O sociólogo alemão Max Weber trabalha a ideia de “ação social” como método para se estudar a sociedade. Diferentemente do “fato social” de Durkheim, a análise de Weber é mais objetiva, não olhando para o núcleo social como um todo, mas sim às ações individuais que compõe um fenômeno social a fim de identificar seus respectivos sentidos. Assim, compreende-se cada ação voltada para uma outra pessoa como uma mobilização de valores do indivíduo, a qual é dotada de uma intencionalidade, seja ela racional, efetiva ou tradicional. Já na área política, Weber reflete sobre os tipos de dominação encontrados na sociedade, na qual determinados indivíduos se submetem à vontade de outros de acordo com a legitimidade dada pela relação, podendo ela ser de ordem legal, carismática ou tradicional. Logo, a ideologia weberiana pode ser utilizada para entender as divergências entre indivíduos de diferentes culturas e como isso acarreta problemáticas como a violência, e para refletir acerca das explorações cotidianas e formas como se exclui do cidadão humilde o direito de questionar a realidade capitalista, onde o direito é o grande mecanismo de controle social e mantimento da ordem vigente.
Sabendo
que ações são condicionadas pelos valores adquiridos pelo indivíduo ao longo de
sua vida, o cenário social brasileiro, repleto de realidades distintas entre os
habitantes, se torna local de análise das diferentes ações sociais possíveis.
Na música “Fim de semana no parque”, do grupo de rap Racionais Mc`s, é tratada
a exclusão do direito ao lazer do povo pobre. Na letra, o eu lírico faz
comparações entre as interações entre pessoas de classe mais elevada em um
clube esportivo fechado e as relações entre crianças nascidas e criadas na
periferia. Enquanto aquelas têm suas ações condicionados por uma criação
repleta de oportunidades e privilégios, essas são descritas como frutos da
informalidade e da degradação do meio, brincando com os pés descalços em ruas
de terra, interagindo por meio de palavrões naturalizados em sua linguagem, e
em constante contato com as drogas e a criminalidade. Assim, é possível
entender, de forma breve, como que se dá o ciclo da criminalidade em
periferias. Da perspectiva de Weber, abandonar a escola e ingressar no crime,
para o jovem da realidade humilde periférica, pode ter motivação racional
(ganhar dinheiro), emocional (apelo dos vínculos sociais) ou tradicional (falta
de representatividade no meio educacional por parte de familiares). Logo, a
questão da perpetuação da violência em áreas mais pobres mostra-se como um
fator complexo, merecendo uma devida atenção por parte das autoridades, que
devem prezar por maiores oportunidades para esses cidadãos, ao invés de tratar
apenas como “vagabundagem”, como pensam os representantes do conservadorismo
que toma conta do quadro político atual.
Além
da análise individual do indivíduo periférico, é relevante que se reflita sobre
a relação da localidade composta por esses cidadãos com o aparelho estatal. Por
meio da tipificação ideal das comunidades pobres por parte dos agentes do
Estado, tem-se a ideia de que o crime toma conta do lugar e que a problemática
deve ser tratada de maneira autoritária. Assim, vê-se que, em periferias, as
autoridades agem, majoritariamente, de forma agressiva, vendo o morador pobre
como o estereótipo do criminoso, colaborando para que esse preconceito se
perpetue na cultura da sociedade capitalista excludente. Tal ideia é vista
frequentemente em noticiários, onde são veiculadas notícias sobre ações
policiais com fins trágicos. No estudo “Notas sobre a história jurídico-social
de Pasárgada”, do sociólogo Boaventura de Sousa Santos, moradores de uma favela
carioca relatam a relação da comunidade com os meios policial e jurídico
brasileiros. Citam como a polícia exerce sua autoridade sob a comunidade por
meio da violência, e como juristas efetuam sua dominação por meio do código de
conduta elitizado e burocrático do direito, comprometendo a compreensão do povo
humilde de sua situação jurídica. Não obstante, todas as relações entre o povo
da favela com demais esferas da sociedade aparentam ser condicionadas pelo
status legal da comunidade. Em certo momento do texto, um dos moradores fala
sobre patrões que dispensam candidatos a vagas de emprego ao descobrirem que
esses vivem na favela. Nesse sentido, o que se entende é que a classe
empreendedora brasileira leva consigo um pensamento preconceituoso que desfavorece
trabalhadores inocentes. A mesma índole pode ser vista em demais setores da
sociedade, gerando cenas como a do entregador de aplicativo que, recentemente, foi humilhado
por um morador de um condomínio fechado, que afirmava que o rapaz sentia “inveja”
de sua condição social e da cor de sua pele. Dessa forma, percebe-se que a periferia e seus
moradores sofrem com as dominações legal, vista nos abusos dos representantes
do Estado; carismática, a partir do surgimento de políticos populistas que se
aproveitam das deficiências locais para fazerem falsas promessas e se elegerem;
e a tradicional, expressa na cultura preconceituosa popular como um todo.
Logo,
o método de análise de Max Weber permite que se repare como a conduta dos
indivíduos é traçada e a relação desta com a realidade na qual está inserida.
Não somente, a visão de dominação reafirma que vivemos em uma sociedade que
preza por aqueles que seguem as normas de uma classe hegemônica, mostrando que
o Estado está a serviço dessa elite e trata de forma desigual os cidadãos. Assim,
o que se vê é que a existência da criminalidade no Brasil está diretamente
relacionada com sua grande desigualdade social e a consequente falta de
oportunidades do povo mais pobre. Enquanto se perpetua o ideal dominante de que
criminosos são só, e unicamente, frutos de desvio de moralidade, a problemática
não será enfrentada da maneira correta, e a injustiça seguirá tomando conta da
realidade nacional.
João
Victor Rodrigues Ribeiro
1º
ano- Direito
Noturno
Referências:
https://www.letras.mus.br/racionais-mcs/63447/
SANTOS, Boaventura de Sousa. Notas
sobre a história
jurídico-social de Pasárgada.
https://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/noticia/2020/08/07/entregador-registra-boletim-de-ocorrencia-apos-sofrer-ofensas-racistas-em-condominio-de-valinhos-video.ghtml
Nenhum comentário:
Postar um comentário