Bourdieu tinha em seu pensamento o conceito de "Campo", um espaço onde determinados agentes estariam competindo por um objetivo, seguindo um conjunto de regras, esse "Campo" não seria harmônico, pelo contrário, haveria sempre um conflito inerente e as contradições seriam parte importante das lutas pelo objetivo.
No campo jurídico todo o cenário é potencializado, uma vez que o Direito já é uma área que pressupõe um conflito que precisa ser solucionado por via judiciária, e mesmo esta solução demanda uma discussão e uma competição por se convencer a autoridade judicial, jurados ou juízes, de determinada posição enquanto verdade absoluta.
O grande problema é quando há um "conflito de Campos", onde há diferentes regras, diferentes atores, diferentes contradições, mas o objetivo é o mesmo. A ADPF 54 ( Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental), tinha como tema central a (des)criminalização do aborto de anencéfalos, que poderia estar relacionado á crime tipificado no Código Penal. Ao final do julgamento, se julgou improcedente essa conduta, com o aborto de anencéfalos sendo desconsiderado enquanto crime. Porém houve grande controvérsia resultante da ação dos diferentes Campos, com seus diferentes Hábitos, dentro do processo.
O conflito mais claro em toda a ação envolveu o Campo Jurídico e o Campo Religioso, e o ponto de intersecção de ambos foi justamente o ponto da Laicidade do estado, além disso, há colateralmente uma discussão á cerca da legalização do abordo de uma forma geral, mais ampla, defendida por setores da sociedade com base na triste realidade do aborto clandestino no Brasil, na autonomia e liberdade da mulher em relação ao seu corpo e no caráter laico do Estado brasileiro. Este caso traz mais um Campo á tona, o Campo Social, com seus emissores de opinião e massa de pressão.
Fato é que, seguindo a teoria de Bourdieu, mesmo intra-Campos, há sérios conflitos, dentro do Campo Jurídico há os seguidores da norma de forma total, os mais moderados e os que defendem uma total revolução, com a mudança jurisprudencial como começo. O campo Religioso é permeado de conflitos tão ou mais severos, com alas ultraconservadoras e extremistas, da mesma forma que setores da sociedade.
Ao se trazer tudo isso para o "campo" do Campo jurídico, com um julgamento de caráter abrangente como a ADPF 54 no STF, se viu todos os conflitos se potencializarem. Tanto entre campos, como neles, houve discussões e a busca por melhores ferramentas para se alcançar o objetivo, fato é que a busca pela "racionalização" ou pelo caráter "divino" do estado seguem sempre a estrada do conflito, e ela sempre acaba em localidades definidoras que são "jurídicas".
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