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sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

A luta dentro do Direito


            Pierre Bourdieu desenvolve uma teoria na qual relata que a sociedade é repleta de campos: científico, artístico, esportivo, jurídico. Cada um possui uma certa autonomia e um poder simbólico, que é hegemônico dentro do seu próprio campo. O poder simbólico do Direito seria, por exemplo, sua linguagem e a moralidade universalista.
Bourdieu considera simplista olhar o Direito apenas segundo o formalismo ou segundo o instrumentalismo. O primeiro, defende que o campo jurídico é puro e possui autonomia absoluta. Já o segundo, defende que o Direito é mero instrumento da classe dominante. O autor reivindica uma maior complexidade na interpretação.
Por mais que o Direito expresse sua racionalidade auto afirmando-se neutro e universal, e declarando suas bases como sendo a ciência e a moral, isso não passa de uma roupagem para se autodeclarar legítimo. Ele não é neutro, pois recebe influências externas; e sua moral pertence à quem aplica-o.
O Direito possui autonomia relativa, pois incorpora as demandas externas da luta social. Como no caso julgado pelo STF quanto ao aborto de anencéfalos. O pedido da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde (CNTS) foi pela não criminalização do aborto tanto para as grávidas, quanto para os médicos que realizem o procedimento.
Procedimento esse que preferem chamar de antecipação terapêutica do parto, pois não seria considerado um aborto (quando é interrompida uma gravidez, cujo feto possui potencial vida extrauterina).
Segundo Bourdieu, a hermenêutica limita-se ao espaço dos possíveis. Foi exatamente isso que pediu a CNTS: não pleitearam a retirada dos arts. 124, 126 e 128 do Código Penal, que tratam sobre a criminalização do aborto. Solicitaram que a norma permanecesse em vigor, com a interpretação que a Corte lhe viesse a dar. Clamaram, na ADPF, por uma interpretação que fosse além da positivista pura. Isto é, na medida do possível, uma alteração na leitura pura da letra da lei.
A conquista do direito de abortar um feto com anencefalia é uma medida timidamente progressista. A luta dentro do Direito pode parecer engessada, por ter de ceder ao poder simbólico. Cabe ressaltar o quão necessária ela se faz, principalmente nos dias atuais.

Flávia Oliveira Ribeiro

1o ano - Direito matutino

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