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segunda-feira, 31 de março de 2025

A ordem está fora do mundo

 A geração atual encontra-se  em uma posição extremamente delicada. Cercada de problemas políticos, crises climáticas, vulnerabilidades sociais e o advento de tecnologias cada vez mais avançadas, cabe o questionamento, estaria o mundo fora de ordem ou a ordem fora do mundo?

Primeiramente o ser humano é vítima de diversas catástrofes geradas pela crise climática; enchentes, tsunamis, terremotos entre outros, além do constante preocupação sobre o aquecimento global. Essas questões já são o indício da instabilidade da ordem no mundo, visto que causam refugiados climáticos, mortes e preocupações.

Consoante a isso, o ser humano se encontra em um estado de crise na atualidade, com a regressão de diversos direitos conquistados e com a ascensão de discursos de viés fascistas. Havia quem acreditava que o mundo havia adquirido uma certa ordem após a queda de Mussolini, Hitler, Franco e Salazar e que discursos baseados nas doutrinas desses líderes fascistas não seriam vistos no mundo moderno. Entretanto, nota-se nas sociedades a ascensão de governos de extrema direita baseados em doutrinas fascistas, questão que seria inimaginável há alguns anos. 

Ademais com o governo Trump nos Estados Unidos , cidadãos LGBTQ+, mulheres, negros, indígenas e imigrantes viram seus poucos direitos conquistados diminuírem drasticamente com poucas semanas de governo; desse modo essas pessoas vivem na angústia de terem seus direitos restantes retirados. Fica o questionamento, tem como a ordem estar no mundo se cidadãos perdem seus direitos constantemente e vivem em um temor de perder direitos que assegurem dignidade humana a eles?

Além disso, países como Irã e Afeganistão restringem cada vez mais o direito das mulheres, com estas sendo proibidas de falar em público no Afeganistão e sendo mortas no Irã por protestarem. Com direitos simples sendo proibidos e a dignidade humana dessas mulheres sendo cada vez mais afetada se perguntássemos para essas mulheres se elas sentem que o mundo delas está em ordem, elas provavelmente diriam que não. Principalmente no Afeganistão, país no qual as mulheres desfrutaram de certas liberdades, como a educação, antes do Talibã assumir o poder e bruscamente regrediram vinte anos em dois. 

Outro exemplo é o genocídio assistido em Gaza, no qual milhares de palestinos foram mortos. É possível ordem no mundo quando nações e seus cidadãos  veem diariamente o que acontece na região porém preferem fechar seus olhos para essa realidade?

A resposta é simples, o mundo não está fora de ordem-até porque ele nunca esteve plenamente nela - a ordem é que está fora do mundo e por isso abrem-se margens para que a barbárie invada o planeta e cause mazelas para os seres humanos.


Maria Clara Destito Yano  -   1 Ano Direito Matutino 

Um mundo fora de ordem ou uma ordem fora do mundo?

    A questão levantada pelo professor Agnaldo: “Um mundo fora de ordem ou uma ordem fora do mundo?” é curiosa. Em um século XXI marcado pelo genocídio palestino, pela guerra “ao terror”, pelos retrocessos e pela opressão de grupos minoritários, pode parecer fácil responder de cara: “é um mundo fora de ordem”. No entanto, ao analisarmos o contexto de fatores como as ascensões políticas contemporâneas, especialmente o retorno do fascismo, é difícil discordar da ideia de que há, sim, uma “ordem fora do mundo”.

    No contexto da pergunta, podemos definir "ordem" de duas maneiras que se complementam:

-Uma ordem destinada aos oprimidos: ou seja, um sistema opressivo e alienante que esmaga os direitos, a coletividade e a autodeterminação dos indivíduos, que apenas influenciam o cenário mundial por meio de sua força de trabalho.

-Uma ordem dos opressores: não uma ordem como a representada no filme De olhos bem fechados, de Stanley Kubrick, mas uma ordem que opera com base no controle e organização das figuras que estruturam o globo para atender aos seus próprios interesses.

    Quando falamos de uma ordem “fora do mundo”, essa afirmação pode ser entendida de dois modos que também se complementam:

-A ordem está fora do mundo por ser organizada por aqueles que estão fora da vivência cotidiana do ser humano comum.

-A ordem está fora do mundo porque retira a noção de importância dos oprimidos no cenário mundial, apagando suas vidas e necessidades.

    Por fim, acredito que estamos, de fato, em uma ordem fora do mundo, e não em um mundo fora de ordem. Após a consolidação da burguesia industrial e dos Estados modernos, é difícil afirmar que algo em escala geopolítica esteja realmente “fora de ordem”. Se está “fora de ordem”, é porque está fora da ordem estabelecida por aqueles que impõem seus próprios padrões em escala global.


Eduardo Cavalcante Seghese Neto 1º Direito Noturno

Entre questionar e resignar

 “Um mundo fora da ordem ou uma ordem fora do mundo?”. Tal questionamento reflete uma incerteza contemporânea diante aos conflitos presentes na sociedade. Sob esse viés, ele busca compreender se a sociedade se encontra em um período de evasão da ordem, como se os comportamentos estivessem inconsistentes com o pressuposto. Contudo, existe também a perspectiva de que este sistema, como um todo, é incompatível com a contemporaneidade.

    Dessa forma, existe um constante desespero com a condição atual, que não só preocupa os cidadãos, mas também perpetua uma sensação de inevitabilidade. Nesse contexto, o cenário hodierno é composto de embates, como guerras e pautas sociais. Por conseguinte, é notória a presença de combates armados, como entre a Palestina e Israel, que demonstram não apenas uma crise humanitária, como também conflitos ideológicos e bélicos. Desse modo, essa incerteza acerca do futuro propicia a tentativa de buscar por respostas, que por sua vez são intrínsecas à uma iniciativa de encontrar justificativas para a ascensão de tais fenômenos. Assim como, reverbera-se a sensação de que não há nada a ser feito, sendo tal noção errônea, visto que a participação ativa permite a união de ideias. Sendo assim, surgem duas perspectivas, uma que desdobra tais questões como anormalidades da ordem, que por sua vez remete ao sistema político-econômico. Todavia, o segundo entendimento desenvolve essa norma como incompatível com a sociedade, de maneira que a analisa como causadora dessas problemáticas.

Logo, o questionamento continua presente na hodiernidade, entretanto, devem-se ser procuradas formas para mediar tais conflitos, contando com a participação ativa das pessoas e a esperança de melhorar a sociedade.


A chegada do Positivismo de Comte ao Brasil Império e sua atual influência na realidade brasileira

O Positivismo, corrente teórica desenvolvida pelo cientista Augusto Comte na obra “Sociologia”, está pautado na interpretação racional-científica da realidade social e no desenvolvimento de uma lógica com metodologia exata aplicada à sociedade, a fim de desenvolver a ciência social como instrumento de alcance do progresso e da ordem. No contexto da época, o Positivismo foi amplamente divulgado e fortalecido na Europa por seus apoiadores, entre eles John Stuart Mill, pensador responsável pela estruturação da teoria positivista junto a Comte. O crescimento do Positivismo alcançou o Brasil no final do século XIX, durante um momento histórico conturbado e alvo de muitas transformações sociais, econômicas e culturais.

