De acordo com as definições de Weber, a dominação se dá pela probabilidade de que um indivíduo possa, com êxito, influenciar outro a tomar ações de acordo com as vontades do primeiro. Em um primeiro momento, a dominação possa parecer uma atitude nefasta, mas pode-se perceber que as qualidades coercitivas do ato dominador também estão presentes no simples e inocente ato de utilizar da confiança em outrem. Um pai que aconselha seus filhos, um professor que ensina seus alunos, ambos estão exercendo dominância através da confiança que lhes é incumbida a partir do pressuposto de que eles possuem mais conhecimento sobre aquilo que estão ensinando do que aqueles que estão sendo dominados, nesse desigualdade de conhecimentos se legitima a dominação. Seria essa estrutura de poder inerentemente imoral ou problemática? Acredito que não, o ato de dominar é mero instrumento no objetivo humano de transformar o mundo que nos cerca, algo que se encontra na própria fundamentação do direito, e nem toda transformação almejada por um indivíduo é egoísta, embora o formato de tais transformações sempre sejam moldados pela cosmovisão individual. O que quero dizer é que, se um indivíduo deriva prazer da felicidade e satisfação alheia, porque deveríamos considerar seu altruísmo menos valioso do que aquele realizado por um misantropo? Creio eu que talvez isso seja consequência das estruturas culturais abraâmicas, que tendem a valorizar uma ação baseado no sacrifício e no sofrimento que tal ação requereu, uma visão útil na conformação do sofrimento para indivíduos abusados. De qualquer modo, simplesmente queria demonstrar que nem todo exercício de dominação implica em um avantajamento do dominador. Mas, se aqui eu defini o uso pedagógico como sendo um uso moral da dominação, e a pedagogia sendo uma dispersão de conhecimentos, não seria então a dominação melhor vista como um "mal necessário"? Conforme o conhecimento é ensinado, o desequilíbrio de poder entre mestre e discípulo se reduz, então não estaríamos aspirando à um mundo sem desequilíbrio de poder, um mundo sem dominação? Primeiro, vale dizer que um mundo com um perfeito equilíbrio de poder seria um mundo sem individualidade, diferenças de poder não nascem apenas de diferenças em termos de magnitude sobre conhecimentos e capacidades, mas também de uma diferença de valores e morais que decidem nossas ações e como essas interagem com o mundo material. Segundo, é realmente o potencial de dominação, e por consequente a necessidade da confiança, puramente uma coisa ruim? Embora seja uma potencial ameaça para a liberdade e para aqueles que prezam por uma completa inviolabilidade do ser, o exercício de confiar e de ter a confiança de alguém é talvez uma das ações mais humanas que exista, que gera afeição, empatia, e um forte sentimento de comunidade.
Embora até aqui eu tenha argumentado pelos potenciais aspectos benéficos da dominação, não tenho nenhuma intenção de negar seus aspectos maléficos, um pai que aconselha apenas para desdenhar a individualidade de seu filho afim de satisfazer seu próprio egocentrismo, ou um professor que recusa críticas de seus alunos, utilizando de um argumentum ad verecundiam, ou seja, um apelo à autoridade de sua posição como professor para silenciar qualquer questionamento, seriam claros exemplos de um exercício de dominação sendo usado egoisticamente pelo dominador e para o detrimento dos dominados. Mas, para mim, o problema não deve ser enfrentado meramente repelindo o potencial para a dominação como um todo, pelos motivos apresentados anteriormente, mas sim pensando as questões de tratamento na nossa organização social e repensando os critérios que utilizamos para decidir quem merece nossa confiança. Para o primeiro, se ora somos mestres e ora somos escravos nesse grande jogo de dominação que envolve as relações sociais, por que aceitamos a noção de humilhar e desrespeitar os dominados? Por que damos razão para uma cultura de carteiradas, que usam de indicadores de autoridade não para ganhar e prezar uma confiança quanto a uma especialidade, mas sim para perpetuar uma ilusão de maior valor enquanto indivíduo, menosprezando os méritos dos outros? E para o segundo, enxergo que o maior desafio seja desenvolver um senso crítico sobre quem é digno de confiança, mas também ser capaz de aceitar o domínio de alguns sem danificar sua legitimidade. A legitimidade é uma necessidade administrativa, se fôssemos plenamente críticos de tudo e todos, seria impossível coordenar qualquer projeto comunitário. Mas por outro lado, se permitirmos que nossa confiança seja facilmente sequestrada por apelos irracionais, não seria difícil usar de esforços de marketing com mensagens de efeito, apelos emocionais e tradicionalistas, e utilizar dos ídolos Baconianos para convencer-nos a confiar tudo para qualquer "mito" por aí, por mais desmerecedor de confiança que ele fosse. Nisso se caracterizaria o complicado equilíbrio entre consciência e disciplina.
Uma sociedade completamente disciplinada seria uma sociedade facilmente maleável, que iria facilmente acatar ordens e se encaixaria em qualquer estrutura de poder. Embora tal sociedade pudesse ser muito eficiente, em termos administrativos, sem uma consciência bem desenvolvida, a sociedade não seria capaz de regular ou direcionar o propósito de seus trabalhos, ou de se desenvolver enquanto seres humanos. Por isso acredito que nunca devemos acreditar naqueles que exigem a disciplina de uma máquina, infalível e subserviente, temos que desenvolver um sistema que nos permita manter a nossa coesão e coordenação social, mas que também melhor atribua legitimidade e nos permita usar da nossa consciência para direcionar nossa confiança sem sermos iludidos por mal agentes.
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