Um dos movimentos mais importantes e influentes da história da humanidade foi o Iluminismo. Essa ideologia tinha como objetivo permitir que a razão fosse utilizada como forma de validar o conhecimento, principalmente a partir do uso do método científico, conceito muito bem fundamentado por Francis Bacon, René Descartes e Galileu Galilei, principalmente. Ainda dentro desse contexto, o positivismo foi concebido e ganhou visibilidade por estar fortemente ligado aos ideais iluministas do final do século XVIII. Formulado principalmente por Auguste Comte, a corrente positivista tinha três características principais: a rejeição da teologia e da metafísica, a afirmação da empiria e a afirmação da ciência como conhecimento verdadeiro da realidade. Em suma, o positivismo estava preocupado em estudar a sociedade através das “lentes” das ciências naturais, uma maneira de atribuir o rigor técnico-científico próprio, principalmente da biologia, às ciências humanas. Mesmo que esse modelo de pensamento já tenha sido interpretado e contestado ao longo do tempo perdendo, assim, credibilidade, atualmente ainda é possível encontrar ecos desse retrógrado fenômeno na sociedade, principalmente na brasileira.
Nos séculos XVIII e XIX, como resposta ao racionalismo e ao empirismo da modernidade, surge um movimento artístico que fico conhecido como Romantismo, que defendia, através da literatura, pintura, arquitetura e música, uma outra forma de se compreender o mundo, muito mais focada nas emoções e nos sentidos. Nesse contexto, surge um dos livros mais importantes da literatura ocidental quando falamos sobre o questionamento dos impactos do cientificismo na sociedade: “Frankenstein ou o Prometeu Moderno”, da escritora inglesa Mary Shelley. É possível estabelecer nesse texto um paralelo entre o positivismo, seu “Culto à Ciência” e seus impactos para o mundo sob a ótica romântica, ainda que o livro de Mary Shelley tivesse sido publicado antes do “Curso de Ciência Positiva”, principal obra positivista de Comte.
Em resumo, “Frankenstein ou o Prometeu Moderno” é um romance gótico que conta a história de Victor Frankenstein, um cientista que descobre uma forma de criar vida a partir de cadáveres usando a ciência e que sofre as consequências produzidas por sua ação. O que motiva Victor a construir a criatura é justamente a sua obsessão em descobrir os “segredos ocultos da natureza”. É um homem que leva em conta apenas a técnica científica, nada mais. A impossibilidade de refletir profundamente sobre as possíveis consequências de sua experiência, provoca a ruína de sua família e dele próprio, que, ao se deparar com uma criatura “tão horrenda que nem Dante poderia tê-la concebido”, ele a renega, fazendo com que o monstro vague pelo mundo sendo rejeitado e, por fim, se vingando de seu criador. É uma crítica direta à mentalidade de caráter positivista de Victor Frankenstein: ele não “busca a essência das coisas, apenas a [frágil] vinculação entre os fenômenos”.
Trazendo o positivismo para o século XX, outro pensador faz críticas a esse movimento assim como Mary Shelley. Edgar Morin é um intelectual francês que rejeita fortemente a compartimentalização do saber proporcionado pela Revolução Cientifica, afirmando que a própria ciência está em crise, já que ela não estimula uma maneira de se analisar fenômenos conjuntamente de maneira complexa, ou seja, priorizando o todo ao invés das partes. Para ele, não há como existir um saber universal ou uma verdade absoluta. É preciso levar em conta que a subjetividade do pesquisador, marcada por questões culturais e históricas, faz parte da construção do conhecimento tanto quanto a informação por ele analisada. Dessa forma, é necessário construir o conhecimento por meio de diferentes estruturas de pensamento, concedendo um papel essencial a filosofia para que ela seja utilizada como uma ferramenta que acompanha a ciência, possibilitando uma visão mais totalizante do saber científico. Em suma, podemos dizer que precisamos da filosofia para que a ciência se entenda como um saber científico, é por isso que, para Morin, quanto mais progredimos, mais transgredimos.
Indo na contra mão de Mary Shelley e Morin, podemos destacar o astrólogo e guru intelectual do Presidente da República Jair Messias Bolsonaro: Olavo de Carvalho. Em sua obra “O imbecil coletivo”, o autor defende que um dos maiores problemas do “homossexualismo [sic]” é de ordem biológica e social, relação entre dois elementos muito presentes no positivismo de Comte. Para Olavo, uma das críticas que faz sentido tecer ao comportamento homossexual, é que, caso ele seja amplamente adotado pela humanidade, enfrentaremos uma extinção eminente. Essa teoria é perigosa, porque, mesmo fazendo algum sentido superficialmente, ao analisarmos ela de modo complexo, conforme a “Teoria da Complexidade” de Morin, podemos concluir que ela não é devidamente fundamentada: faltam dados, estudos científicos e exposição de outros pontos de vistas ao longo de sua obra. Não podemos dizer, no entanto, que suas afirmações são anticientíficas. Muito pelo contrário! Há ciência em sua fala, só que é um tipo de ciência anacrônica e cada vez mais deslegitimada: a ciência positiva. Isso torna o Olavo de Carvalho uma figura perigosa, já que ele traz ideias - supostamente - libertadoras e incontestáveis e, ao mesmo tempo, se sente orgulhoso ao conceber e reforçar aberrações como preconceito e homofobia. A grande diferença entre Victor Frankenstein e Olavo de Carvalho é que a criação do primeiro, ao longo do romance, se revela bondosa e busca se encher de conhecimento e sonhos, já a do segundo, prefere o ódio e a intolerância.
DIOGO PERES TEIXEIRA – 1º ANO – DIREITO MATUTINO
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