Naquele momento, o regime monárquico brasileiro estava enfrentando uma crise. Intelectuais e políticos não se encontravam satisfeitos com a política de centralização de poder de D. Pedro II. Ainda que o parlamento e a Constituição existissem, as principais decisões estavam concentradas nas mãos do imperador, que inclusive tinha o poder para interferir nos ministérios e partidos. Enquanto isso, o exército tornava-se símbolo de ascensão social, e passava a ser almejado por jovens estudantes integrantes da aristocracia brasileira, que realizavam seus estudos na Europa e voltavam ao Brasil com ideias e teorias novas, uma delas, o Positivismo. Sendo um país “sem filosofia” à época, o Brasil abraçou o positivismo na busca por encontrar uma nova concepção de valores e condutas morais para a população brasileira daquele período.

Grandes nomes no Brasil juntaram-se à causa positivista, entre eles os escritores Euclides da Cunha, autor de “Os Sertões”, e Luís Pereira Barreto. Este último escreveu a obra “As Três Filosofias”, considerada o marco inicial do Positivismo Brasileiro. 

Algumas ideias de Comte passaram por “adaptações” no país latino-americano, conforme à realidade vivenciada naquele período. Uma dessas alterações foi o posicionamento positivista brasileiro no que se referia à vacinação. Enquanto na Europa a vacinação foi vista como “inovadora” e fortalecida pelos positivistas, defensores dos avanços científicos, no Brasil, a situação foi um tanto quanto diferente. 

Naquele período, o Rio de Janeiro enfrentava uma epidemia gravíssima de varíola, em razão das péssimas condições de saneamento básico na cidade. A região estava passando por uma tentativa de “modernização” do centro, para torná-la mais atrativa e parecida com o estilo das cidades europeias, porém, nesse processo, a população pobre, em sua maioria negra e descendente de escravizados, precisou sair de suas moradias e ocupar a periferia da cidade. Esse processo levou ao aumento exponencial de doenças e animais peçonhentos. Dessa forma, em 1902, quando nomeado Diretor Geral de Saúde Pública (o que, atualmente, corresponderia ao cargo de Ministro da Saúde), Oswaldo Cruz decidiu realizar o combate à varíola através da vacinação em massa — e forçada.

Apesar de a vacina antivariólica ser obrigatória desde 1846 para adultos, a lei jamais havia sido cumprida. Os instrumentos de aplicação da vacina, na época, eram lancetas metálicas, que realizavam cortes e escorriam o líquido para dentro da corrente sanguínea. O processo era longo e doloroso e, por isso, temido pela maior parte da população. Enquanto isso, o Positivismo Brasileiro estava no seu auge e, ironicamente, naquele momento, colocou-se contra a ciência, em razão da aplicação de medidas estatais de vacinação à força e de reclusão dos não-vacinados. Assim, a corrente positivista foi grande influenciadora da maior revolta urbana até então já vista no Rio de Janeiro: a Revolta da Vacina.


Ao trazer esse acontecimento para a realidade brasileira, podemos correlacionar a ação dos positivistas à época com o movimento anti-vacina brasileiro, o qual alcançou maior proporção a partir do ano de 2021, durante a pandemia de COVID-19. Essa é uma prova de como, na sociedade contemporânea, o Positivismo ainda vive e se renova todos os dias, especialmente dentro dos âmbitos tidos como intelectuais e de “elite”, por exemplo, os campos do Direito e da Saúde. 


Conclui-se, portanto, que o pensamento de Augusto Comte tomou novas formas e encontrou na sociedade brasileira um terreno fértil para seu crescimento, sendo utilizado como base, hoje em dia, para movimentos que defendem “enxergar a sociedade com métodos exatos e dados científicos”, enquanto, na verdade, manipulam os fatos, a fim de defender um ideal de sociedade dominada e ocupada por grupos específicos.


Maria Vitória Silva - 1º ano de Direito (Noturno)

domingo, 30 de março de 2025

Desordem da Matéria ou Imaterialidade da Ordem?

{Este texto parte das discussões na mesa chamada "Estamos no Fim do Mundo? Trump, Ecossocialismo, Palestina e Cotas Trans"}

Daqueles que ainda acreditam nos preceitos da bandeira nacional, resta inevitavelmente a dúvida a respeito do método de obtenção e do momento de acontecimento da finalidade do escrito ("Ordem e Progesso").

Resumidamente, pensa-se em como fazer o básico (ou basilar, "a ordem") para atingir o objetivo, "progresso por fim", que tanto pregava Auguste Comte, influência dos militares republicanos brasileiros. Observando, não obstante, o mundo, nota-se que tal suposto progresso não necessariamente ocorre e, ao invés de discordar da prerrogativa comtiana, tal como fizeram brilhantes brasileiros, (a exemplo o bruxo do cosme velho, ou Machado de Assis) procura-se respondê-la em seus próprios meios.

À despeito da ordem, indaga-se, como um aluno errante dos positivistas: está essa no mundo? E na negativa, foge o mundo da ordem ou a ordem do mundo?

Primeiramente, parte-se de uma análise de um positivismo ordenativo: a teoria pura do direito, de Hans Kelsen. Para o autor, a norma parte de si mesma, como boa cadeia lógica, científica e objetiva. E então argui-se o fundamental para a compreensão da relação (ou apreensão da 'relacionante', no sentido de estrutura da interligação apreendida em sua existência) entre o mundo e a ordem: a concatenação ordenativa dos fenômenos é um necessário axioma do entendimento humano. Isto é, a cadeia de eventos e desdobramentos sucessivos é um método de interpretação cognitiva da realidade.

Isto não é novidade, de maneira alguma, uma vez que já defenderam isso Baruch de Spinoza, David Hume, Thomas Hobbes e tantos outros, que a atribuição de factualidade (verossimilhança [o verdadeiro e o falso] e causalidade) são modos de sensação do mundo, tal como a unidade de tempo (por exemplo, para Albert Einstein). O que é demonstrado, em síntese, é que a ordem é obrigatoriamente metafísica, designada para absorver e lidar com a apreensão do sensível, que a ordem serve como elemento de ordenação da própria mente.

Por isso, desdobram-se dois caminhos para a resolução das indagações em negativa: à respeito do mundo fugir à ordem, antes se entende que a materialidade nunca poderia se tornar subalterna a qualquer ordenação, pois mesmo seguindo uma visão hegeliana e idealista de mundo, compreenderá-se que esse atributo abstrato é dependente da consciência ou atitude humana, então o empenho mental ou físico deste será indispensável para que a ordem, utilizando-o de receptáculo, afete o tecido material.

