção sexual e diversidade de gênero nunca foi tão discutida. No
século XIX surgiram inúmeros movimentos questionando a imposição de padrões
pela sociedade e religião, como o movimento Hippie, forte defensor da liberdade
sexual na década de 60; o avanço da ciência, que tornou possíveis cirurgias de
transgenitalização, acalorou as discussões acerca da liberdade sexual e
diversidade de gênero. É nesse âmbito que a discussão da questão de gênero passa
a ser necessária na esfera do Direito. A necessidade de acatar as demandas dos
grupos sociais emergentes, como os transsexuais, trás à tona o pensamento
weberiano em que a formalidade do Direito, responsável por universalizar a
razão, seria uma espécie de tipo-ideal: essa formalidade é pressionada a se
distender para atender ao interesse de inúmeros grupos, das inúmeras
perspectivas de razão, e, nesse caso, a atender ao interesse desse novo grupo
social que são os transsexuais.
Destarte,
analisar-se-á uma decisão do juiz Fernando Antônio de Lima acerca da mudança de
sexo sob a perspectiva weberiana de Direito. O julgado trata da concessão de
tutela antecipada para cirurgia de mudança de sexo, alteração de prenome e
gênero. Essa decisão foi baseada em alguns argumentos defendidos pelo juiz. Um
dos pontos mais importantes na fundamentação da decisão foi a defesa do Direito
Fundamental à identidade, que estaria implícito na Constituição a partir de
outros Direitos Fundamentais como o direito à dignidade; essa perspectiva de interpretação
do Direito, não meramente aplicando os Direitos Fundamentais explícitos, mas
dele deduzindo outros Direitos implícitos está ligado a uma racionalidade
material que leva em conta outras perspectivas de razão, valores, etc.; há a
aceitação de outras compreensões acerca do gênero e não apenas a tradicional em
que o que define gênero é o aspecto
biológico.
Outro
ponto defendido pelo juiz é a necessidade de impedir a padronização do
comportamento social, como por imposição de um modelo sexual. Essa afirmação
levanta a indagação da cirurgia de mudança de sexo como adequação a um padrão
social no qual se aceita apenas a existência de homens ou mulheres; embora seja
inegável que a cirurgia de mudança de sexo só pode ser considerada uma necessidade
humana na vida em sociedade, pois seria inconcebível sua necessidade em um
estado de natureza de luta pela sobrevivência, essa, em nossa sociedade
globalizada ocidental, não se trata de um padrão imposto, pois expande o
conceito de gênero para além do aspecto físico, sendo a transformação deste mera
conseqüência do aspecto psicológico, ao contrário da ideologia dominante em que
o gênero é mero resultado do aspecto biológico.
Além
disso, há o preconceito sofrido pelo transsexual em momentos que precisa
revelar seu sexo biológico, como quando apresenta seus documentos e esse
preconceito pode ser um fator determinante nas decisões do indivíduo, podendo levar
ao suicídio.
Por
fim, o encaminhamento da decisão ao Ministério Público para que tome
providências para garantir às demais pessoas essa cirurgia, sem que tenham que
procurar a justiça para tal, exemplifica a dinâmica dialética que é o Direito,
porque a positivação do interesse material não ocorre para um único caso
concreto, mas é estendido aos demais, sendo, portanto, formalizado este
interesse material e essa formalização pode ser abalada por outro interesse
material no futuro.
Dana Rocha Silveira - Direito Noturno.
Dana Rocha Silveira - Direito Noturno.
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