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domingo, 7 de agosto de 2016

Imparcialidade: a nefasta utopia

O fato social está no centro da teoria sociológica durkheimiana, trata-se de um fenômeno que existe e se impõe independentemente da vontade subjetiva, exercendo, pois, força coercitiva sobre o indivíduo- a qual se torna explícita quando há tentativa de resistência à conduta vinculada ao fato social. Apenas por tal definição percebe-se a prevalência da sociedade sobre o indivíduo, para Durkheim os nossos comportamentos e costumes são construções sociais, por mais que os concebamos- equivocadamente- como frutos da individualidade ou como inerentes à natureza humana.
Diante do fato social, o papel do sociólogo seria descobrir a causa, a raiz do fato patológico ou normal- que comumente está em outro fato social- para depois verificar a função que esse fato possui dentro do organismo social. Esse estudo, porém, deve ser feito pautado na imparcialidade, ou seja, o sociólogo não deve emitir posições ideológicas no trabalho cientifico. Apesar de não admitir a parcialidade do sociólogo, Durkheim reconhece que as instituições- que são exemplos de fatos sociais- como família e escola não são neutras. Tanto não são que elas possuem uma ‘’causa eficiente’’, moldam o individuo- desde a mais tenra idade- a fim de garantir condutas morais e comportamentais que permitem a ‘’harmonia’’ da sociedade.
A partir desse panorama, o pensamento durkheimiano permite-nos refutar o ‘’Escola Sem Partido’’ e, ao mesmo tempo, tal projeto possibilita uma crítica ao pensamento desse sociólogo. Contida no Projeto de Lei nº 867/2015, a proposta- em síntese- pede pela proibição da abordagem em sala de aula de assuntos como desigualdade de gêneros, diversidade sexual, racismo e pensamentos políticos- filosóficos contrários ao capitalismo, sob a alegação de a escola deve ser um local neutro e que tais abordagens ‘’doutrinam’’ o estudante.
No entanto, como reconhece Durkheim, a educação escolar não é parcial, os fatos sociais não são. Trazendo para as escolas brasileiras: o uso de uniforme, a veneração à bandeira, ao hino nacional, o método de avaliação meritocrático e perspectiva eurocêntrica, principalmente, em história e literatura são ideologias, são partes de um projeto político- pedagógico que serve à manutenção do sistema socioeconômico hegemônico. O que se pretende, de fato, é retirar as chances- que já são mínimas- de uma formação escolar crítica e plural e há implícito o medo de que aqueles fatos sociais necessários à manutenção do status quo sejam alvos de questionamentos.
As escolas, portanto, já são permeadas pela a presença da ideologia dominante, não há parcialidade nessa instituição e nem nos indivíduos que a compõem pois o juízo de valor, a análise ideológica faz parte do homem. A diferença é que quando os nossos posicionamentos condizem com o pensamento dominante, eles são tratados como neutros pelo senso comum da sociedade, mas como afirmou Weber ''neutro é quem já se decidiu pelo mais forte''. E é nesse sentido que cabe a crítica a Durkheim: a sociologia neutra é utópica e nociva. Utópica porque as ''paixões'' são inerentes ao homem e nociva, porque omissão é conivência e, na maioria das vezes, conivência com retrocessos, com atrocidades. 

Juliana Inácio- Direito noturno

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