Agora, ao mais interessante, (sobretudo àqueles que presenciaram a palestra "Estamos no fim do mundo? Trump, Ecossocialismo, Palestina e Cotas Trans") responde-se à segunda possibilidade: a ordem foge ao mundo? Três pontos são necessários para desenvolvê-la, primeiro, a metafisicidade da ordem, segundo, a compreensão do mundo, especialmente no molde da "alienação", como discutiram os palestrantes, (em geral um representante do movimento estudantil e político, "Le Magalhães", e particularmente, sobre a hegemonia da mídia [ou cultural, seguindo Antonio Gramsci], o presidente da Federação Árabe-Palestina no Brasil, Ualid Rabah) e terceiro, também abordado na palestra, "Neofascismo".

Sobre a alienação, tem-se como prioridade a análise de deturpação dos sentidos (ou uma ampliação distorcida e selecionada de algumas afetividades) por parte de comentários sociais e culturais que concebem o mundo em uma subjetividade ressentida e indignada unitária, qual busca, isoladamente de outras subjetividades alheias, tal como a norma positiva, o positivismo e toda ciência que busca pela perspectiva pura e objetiva apuração de tudo, (em toda sua ingenuidade e perigo enquanto tal) uma explicação do mundo. Essa construção específica de mundo, em sua essência solitária e, por isso, nebulosa, permite apenas uma opinião limitada e restritiva da sociedade, enxergando de modo acrítico o meio a partir de sentimentos conflituosos sem sua devida reflexão psicológica. Logo, a alienação parte da imperícia intelectual, (de gênese na negligência do ser para consigo mesmo,) e possui como resultado uma perspectiva de um mundo parcialmente inverossímil tomado como totalmente verossímil, um universo paralelo de existência.

Em paralelismo, muito pode ter-se pensado em conteúdos e produções quais, no mínimo, flertam com visões extremistas de direita na promoção de imperativos metafísicos como a moralidade (Deus), a identidade exclusiva (Pátria), e o vínculo afetivo fundamentador e exaltantes de parte intimíssima das relações sociais (Família). Dessa forma, pouco falta para relacionar o ressentimento e seus objetos de preocupação e medo com o último ponto, o Neofascismo.

Todavia, uma digressão. Muito se sabe do horror fascista italiano e do terror nazista alemão, seu lema de "Deus, Pátria e Família", mas pouco se entende de fato de seu caráter metafísico de existência. Quando foi comparada a visão inicial neste texto a "um aluno errante dos positivistas", foi adjetivada "errante", porque qualquer positivista que se preze seguirá afinco a ideia de que "a partir da ciência virá mais ciência", ou pela contraparte jurídica, que a norma define a si própria (independentemente de questões externas, tais como o contexto social ou a estrutura e dinâmica econômico-política), ambas ad infinitum. Em outras palavras, a ordem, enquanto concepção da esfera cognitiva, vem (ou só pode vir) da ordem e resulta em ordem, não vem do mundo nem se direciona a ele (até um ser efetivá-la).

Daí que decorrem todos os fundamentos e encadeamentos lógicos. Em primeiro lugar que, a partir do momento em que o ser humano não é capaz de sentir a nível mundial, está em certa medida alienado mais ou menos deste, necessitando de uma mínima ordenação (nem que da sequência temporal dos fatos) para compreender o meio. Em segundo lugar, à medida que se frustra na desconexão entre o metafísico e o físico (considerando que aquele parte de um entendimento parcial deste), procura entender: o que está errado? Meus valores e perspectivas ou o próprio mundo? Então, em terceiro lugar, uma vez convicto de suas ideias, pois estas carregam o passado (suas memórias, vivenciadas no presente) e a interpretação do momento que vê, crente de que dois universos (o da empiria e o de suas sensações do instante) superam um (o material em sua totalidade), renuncia do real ao paralelo, pois o imaginado atende às suas vontades e perspectivas.

Dessa maneira, a ordem mentalizada é tida como elemento do progresso (ou marcha, considerando o caráter militarístico do nazifascismo) do mundo ao que tanto se deseja, o mundo idealizado e paralelo. Mas aí mora justamente o metafisicismo e o absurdo horripilante dessa ideologia. Na materialidade, em seu caráter "essencial" ou "puro", desvinculados do humano, a ordem e o universo alternativo inexistem, isto é, são nada. Pensa-se no famoso dizer "do nada nada vem", mas, vem aqui a proposição de uma leitura radical (na raiz) disto, de que "do nada vai ao nada". Isso pode ser justificado de algumas maneiras, selecionando duas: pela inércia: o que está parado permanece parado (sem nada de energia cinética vai ao nada de energia cinética); e pelo desejo, qual, pela via spinozista, parte do excesso e, por isso, reflete em mais desejo.

Muito sabe-se que a primeira explicação pode ser muito mais clara para entender a proposta, mas a segunda é fundamental para entender o caráter demasiadamente humano da situação hipotética. Seguindo Georges Bataille (autor de livros como "A Estrutura Psicológica do Fascismo"), a morte se trata de uma interdição do desejo. Encontra-se, deste modo, um fundamento do nazifascismo: a interrupção, o cessar, ou a morte. Como doutrina imersa no campo metafísico em seu mais absoluto desentendimento entre o "sensível" e o "inteligível" (descrição infelizmente platônica, dualista/dicotômica e limitada de mundo; contudo necessária para entender o ideário fascista), nada surpreende que, priorizando a resolução de si em si própria, desvinculada à materialidade, possua como objetivo a existência estritamente metafísica, a completa (e mais niilista, pois abraça o vazio da matéria no campo do ideal) negação da matéria, e, consequentemente, da vida.

Deduz-se que o nazifascismo, justamente por originar do "nada" (a abstração em totalidade, como o mundo ideal paralelo, a ordem e os desafetos pela matéria que foge da "perfeita", ou idealizada, conclusa e morta, concepção do mundo ordenado pelo psíquico) seguirá até o nada, a morte. Ou seja, deseja-se que o mundo "retorne" temporalmente até censurar o incômodo, regressão impulsiva que acarretará, após certo desenvolvimento (pelo menos na mentalidade nazifascistal, ao retorno do instante pré-nascimento; essa ideia é conceituada (em partes) pelo pai da psicanálise, Sigmund Freud, como "pulsão de morte", isto é, um desejo pela morte, pela paz absoluta (o congelamento de qualquer movimentação, tal como o zero absoluto da escala Kelvin).

Sintetizado, a partir do nada, do vazio, ou da ausência de sensação de uma parte do mundo, promovem-se ferramentas cognitivas que preenchem as lacunas, tal como a ordem, o que será utilizado para a construção de um novo mundo¹ {¹parte disso que é falado pode ser pensado a partir da imaginação composta de Thomas Hobbes, encontrada na metade da seção I (denominada "Dos Homens") em sua notória obra "Leviatã"} na psique, o que permite toda a ação política nazifascista percorrer seu objetivo a morte, o destino é o nada, o vazio, a ausência da sensação de todo o mundo, (e portanto da própria vida). Do nada nada vem, mas do nada se vai ao nada, pelo menos enquanto busca ampliar sua parcialidade até torná-lo absoluto.

