O racismo estrutural, de acordo com Silvio Almeida, é uma expressão sistêmica e inconsciente do preconceito racial contra pessoas pretas. Ele é estrutural porque não é necessariamente a prática consciente do preconceito por um ou alguns sujeitos, mas porque permeia toda a sociedade e seus efeitos são notáveis mesmo naqueles que identificam-se como antirracistas. Assim, esse conjunto de comportamentos se reproduz em diferentes esferas, desde o cotidiano, até a política, a cultura e a economia, sujeitando toda a sociedade em conjunto à uma orientação contrária a uma raça.
Essa questão pode ser analisada sob o prisma da sociologia compreensiva de Weber e seu conceito de “ação social”. No entanto, primeiro é necessário conceituar a ação social no pensamento weberiano: ela é toda ação que leva em conta e é orientada pelo comportamento dos outros sujeitos, ou seja, é toda ação contextualizada na teia de relações sociais; está em oposição às ações reativas e automáticas por receber do indivíduo uma racionalidade, o indivíduo age socialmente quando age baseado em fins, valores, tradições, afetos, ou até preconceitos latentes.
Ao utilizar essa chave interpretativa para compreender o fenômeno do racismo estrutural, lançam-se luzes ao problema e percebe-se que a afirmação de que mesmo indivíduos antirracistas estão sujeitos a uma atuação racista é completamente sensata. Isso porque os valores consagrados por séculos na sociedade em relação à raça advém de uma fonte preconceituosa, ainda que escamoteados. Dessa forma, as atitudes que são não intencionalmente racistas explicam-se pelo fato da ação social de seus perpetradores orientar-se pela atuação corrente dos demais em relação a pessoas pretas, buscando a repetição, ainda que subjetivamente não haja intenção racista. Ainda que nenhum desses sujeitos seja pessoalmente racista, todos estão reproduzindo um comportamento generalizado de um racismo imbricado nessa estrutura social.
Assim, é observável que muitas ações sociais cotidianas – por exemplo, decisões de contratação, julgamentos de “boa aparência”, ou a atribuição de suspeição criminal a pessoas negras – não decorrem necessariamente de uma intenção racista consciente, mas ainda assim são socialmente orientadas por símbolos culturais e históricos associados à raça, na qual ocorre uma hierarquização maniqueísta. A naturalização dessas ações, muitas vezes também disfarçadas como piadas, revela que a estrutura racista não depende apenas da má intenção individual, mas simplesmente da adequação das ações individuais a padrões culturais, institucionais ou à mera repetição mimética dos demais.
Os indivíduos atuam dentro de símbolos e hábitos herdados da tradição e da cultura, muitas vezes sem refletir sobre eles. Isso reforça a análise de Almeida de que o racismo estrutural é reproduzido “pelas costas dos indivíduos”, isto é, mesmo sem intenção deliberada, por meio de ações sociais guiadas por costumes e práticas historicamente racistas. A estrutura social fornece os sentidos e expectativas que moldam a ação, e é precisamente isso que garante a eficácia e persistência do racismo enquanto fenômeno estrutural.
O centro da tese de Almeida está na transposição daquilo pode caracterizar um ato como racista, ao invés de adotar a tese corrente de que um ato racista depende sempre de uma intenção subjetiva racista, Almeida sugere que os atos em si mesmos são racistas, o que gera certo escândalo, que é o motor do desejo de compreender o fenômeno. “Por que atos racistas são cometidos por indivíduos que negam ser preconceituosos?” A explicação está na reprodução do padrão histórico, que tem origem num racismo consciente, através da ação social até a modernidade, onde essa intenção subjetiva desaparece, mas conserva a estrutura essencial dos atos preconceituosos. Ocorre que os indivíduos, ainda que orientem racionalmente suas ações para adequarem-se ao contexto em que estão inseridos, não racionalizam toda a cadeia histórica que explica seu modo de agir, o que permitiria a tomada de consciência acerca da natureza racista constante de seus atos. Dessa forma, o racismo estrutural segue permeando os hábitos da sociedade sem uma consciência clara de seus promotores.
Artur Azevedo Rodrigues - 1º ano - Direito (noturno)
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