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domingo, 9 de outubro de 2022

Historicização da norma e judicialização da política como fatores de garantia de direito.

 

A historicização da norma, conceito difundido pelo sociólogo Pierre Bourdieu, consiste na tentativa de trazer a norma para o presente, em suas palavras “adaptando as fontes a circunstâncias novas, descobrindo nelas possibilidades inéditas”. Tal ideia, aliada com a judicialização da política, sob a perspectiva de Antonie Garapon, funciona como um mecanismo facilitador de garantias sociais e individuais na sociedade contemporânea.

  Em primeiro plano, a ADI ( Ação Direta de Inconstitucionalidade) 4277 é um claro exemplo de historicização da norma. O STF, nesta decisão, permitiu a união entre pessoas do mesmo sexo (união homoafetiva). Deste ponto, torna-se claro que a proposição e aceitação de tal medida, seja por mutação constitucional ou  por interpretação construtiva do direito não é feita com base em ideais conservadores de uma sociedade antiga, mas, sim, por um meio social contemporâneo que detém grande diferença de princípios quando comparado ao passado. Com isto, trazer normas constitucionais expressas em 1988 para os dias atuais, implica uma nova forma de observar e materializar prerrogativas, através de anseios e valores de organizações fortalecidas merecidamente ao longo do tempo, como as comunidades LGBTQIA+, permitindo e ampliando a sociedade pluralista e democrática expressa no texto constitucional e em suas vias implícitas.

   Em segundo plano,  a judicialização da política, fenômemo em que muitas decisões em tese políticas ou de caráter legislativo são transferidas ao poder judiciário, também apresenta grande importância para a materialização de prerrogativas, mesmo com visões polêmicas sobre o assunto. Para Antonie Garapon, a democracia transforma o homem, desfazendo os laços hierárquicos “naturais”, recriando-os artificialmente pelo direito. O indivíduo liberta-se da tutela de seus magistrados naturais, adquirindo mais liberdade( política, econômica e social). No entanto, tal liberdade,  permite ao ser humano dúvidas quanto a aspectos que nunca foram enfrentados por estes, fundamentando uma nova tutela no juiz estatal. Deste modo, segundo Garapon “ chama-se a justiça no intuito de apaziguar o molestar do indivíduo sofredor moderno. Para responder de forma inteligente a este chamado, ele deve desempenhar uma nova fruição, forjada ao longo deste século, a qual poderíamos qualificar de magistratura do sujeito”. Com isto, a tutela do juiz estatal é definida como esta magistratura do sujeito, capacidade de amparar o indivíduo, resolver suas inquietações e garantir prerrogativas. Assim, o juiz ao expressar sua autoridade, em bases constitucionais, fomenta prerrogativas e ampara grupos, como a comunidade LGBTQIA+, no caso da ADI 4277. Nota-se que a judicialização da política é um fenômeno ainda anterior, em termos de processo, quando comparada a historicização da norma, visto que para um determinado direito ser ampliado ou ter suas características mudadas, é necessário que decisões “políticas” cheguem ao judiciário.

  Ademais, por fim, busca-se refutar, a concepção de Ingeborg Maus, quanto a conotação negativa de interferência do judiciário, assemelhando-se ao ativismo judicial. Para Maus, a ascensão da justiça como a condição de mais alta instância moral da sociedade, escapa o poder judiciário de qualquer mecanismo de controle social, interferindo nos demais poderes. Discordando de  Maus, nota-se que a moralidade não é o princípio norteador das ações do judiciário e, sim, a constituição. Deste modo, a justiça consolida-se como um guardião da Constituição(espaço de possibilidade de atuação da justiça, espaço dos possíveis, na visão de Bourdieu), estando ela própria limitada por esta. Além disso, grande parte de decisões políticas tomadas pelo judiciário, no contexto brasileiro ,são feitas pela omissão do poder legislativo em questões difíceis que envolvem diversos sujeitos da sociedade. As ideias de Maus também se encontram disseminadas em um contexto próprio, alemão, com o TFC( Tribunal Federal Constitucional Alemão). Tal contexto diverge historicamente, politicamente e culturalmente de outros tribunais ao redor do mundo, não levando em conta também o avanço do ultraconservadorismo, o neoliberalismo e as consequências de ambos para a constitucionalidade e manutenção do status democrático.

  Em síntese, conclui-se que a historicização da norma e a judicialização da política são fatores importantes para a garantia de direitos( em exemplo, a união homoafetiva) sendo necessária a refutação de concepções muito singulares e que não explicitem de maneira correta o ativismo judicial e as funções do poder judiciário.

João Felipe Schiabel Geraldini. 1ano, Direito Noturno.

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