Concluir-se irá que, uma vez que a ordem não é concreta (em exceção à sua execução por um corpo humano), o mundo não pode fugir dela, mas ela pode fugir dele. Mas, em maior importância, nota-se que a percepção de que o mundo encontra-se em desordem é uma perspectiva de instabilidade de tudo que, antes sólido, agora se desmancha no ar, o sentimento do medo, angústia, desespero, impotência e paranoia os quais, bagunçam a apreensão do mundo e o raciocínio (pois para Espinosa os "afetos baixos", que partem do medo ou ódio, influenciam negativamente na compreensão e na produção lógica), e abrem terreno fértil para o neofascismo, a ordenação imperativa e absoluta que aparenta subordinar o "caos" e a "degeneração" do mundo à uma "bela" e "coesa" existência, "idêntica" à alienada idealização da realidade, rumo ao "progresso" em direção a um único fim: a morte.


1º ano de Direito – Matutino – Henrique Pinheiro Campanella

A Negação Da Ciência E Sua Contradição Com O Lema Brasileiro

  Todos nós brasileiros reconhecemos a existência da frase "Ordem e Progresso" na nossa bandeira, mas todos sabemos de onde vem e qual o significado dela?
 "Ordem e Progresso" é uma frase desenvolvida pelo filósofo Auguste Comte, que simboliza uma sociedade regida através desses dois termos. Acerca desse assunto, é importante dizer que Comte é considerado o pai da sociologia por ser a primeira a pessoa a determinar que as humanidades também deveriam ser uma ciência, estruturada por meio do estudo dos fenômenos sociais. Segundo o filósofo, a humanidade passou por três estágios ao longo de sua evolução: O Estado Teológico, em que as explicações sobre  mundo eram baseadas na religião e em seres divinos; o Estado Metafísico, no qual abandona-se as justificativas religiosas e entram as reflexões feitas pelos filósofos, e por fim, o Estado Positivo, caracterizado por ser o último e mais evoluído estágio da sociedade, em vista de ser fundamentado no uso da ciência e da racionalidade.
 E seria justamente nesse estágio final em que a sociedade, por ser regida através da razão e do conhecimento, percorreria um fluxo dinâmico, seguindo então uma ordem e progresso. Entretanto, se relacionamos essa filosofia com nosso contexto político recente percebemos que na realidade nós brasileiros não nos baseamos na razão, e principalmente, na ciência tanto assim. Isso pois, analisando o periódo da pandemia, ocorrida durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, houve uma altíssima negação da ciência acerca da eficácia das vacinas que estavam sendo produzidas para conter o vírus da COVID-19. Muitos brasileiros durante esse periódo, além de se recusarem a tomar a medicação, incentivavam outros indivíduos a terem a mesma atitude, e propagavam diversas fake news sobre os efeitos colaterais.  Dentre os brasileiros, está incluindo também o próprio Bolsonaro, o qual usou a frase "Se virar jacaré, o problema é seu" durante uma entrevista realizada durante a época em que as vacinas seriam liberadas. Tal situação evidencia uma situação preocupante em nossa sociedade, pois o até então presidente da república, que deveria ser um símbolo de autoridade capaz de incentivar a população a tomar medidas eficazes para conter o avanço da pandemia, era um dos primeiros a ir contra todas as medidas recomendadas para a contenção do vírus, induzindo outras pessoas a fazerem o mesmo.
 Devido a isso, não é possível dizer que nossa sociedade atual é uma sociedade moldada nos pilares de Comte. A negação da ciência, a propagação da ignorância, a falta de usar a própria racionalidade são fatores antagônicos com a formação de uma humanidade estruturada em uma certa ordem. Consequentemente, sem essa ordem, também não há o surgimento de um progesso social, fazendo com que a população brasileira fique estagnada em um ambiente ignorante e retrocedido. Portanto, todo esse quadro vivencido durante o governo do Bolsonaro mancha o lema de "Ordem e Progresso" trago em nossa bandeira. 
  

A física social e a ordem do mundo

No tempo em que o mundo ansiava por leis,
Nasceu um olhar de rigor e razão,
Que fez da ciência um manto, talvez,
Para vestir a civilização.

Comte sonhava com ordem e lógica,
Sociedade erguida em progresso e saber,
Uma física social metódica,
Onde cada peça tem seu dever.

Três estados traçaram a estrada:
O teológico, a fé dominante,
O metafísico, sombra calada,
E o positivo, enfim triunfante.

Mas que corpos mediam tais leis?
Que vozes cabiam no cálculo frio?
Se a norma não vê quem dela se fez,
Segue o silêncio, ausente e vazio.

E eis que da margem ergue-se um grito,
De quem a história quis apagar,
Grada nos lembra: não há infinito
Se a carne negra não pode falar.

A ordem imposta, o mito do centro,
O véu da ciência que cala e exclui,
Que física é esta, se aos seus fundamentos
A voz do oprimido nunca se inclui?

Se há sociologia, que seja inteira,
Que veja o mundo por outros prismas,
Pois entre as sombras da velha esteira,
Rompem verdades, racham abismos.

Nicole Barbosa Garcia- 1ºsemestre de Direito noturno

Entre o caos e o controle: A tensão de viver um mundo fora de ordem

                        Na obra “1984” de George Orwell, fica evidente a crítica à implementação de uma ordem totalitária, na qual o domínio absoluto da vida dos indivíduos suprime a autonomia individual e estabelece uma ordem artificial que se encontra "fora do mundo". A constante supervisão e a regulação da linguagem e do pensamento demonstram uma distorção da realidade e uma desumanização da sociedade. Seguindo esse viés, o autor usa como base o totalitarismo para exemplificar a imposição de uma ordem que nega a complexidade e o livre-arbítrio dos seres humanos.

Apesar de essa obra ter sido escrita a décadas atrás, ainda reflete de forma atemporal na atualidade. Em um mundo onde as relações socias e econômicas estão cada vez mais moldadas pela busca incessante da ordem, a realidade frequentemente se choca com as necessidades humanas. Ademais, essa imposição pode ser exemplificada pelo sistema capitalista, cuja minoria é favorecida e a maioria da população enfrenta as precariedades e desigualdades do sistema. Além disso, essa concentração de riqueza nas mãos de poucos cria uma desconexão no que é idealizado e o que é vivido pela grande maioria da população, principalmente no setor econômico. Por ventura, essa “ordem” é fragmentada e desarmônica, promovendo o caos e a falta de recursos básicos.

A princípio, ao longo da história da humanidade, a tensão entre um “mundo fora de ordem” tem sido evidente em diversos momentos. Um exemplo é o Império Romano que buscou estabelecer uma ampla ordem política e territorial, dominando grande parte do mundo conhecido. Contudo, o aumento da corrupção, a pressão das invasões bárbaras e a divisão interna do império levaram ao seu desmoronamento no século V, demonstrando que mesmo as maiores estruturas de poder podem ruir quando não satisfazem as demandas e realidades dos indivíduos.

