Segundo o materialismo histórico, teoria proposta por Karl Marx e Friedrich Engels, a produção material define a humanidade, de forma que os meios de produção estão intrinsicamente ligados ao modo de vida das sociedades. Sob essa ótica, é interessante notar como a forma de trabalho influencia na vida pessoal e familiar, tema apresentado pelo sociólogo Richard Sennet em seu livro “A corrosão do caráter”, no qual é descrita a história de Rico, considerado bem-sucedido, filho de trabalhadores sindicalizados, que trabalharam diariamente para que seu filho pudesse ter uma boa formação acadêmica. No entanto, esse conceito materialista de sucesso é destrinchado ao longo da trama, uma vez que se percebe que sua busca por enriquecimento financeiro, dentro do modelo capitalista contemporâneo, degradou suas relações interpessoais e sua vida pessoal.
Diante desse cenário, a exploração capitalista na contemporaneidade é marcada pela insegurança e pela transferência de responsabilidades do empregador para o trabalhador sob uma máscara de maior liberdade e flexibilidade. Nesse sentido, as novas tecnologias possibilitaram a flexibilização do trabalho, como o home office e a uberização, e essa nova relação trabalhista é panfletada como uma maneira de independência, por exemplo de controlar o próprio horário de trabalho, sem um horário pré-estabelecido. Contudo, essa suposta autonomia faz com que o empregado não diferencie seu horário de trabalho das horas de descanso, uma vez que para conseguir bater as metas da empresa e receber um salário suficiente, muitas vezes o indivíduo tem que trabalhar muito além do período estabelecido.
Ademais, essa flexibilidade, o dinâmico mercado de trabalho, facilita as demissões e as constantes mudanças, de forma que os trabalhadores estão sempre inseguros e, como Rico, mudando de emprego. Essa vulnerabilidade cria um forte ambiente de competitividade, pois o funcionário que menos produzir pode facilmente ser demitido, o que causa desconfiança entre os colegas de trabalho. Assim, essa concorrência, somada às várias demissões e alterações de emprego, dificulta a formação de vínculos de amizade e faz com que a relação entre as pessoas se torne extremamente impessoal e superficial.
Consequentemente, as relações no ambiente de trabalho afetam e prejudicam a vida pessoal dos trabalhadores, já que se tornou mais difícil a separação entre o emprego e o privado. Nesse contexto, Rico pode ser citado, pois também apresenta dificuldade em manter o convívio familiar, em passar tempo com sua família e com seus filhos, de forma que isso pode afetar as crianças de várias maneiras, como pelo sentimento de solidão, problemas de convivência e de relacionamento com outras pessoas, entre outros. Além disso, assim como a relação trabalhista é inconstante e superficial, os relacionamentos amorosos muitas vezes tendem a também o ser, o que pode ser retratado pela existência de aplicativos de relacionamento, como o Tinder, no qual é fácil de “trocar” de companheiro, de modo a tornar as relações rasas e rápidas.
Portanto, em consonância com o materialismo histórico, a forma de trabalho influencia nas relações pessoais, de modo que o trabalho contemporâneo, por ser incerto e volúvel, baseado na competição e na maior eficiência possível, enfraquece as relações pessoais, que são relegadas, enfraquecidas e marcadas pela superficialidade.
Maria Eduarda Bergamasco-1° ano Direito(matutino)
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