No meio social, os indivíduos tem
pré-disposição, ainda que inconsciente, a permanecer no conjunto a qual estão
inseridos. Quando este tecido social que mantém a sociedade começa a ser
passível de mudanças, a ruptura da ordem causa ao Estado patologia crônica, que
Durkheim dá o nome de anomia. Assim
como o corpo biológico aciona diversas defesas para se proteger de doenças, o
social utilizará do mesmo preceito na busca da manutenção da ordem. Ainda que,
do ponto de vista lógico e racional, tal ação possa ser considerada deveras
funcional e certa, é indubitável que muitos conceitos que não constam como
estabelecidos em tal âmbito social podem, da mesma maneira com que os
procedentes o foram, ser inseridos nesse meio. O combate “aos ídolos da mente”
busca, através de fatos científicos, a inserção de melhorias e da modificação
funcional das instituições. Fugindo das abstrações, um conceito concreto tal
como o sistema de cotas, que ainda
causa muita polemica, é passível de análise segundo os preceitos anteriormente
mencionados. A pouca aceitação que causou no início consegue ser justificada
nas ações de Durkheim e explicada posteriormente pelo mesmo no que cabe a
naturalização que passa a ser incumbida com o passar dos anos.
A primeira universidade
brasileira que fez experimentos com a política de cotas foi a UERJ, em 2002.
Posteriormente a isso, em outras universidades, tal implementação causou muita resistência.
Discursos como o do judiciário paranaense, que declaravam que as cotas afrontavam
“o princípio constitucional da isonomia e reforça práticas sociais
discriminatórias” foi um dos principais argumentos utilizados. A priori, quando tratado do principio isonômico
sob ótica positivista, temos sua justificação fundada no mesmo, vez que tal
conceito olha para o ato em si e o julga verdade. No entanto, quando feita a
análise da causa interna, que deixa a aparência final do fato de lado e busca a
problemática em sua essência, é indiscutível que o princípio isonômico nunca
existiu, a começar pela renda – que está diretamente direcionada a oportunidade
e investimentos no estudo – distorcida entre os concorrentes a vagas em
universidades públicas. De acordo com o texto de Carlos Góes, no Instituto
Mercado Popular, “Os dados da Pesquisa Nacional de
Amostra de Domicílios do IBGE mostram a realidade dessa distorção. Usando os critérios de classe desenhados pela Secretaria de
Assuntos Estratégicos da Presidência da República, a classe alta corresponde a 24,8% da população. Mas, nas
universidades públicas, a classe alta ocupa 45,5% das vagas. Do outro lado
dessa equação, as pessoas que estão hoje na classe baixa são 23,1% da população
brasileira, mas apenas 8,4% da população universitária. Os dados estão expostos
no gráfico abaixo:”.
Ainda que tais dados
sejam de 2013, não há alterações consubstanciais para o ano presente. Isso
mostra em evidencia que um ponto que muito foi passado em diversas gerações
brasileiras, começando com o ingresso de brancos ligados ao governo nas
primeiras universidades, enquanto os negros ainda praticavam trabalho escravo,
perpetuou-se na história. Como Durkheim mesmo afirma “(...) Instituições e/ou práticas sociais não
surgem do nada, mas de necessidades, de causas eficientes, que se vinculam ao
ordenamento geral do organismo social”, que aplicado a situação atual, na qual
a emergência de renovação no ensino do país, começa a se efetuar políticas tais
como as cotas raciais e sociais.”
Outro argumento
acatado pela maioria concerne ao fato de indivíduos que adquirissem tais “privilégios”
poderiam vir a ser “menos capazes” de conseguir permanecer na faculdade pública
devido à sua defasagem. Outra pesquisa que abona isso é a feita por Teresa
Olinda Caminha, em 2006, em sua tese de doutorado sobre o assunto, publicado na
Revista Fórum: “Neste estudo, Teresa e Gurgel ajudam a derrubar um dos mitos do
discurso anti-cotas. Dos 32 cursos oferecidos pela UERJ, seis são analisados no
artigo, todos da turma ingressante no ano de 2006, e apontam para uma
equivalência de notas no desempenho entre cotistas e não-cotistas, que contrapõe
os valores alcançados no vestibular. No curso de Administração, os
cotistas tiveram uma média de 30,48 pontos no vestibular, contra 56,02 dos não
cotistas, quase o dobro de diferença. Porém, o desempenho durante o curso
mostra um crescimento no rendimento dos cotistas, que chegam à média de 8,077
contra 8,044 dos não cotistas."
“A superação demonstrada pelos alunos cotistas é
considerada “espetacular” por Teresa. “Eles rompem barreiras como preconceito e
o histórico de ensino precário, mostrando que esse mito do ‘nível’ é apenas
isso, um mito, sem qualquer base cientifica que se justifique.” Outro
preceito desmentido no estudo é o da evasão (ver tabela abaixo), o que
configuraria um “fracasso escolar”, nas palavras de Teresa e Gurgel. Nos seis
cursos avaliados, a evasão de não cotistas é sempre maior.”
A reportagem,
publicada em 2013, ainda continua com uma informação significativa: “Hoje, dez
anos depois da experiência da Uerj, 32 das 38 universidades estaduais já
adotaram modelos de ações afirmativas. No princípio, leis estaduais obrigavam
as instituições a oferecem cotas, caminho seguido por 16 delas. Porém, com o
passar do tempo, a outra metade das adesões foi espontânea, se dando por meio
de resoluções dos conselhos universitários”. Em tal parágrafo, podemos observar
consubstancialmente o momento em que a ameaça de uma anomia, gerada pelas
costas, vai de uma reação negativa pela sociedade que enxerga no horizonte sua
desagregação, e passa a ser a reprodução de um modelo coletivo, primado para a
melhoria e avanço do meio.
Dessa
forma, a análise gerada propõe refletir: até que ponto as mudanças geradas
conforme o avanço da tecnologia e do pensamento proporcionado pode vir a ser
causa da degradação da sociedade causada pela anomia, ou de sua salvação num
momento caótico gerado pela manutenção das tradições?
Michelle Fialkoski Mendes dos Santos – 1° ano
Direito Diurno
Referencias bibliográficas: https://www.revistaforum.com.br/digital/138/sistema-de-cotas-completa-dez-anos-nas-universidades-brasileiras/
http://mercadopopular.org/wp-content/uploads/2015/07/uni.png
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