Similarmente, a Revolução Industrial ocorrida no século XIX provocou uma mudança drástica nas sociedades, prometendo prosperidade e avanço. Contudo, ela resultou em grandes disparidades sociais e condições laborais inumanas para a classe trabalhadora, demonstrando que a ordem estabelecida através de uma industrialização acelerada desconsiderava as realidades humanas.

Por meio desses episódios históricos, fica claro como a falta de compreensão populacional e dos efeitos que o controle absoluto causa, muitas vezes resulta em situações menos favoráveis a um contexto global, levando a revoltas e mudanças drásticas que podem ser boas ou não a depender do beneficiário.

Voltando aos tempos atuais, as alterações climáticas emergiram como uma das principais ameaças para a ordem mundial nas últimas décadas. De acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a média da temperatura global já cresceu 1,1°C em relação aos níveis pré-industriais. Se as emissões de gases de efeito estufa não forem reguladas, a elevação pode ultrapassar 1,5°C até 2030, resultando em consequências desastrosas. Fora isso, as crises políticas e sociais têm demonstrado claramente o descompasso entre as normas estabelecidas pelos sistemas governamentais e as necessidades genuínas dos cidadãos.

Outrossim, a crise migratória, que atingiu proporções preocupantes com a guerra na Síria e os conflitos no Afeganistão, resultou em um recorde de refugiados, com uma estimativa de 110 milhões de indivíduos deslocados forçadamente até 2023, de acordo com a UNHCR. Essas crises demonstram como a ordem política e econômica atual frequentemente não consegue assegurar justiça e estabilidade, gerando divisões aprofundadas, desigualdades e conflitos sociais que questionam as estruturas de poder já estabelecidas.

Por fim, os dilemas ambientais, sociais e políticos evidenciam que as estruturas consolidadas frequentemente falham em atender às verdadeiras demandas das comunidades e ao equilíbrio ecológico, gerando desordem e desigualdade. Embora a intenção de construir um mundo mais organizado e justo seja válida, fica claro que a imposição de uma ordem rígida, sem considerar a complexidade das sociedades humanas e dos ecossistemas, tende a amplificar a ineficiência e as disparidades. Alcançar uma verdadeira harmonia entre a natureza e os sistemas sociais exige mais do que a revisão das ordens estabelecidas; requer uma reconciliação com o ambiente natural e um compromisso genuíno com a justiça social, a sustentabilidade e a equidade. Assim, o verdadeiro desafio não está em preservar uma ordem a qualquer custo, mas em desenvolver uma organização adaptável, capaz de respeitar a diversidade e as limitações do mundo em constante transformação.

Maria Eduarda Siqueira Alves dos Santos - Direito - 1° ano - Matutino 

Desordem e Regresso

 “Ordem e Progresso”, lema da corrente filosófica positivista do século XIX, fundamenta a condição existencial da civilização moderna, que visa, por meio da operacionalização e do ordenamento da razão, da ciência e do conhecimento, gerar lucro- sinônimo de progresso em um contexto marcado pela expansão do modelo neoliberal. No entanto, vive-se em um cenário no qual os efeitos da mercantilização dos diferentes aspectos da vida, promovidos pela lógica capitalista, repercutem em mudanças climáticas, escassez de recursos naturais e guerras, por exemplo. Nesse viés, subverte-se a ideia de “ordem e progresso”, visto que o mundo contemporâneo encontra-se em “desordem e regresso”.

Sob essa ótica, os avanços técnicos e científicos tornam-se instrumento de dominação dos mais frágeis. De acordo com o conceito de “razão instrumental”, desenvolvido e proposto pelos filósofos Theodor Adorno e Max Horkheimer, a razão, na era moderna, é constantemente utilizada como ferramenta para a ascensão e o progresso da sociedade aos moldes capitalistas, de forma a manter desigualdades, injustiças e privilégios. Por conseguinte, toda a crença no ideário iluminista de que a razão libertaria a humanidade e, consequentemente, permitiria o seu desenvolvimento ordenado e o seu progresso científico, desfaz-se em vista da supressão da subjetividade humana, devido à padronização mercadológica dos corpos, que perdem sua autonomia, e da dominação e da destruição da natureza para a obtenção de lucro pela classe dominante, detentora do maquinário de poder. Logo, é notório o desordenamento do mundo promovido pela extrema direita, refletido por um cenário  caótico e violento, marcado pela proliferação de doenças  endêmicas, como a malária, por quadros climáticos extremos, com altas temperaturas médias e graves enchentes, bem como pela ascensão e consolidação de figuras políticas neofascistas no poder, por exemplo.

Por outro lado, ainda que o pensamento institucionalizado e demasiadamente racionalista, sob moldes neoliberais prevaleça no cenário atual, ainda há  indivíduos dispostos a transformar tal realidade hostil e desigual. Em sua obra “Pedagogia dos Sonhos Possíveis”, Paulo Freire, patrono da educação brasileira, defende que a práxis, ação do ser humano sobre o mundo para transformá-lo, permite a superação da condição opressor-oprimido, ou seja, o sujeito, conscientizando-se de sua condição de oprimido, a partir de uma prática pedagógica não apenas ao nível da escola. Dessa maneira, para Freire, o conhecimento é o ponto de partida para a relação com o mundo e com as pessoas e, portanto, deve ajudar a formar sujeitos capazes de transformar o corpo social, aliando-se a valores humanizadores, como o respeito e a solidariedade.

É perceptível, portanto, que o mundo contemporâneo encontra-se fora de ordem, em consequência de um racionalismo exacerbado e da errônea ideia de progresso. Entretanto, através do conhecimento e da união de indivíduos em prol da mudança, pode-se enfrentar e resistir a esse cenário global desordenado com esperança. 


sábado, 29 de março de 2025

Tudo é político, até uma parede

O filme “Jurado Número 2” é um bom exemplo para analisar a dualidade da parcialidade, já que obra demonstra a dificuldade de se manter neutro em situações nas quais a pessoa está emocionalmente ou fisicamente envolvida. No enredo da obra, Justin Kemp é convocado para participar do júri de um caso em que ele suspeita ser o verdadeiro culpado, gerando, assim, um grande dilema moral: absolver ou condenar o réu, aparentemente inocente.

No entanto, diferentemente da atitude tomada por Kemp, na visão do filósofo francês Auguste Comte, uma das características essenciais da Física Social é a aplicação da neutralidade científica, ou seja, a realização de estudos sociais por meio de métodos de observação e experimentação que não envolvem a pessoalidade do autor. Desse modo, para Comte, seria possível realizar estudos e tomar atitudes apolíticas e baseadas simplesmente nos fatos.

Entretanto, o filme se aproxima do pensamento de Grada Kilomba, presente no livro “Memórias da Plantação”. Segundo a autora, muitas das críticas direcionadas a suas obras associam sua escrita a um excesso de subjetividade, visto que Kilomba descreve diversos episódios racistas do cotidiano, fazendo uma análise sociológica dos mesmos. Para a escritora, qualquer discurso é carregado politicamente, isto é, tudo está imerso em alguma opinião ou ideologia. Assim, fica evidente que a escritora discorda da teoria de Comte, pois não existiria a possibilidade de criar um discurso neutro, nem mesmo no âmbito sociológico ou científico. 

Tomando a perspectiva de Kilomba, fica perceptível que os comentários sobre a sentimentalidade de seus relatos revelam, na verdade, uma tentativa de inferiorizar e silenciar a voz de pessoas pretas, algo que reforça o sistema de opressão e impede que diferentes perspectivas sejam escutadas e compreendidas. Logo, a tentativa de forçar a imparcialidade das ações tem um caráter extremamente repressivo, visto que procura tirar a credibilidade de expressões consideradas inconvenientes para a manutenção da censura. 

Um exemplo concreto de como toda atitude é política ocorreu em 2025, na Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP). Nesse evento, manifestações e formas de expressão registradas nas paredes do Centro de Convivência — um local destinado ao descanso e à criação artística dos estudantes — foram cobertas por tinta branca antes da chegada dos novos ingressantes. Essa ação, justificada como uma tentativa de tornar o ambiente da faculdade “neutro”, configura, na verdade, uma forma de silenciamento e apagamento histórico, sendo, portanto, também ideológica.


Assim, conclui-se que nenhuma atitude é completamente neutra e o discurso que visa neutralizar as ações humanas não passa de uma forma repressiva de manter um sistema ultrapassado e autoritário de poder


Nome: Camilly Isabele Mendes Agostinho 

1º ano Direito (Noturno) 



Desordem, Ordem, Reordenamento

Friamente calculado
Sem ideal
Física social

Isso deve ser assim
Temos ordens a seguir
Apenas sigo ordens

Ordem para o progresso
Estática e dinâmica
Estática para a dinâmica

A revolução
Desordem
Mera subversão

Só a estabilidade trás progresso
Devemos conservar nosso modelo
Isso é positivo

Disciplina é o caminho
Disciplina em tudo
Viva a ordem

Esse é o caminho mais rápido entre um ponto e outro
Não há curvas, devemos ser lineares
Viva o progresso

Há duas forças na sociedade
As da desordem e as nossas
Viva o reordenamento

Caos jamais
Estabilidade sempre
Ordem e progresso

Felipe Lopes Gouveia Clauz Morlina - 1ºsemestre de direito noturno

Positivismo, uma problemática, mas totalmente incorreta?

 Auguste Comte é considerado o primeiro sociólogo, foi responsável por classificar a Sociologia enquanto ciência, ainda que como tradicional positivista que é, propôs também uma única forma de se produzir ciência sociológica. O Positivismo de Comte se pautava principalmente em sua Teoria dos 3 Estados e na ideologia “ordem e progresso”.

Quanto a famigerada frase, presente na bandeira brasileira, Auguste entendia que o progresso era algo natural da sociedade e que esta só poderia atingir tal objetivo por meio do progresso, de uma harmonia social. Unido ao conceito da naturalidade do progresso, desenvolveu a Teoria dos 3 Estados, que postulava uma sequência fixa e certa para atingir justamente aquilo que se considerava progresso.

Notável a problemática de uma sequência obrigatória para o desenvolvimento de cada sociedade, ao assumir essa noção como verdadeira, se entenderia que certas sociedades são superiores a outras, em especial, ao contexto de Comte, isso seria uma forma de legitimar uma dominação na América, na qual os povos originários teriam um “menor grau de desenvolvimento”. Entretanto, ainda que se note a incoerência desse pensamento, as formas de pensar de cada Estado de fato existem, mas ao invés de pensá-las como sequenciais, as 3 formas existem e se mantem concomitantemente.

“Ordem e Progresso”, por sua vez, é passível de grande reflexão, inicialmente pela concepção de ordem estabelecida pelo sociólogo, que é deveras estamental, atribuída a uma harmonia social, porém o que fica implícito nessa forma de pensar, é que não haveria a possibilidade de qualquer ascensão social, que por si só é uma das postulações do modo de produção capitalista. Por mais que se possa questionar a forma que o capitalismo promove ascensão social, inegável que em poucos casos ela existe, mas para Comte, isso implicaria em uma sociedade doente e, portanto, incapaz de seguir ao progresso. Outra problemática é a própria ideia de progresso, o que seria o progresso? Para a concepção positivista, novamente surge a problemática de uma ideia muito enraizada e dotada de extremismo. 

Observando com um olhar um tanto quanto mais contemporâneo e reinterpretando essa frase (ordem e progresso), ainda que com o risco de anacronismo, me arrisco a dizer que nem tudo é de fato errôneo. O progresso sequer precisa ser entendido, deve ser um ideal a ser alcançado, não necessariamente um ideal comum para todas as pessoas do mundo, mas assim como a Constituição de 1988 se pauta em um “deve ser”, o que impediria o progresso de representar o mesmo, ainda que de forma menos extrema. Quanto a harmônia social e quando ela se quebra o caminho para o progresso, me dou a licença de concordar discordando, discordo de sua concepção de harmônia, creio que algo harmônico não é estamental, mas fluído, principalmente a se tratar de pessoas. Mas concordo com partes como a ausência dela impede o progresso, os 3 Poderes são fundamentais no sistema estatal brasileiro, imaginemos por um instante que algum dos 3 poderes passe a extrapolar sua competência ao ponto que os demais não possam regulá-lo, assim, estaria posta a corrupção do sistema e carrega consigo a impossibilidade de atingir um ideal posto pela sociedade, de qualquer forma, assim como também defendido por Comte, apenas a própria sociedade pode se curar quando se encontra doente. Portanto, cabe a nós mesmos nos regularmos enquanto pessoas sociais e políticas.


sexta-feira, 28 de março de 2025

A equívoca tentativa de imposição da ordem ante o “fim do mundo”

 Eu sou o tenro signatário da ordem,

 Sou as marcas de uma relação de progresso,

 Sou o empecilho das interações que contesto,

 Sou um retrato pintado ad unguem.


 Vivendo à margem da desordem,

 Reconheço as nuances do retrocesso,

 Mas faço juras saudosas aos protestos,

 Que me formam à medida que me destroem.


 Sou signatário da ordem, mas não vivo dela.

 Sou resultado do progresso, apesar de ser abandonado por este.

 E padeço à sequência de dívidas que me cobram.


 E sigo questionando se essas dívidas desferem sequelas,

 Pois qual preço se paga por presumir o que nunca conheceste?

 Qual certeza resta por tentar apagar aquilo que retomam?


- Do Positivo sobre a Realidade.


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 A corrente de pensamento positivista, instituída e perpetuada entre os séculos XIX e XX, tendo como fundador o pensador Auguste Comte, coaduna a primazia dos saberes ditos científicos em detrimento do conhecimento oriundo de fontes alternativas, tais como os cernes teológico e metafísico (este, por sua vez, sendo definido por Comte como um estado de transição). Engendrando acepções como “Física Social”, o estudioso ratifica a sistematização e atribuição de uma lógica objetiva aos estudos atrelados ao âmbito das Ciências Sociais, uma vez que, segundo proposições comtianas, os fenômenos sociais devem ser analisados sob a óptica de leis imutáveis. A imutabilidade, neste caso, é suscitada como atributo imprescindível à legitimação e revalidação de um determinado conhecimento, o qual passaria, diante do estabelecimento da ordem, a receber o desígnio de “científico”. Apartando noções vinculadas à ideia do que seria o conhecimento verdadeiramente seguro e confiável, no qual podemos nos embasar a fim de otimizar estudos contribuintes ao progresso da ciência, a variabilidade ostensiva de relações sociais não é uma surpresa, muito menos uma indagação. Pelo contrário: a pluralidade das interações notadas socialmente não só é factual, como também é crucial ao desenvolvimento de novos saberes. Álvaro Vargas Llosa, autor da obra literária “Liberty for Latin America”, avultou a maneira como o olhar de fascínio consumado em torno do Positivismo acarretou uma vicissitude inexorável, outrossim a escalada de relatos históricos orientados, desafortunadamente, por opressão e miséria. Os casos não são escassos: a política elitista de Porfirio Díaz no México e a Ditadura Militar no Brasil com o Sorbonne Humberto de Alencar Castello Branco são exemplos notórios de como a corrente de pensamento registrada intitulou episódios particularizados pelo abuso de poder e repressão de mobilizações populares.


 Doravante, é insustentável atestar que vivemos em um momento de progresso. Para se discorrer acerca de tal concepção, faz-se indeclinável enfatizar as indagações que sondam o tão almejado progresso: este é natural em consonância com a suposta “evolução” da sociedade? A ordem é uma condição ou uma consequência deste substantivo? Em caso hipotético de estabelecimento intrépido de sucessivas relações de progresso, é seguro estagnar uma perspectiva aliada às ideias de ciclo ou de fluxo? Afinal, apesar de todas as questões levantadas precedentemente, é certo que há diferenças entre pensar em ciclagem e pensar em fluidez. A primeira evoca o discernimento da sequência orgânica de experiências, enquanto a segunda é entendida por um teor menos fatalista e mais consequencialista. Nesse sentido, é cabível apresentar um exemplo didático que ilustra tal distinção: as relações entre matéria e energia. Não se pode conceituar um desses elementos sem pressupor a existência e relevância do outro, todavia, à medida em que falamos de ciclagem de matéria, discorremos sobre o fluxo de energia. No primeiro caso, é pouco provável a percepção de esgotamento, sendo destacada, por sua vez, o entendimento da renovação. O segundo caso contrapõe-se: há uma convicção de dissipação, não de conservação. Corroborar os princípios ideológicos do Positivismo é corroborar a lógica do ciclo. No entanto, esta lógica, quando aplicada aos dias hodiernos, nos quais o ódio configura-se como partícula da normalidade, é perigosa e, de certo modo, mortal. 


 Evgeni Zamiatin, consagrado autor russo, introduz em sua magnífica obra distópica “Nós” uma perspectiva contrária aos preceitos idealizados por Comte, tendo em vista que o escritor suscita a ordem como inibidora do progresso, colocando em contestação até mesmo a frase que estampa a bandeira do Brasil. Se a ordem revela seu antagonismo em relação à mudança, então não se pode estipular este posicionamento como crucial ao progresso. Almejar neutralidade no âmbito científico, em especial no campo de estudo das Ciências Sociais, é alavancar os dados atrozes que são emitidos a respeito do genocídio na Faixa de Gaza, é ocultar as conquistas encabeçadas pelas minorias sociais (apesar de estas representarem a maior parcela da população global), desde o movimento negro até as reivindicações feministas e LGBTQIAP+, é se conformar com o cenário de violência, degradação, desrespeito, desumanização e perseguição ao qual a sociedade vigente sucumbe. 


 Nessa circunspecção, desmistificar a ideia do ciclo aplicado à humanidade é substancial, pois grandes mudanças não são provindas da passividade, isto é, não se pode cogitar a averiguação da ordem quando esta é inviável. Como poderíamos falar sobre uma suposta ordem condicionada pela imparcialidade em um mundo em que cada indivíduo sai em defesa de seus próprios interesses, independentemente do quão prejudiciais essas predileções são aos outros sujeitos? Como poderíamos ser neutros no planeta que experienciou o holocausto judeu, o genocídio ucraniano, o massacre em Ruanda, o terror no Timor-Leste, as guerras mundiais, dentre outras atrocidades que configuram atentados à humanidade? Ao discorrermos sobre o progresso, esperemos que este seja resultado daquilo que há de mais subjetivo em toda a humanidade: a sensibilidade, pois esta orienta ações embasadas na empatia, atributo escasso contemporaneamente. Se a indiferença engendra o mundo ordenado, que mergulhemos na desordem da compaixão e da alteridade.


Enya Souza dos Santos - 1º ano de Direito (Matutino)




Ecossocialismo: O caminho para a esperança!

 Um mundo fora de ordem ou uma ordem fora de mundo?

Pedro Duarte Silva Sinicio Abib - Direito Noturno

        A palestra “Estamos no fim do mundo?”, trouxe importantes reflexões acerca da ordem imposta sobre nossas vidas, e a esperança de mudanças mas também de existência no futuro, principalmente ao tratar com uma geração que começa a construir seus passos e lutas sobre a ameaça da catástrofe climática, cada dia mais real. Em meio a debates sobre genocídios, golpes, reivindicações e questionamentos sobre conquistas e esperanças, um termo me chamou atenção, o Ecossocialismo, enquanto mecanismo de transformação e principalmente de esperança.

        Em um mundo em emergência climática e simultaneamente experienciando a ascensão da extrema direita, as possibilidades de futuros vão se esvaziando e a luta por dias melhores enfraquece. Donald Trump em seus discurso de posse, ao tratar sobre exploração de combustíveis fósseis durante seu mandato, disse: “we are gonna drill, baby, drill” (Nós vamos perfurar, baby, perfurar), evidenciando um negacionismo completo em relação ao aquecimento do globo e confirmando a incapacidade do atual sistema posto, o capitalismo, de lidar e oferecer soluções reais para o problema.

        Outro exemplo foi o do Ministro do Meio Ambiente de Jair Bolsonaro, Ricardo Salles, que disse em entrevista que iria aproveitar a pandemia de COVID para “ir passando a boiada”, uma vez que o agronegócio estava sofrendo com problemas de produção. Ou seja, o sistema é tão ineficiente em relação ao tratamento da crise climática, que ao perceber suas consequências, a queda na produção devido a mudanças no clima, decide que não só não irá tratar do problema, como na verdade irá se certificar de trabalhar em sua intensificação, visando continuar com a lógica destrutiva que nos trouxe até aqui. A ordem ignora qualquer ciência e continua com o desmatamento e a exploração em busca de um lucro nunca suficiente. Seria como se um médico, recomendasse a um paciente com câncer no pulmão que continuasse a fumar, uma vez que o estrago já está feito e deve se tirar o “melhor proveito” da situação.   

        Sob tal contexto, percebi que o problema é na verdade a ordem, o sistema, o capitalismo, porque essa exploração destrutiva não pode ser separada dele, faz parte de seu cerne. A verdade é que a ordem que nos trouxe até aqui, está caminhando para o precipício, está ruindo e mesmo assim, tentando nos manter sobre seus princípios, dizendo que tudo ficará bem, quando na verdade, já falhou. Nós, então, nos encontraremos, em um tempo nada distante, diante de uma escolha, o fim deste sistema, ou o fim de nosso mundo. É neste dilema que enxergo o Ecossocialismo, uma nova ordem, uma nova oportunidade, enquanto um coletivo, de apresentar uma solução viável e principalmente justa, para um futuro ecológico e de justiça social, associando as lutas dos trabalhadores, à essencial luta ecológica, aos saberes ancestrais indígenas e as práticas coletivas. Somente assim poderemos instaurar um futuro possível e existente, é a tarefa da nossa geração. A geração que vive com a incerteza sobre ter um futuro, deverá ser a geração que transformará e possibilitará, um justo e sustentável, em um processo de convencimento de toda a população global, de que apenas com a mobilização contra o sistema posto, poderemos existir e compartilhar de um futuro, e que caso o contrário, estaremos todos enquanto espécie, em ameaça de extinção, tornando óbvia e única a escolha pela mudança. Precisamos mobilizar nossa luta ao redor do clima, para permitir que exista um mundo pelo qual possamos lutar.


quinta-feira, 27 de março de 2025

O Sol há de nascer novamente

No romance “A Náusea”, o filósofo existencialista Jean-Paul Sartre evidencia, através da figura de Antoine Roquentin, um aspecto fundamental da modernidade: a angústia. A narrativa gira em torno de um jovem historiador que, de forma repentina, se vê invadido por um vazio interior ao ser confrontado com suas experiências, memórias e acontecimentos ao redor, desenvolvendo perturbações emocionais que o acompanham durante toda a trajetória.  

Mesmo que tenha sido escrita em 1938, a obra de Sartre é a representação absoluta de uma sociedade hodierna cada vez mais perdida diante de uma realidade repleta de tragédias e maldades em ascensão. A náusea sentida por Roquentin ao refletir a respeito de si mesmo ressurge no século XXI quando, percebendo o caminho que a humanidade vem tomando nos últimos 50 anos, fazemos a constatação: o mundo está acabando e não há nada a ser feito.  

De acordo com o The Washington Post, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) informou, em junho de 2024, que “no final de maio, mais de 1,5 bilhão de pessoas – quase um quinto da população do planeta – suportaram pelo menos um dia em que o índice de calor superou 103 graus Fahrenheit, ou 39,4 graus Celsius, o limite que o Serviço Nacional de Meteorologia considera fatal”. Simultaneamente, pesquisadores do clima preveem que a Terra atingirá um aumento na temperatura de 3ºC até o final do século, o que ocasionará o derretimento quase total das camadas de gelo da Groenlândia e da Antártida Ocidental e um consequente aumento exponencial do nível do mar.  

O Sexto Relatório de Avaliação (AR6) do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) aponta que cerca de metade da população global vive atualmente em situação de escassez grave de recursos hídricos durante pelo menos um mês por ano, enquanto as altas temperaturas médias facilitam a proliferação de doenças endêmicas como dengue e malária. Pelo mesmo motivo, a produção agrícola sofre sérias dificuldades: na África, um continente conhecido por já enfrentar problemas severos de fome, o crescimento da produtividade diminuiu um terço desde 1961. Graças a enchentes e tempestades extremas vindas de alterações significativas na atmosfera, desde 2008, mais de 20 milhões de pessoas em todo o mundo foram obrigadas a deixarem suas casas. Com o aumento máximo de 1,5ºC exigido pela Conferência de Paris de 2015, as espécies terrestres com alto risco de extinção atingirão 14% de toda a biodiversidade e os custos com subsídios para as principais culturas alimentares ultrapassará os 60 bilhões de dólares. E o que é pior: a situação do aquecimento global chegou em um ponto evolutivo irreversível.  

No âmbito político, a experiência atual é marcada pelo renascimento do fascismo. Em seu primeiro discurso no Congresso norte-americano durante o segundo mandato, Donald Trump reafirmou suas posições contra a diversidade cultural e contra o suposto “privilégio” conferido às minorias no país, apelidado de “agenda woke”. Com base nessa negação institucional da pluralidade humana, a Secretaria de Educação do governo determinou o corte de verbas federais para colégios e universidades que promovam debates sobre variedade racial e sexual dentro do ambiente acadêmico. Entretanto, Trump não é um fenômeno isolado.  

Segundo o jornal Le Point, o retorno de Trump ao poder “não é um acaso. Ele faz parte de uma onda autoritária em ascensão, representada de forma ainda mais rígida por líderes como Xi Jinping, na China, Vladimir Putin, na Rússia, e Recep Tayyip Erdogan, na Turquia. 

Na Alemanha, em 2024, o partido AfD (Alternative r Deutschland ou Alternativa para a Alemanha), classificado na extrema-direita, comemorou um “sucesso histórico” com a vitória no Estado de Turíngia, no leste do país. Nas eleições para o Estado da Saxônia, o mais populoso, a sigla chegou ao segundo lugar. Embora o partido já tenha até mesmo sido multado por fazer uso de um slogan nazista e defenda amplas medidas anti-imigração, nada foi capaz de cessar sua onda de popularidade entre os jovens alemães.  

Exemplos não faltam. Independentemente do local, essa dinâmica demonstra um fato: a opressão ganha força no cenário moderno e, com ela, o ódio.  

Diante de todo o panorama aqui abordado, surge uma pergunta: como é possível evitar a “náusea” de Roquentin em um mundo cada vez mais caótico e violento?  

A resposta é simples, mas importante: o medo se enfrenta com a esperança.  

Paulo Freire, patrono da educação brasileira, nos dá um conselho fundamental nesse sentido: “Para mim, é impossível viver sem sonho. A vida na sua totalidade me ensinou como grande lição que é impossível assumi-la sem riscos”. Isso significa que, onde há resistência, sempre existirá também a opressão. O que cabe a nós é não sucumbir perante as forças da tirania moderna: se organizar politicamente, desenvolver um estudo crítico do corpo social, ampliar as visões de mundo e lutar, ainda que minimamente, por uma conjuntura mais justa, acende em cada coração, jovem ou não, a chama da mudança.  

Através de muita luta política e, primordialmente, de muito conhecimento sociológico, poderemos entender que amanhã é um dia que vale a pena ser vivido.  

 Vitória Alvarenga Pistore - 1º ano - Direito (Matutino)