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sexta-feira, 24 de março de 2023

Sociedade às avessas: o indivíduo acima da comunidade

                 

                Paralelo à ampliação do acesso populacional a informações, o advento de diversos impasses contemporâneos, como a difusão de epidemias, o crescimento de guerras e conflitos étnicos, o avanço de movimentos negacionistas e a ascensão de governos de extrema-direita ao longo do globo, induzem à percepção de que o mundo hodierno se encontra em uma aparente situação desordenada. Todavia, baseando-se na lógica da imaginação sociológica, preconizada pelo sociólogo Charles Wright Mills, isto é, analisando esse contexto a partir de uma perspectiva coletiva e social, e não através de suas particularidades, observa-se que essa aparência caótica se constitui uma percepção equivocada, posto que a compreensão da gênese de tais adversidades permite a conclusão de que a modernidade, na verdade, se atém cada vez mais a uma ordem individualista, oposta à concepção sociológica citada.

                Seguindo esse raciocínio, convém comprovar como os obstáculos vivenciados pela comunidade global atual se relacionam diretamente ao avanço do individualismo. Nesse sentido, em termos práticos, embora a conduta, os comportamentos e as perturbações particulares do indivíduo têm como agente o próprio ser, não é possível dissociar tais questões do contexto coletivo no qual ele está inserido, posto que, ainda de acordo como o sociólogo supracitado, as atitudes particulares estão intimamente relacionadas às características desse contexto. A própria mentalidade do indivíduo, conforme propõe Francis Bacon, pauta-se em pré-noções, internalizadas no mesmo através da influência do meio social. Todavia, observa-se uma hodierna tendência na sociedade de negação da coletividade, em detrimento de seus interesses particulares, colocando a individualidade acima da promoção do bem comum.

                Como consequência, emerge-se um processo gradual de subversão do conceito de sociedade como um coletivo de indivíduos inter-relacionados. Essa mudança resulta em manifestações de aversão à diversidade, ao se observar o crescimento de casos de discriminação em termos raciais, culturais, econômicos e sociais, e a ascensão de governos que normalizam tais formas de preconceito. Ademais, nesse corpo social individualista, questões como a saúde pública, assistencialismo governamental, combate à pobreza e à desigualdade, e outros fatores importantes para a promoção de uma comunidade global harmônica e igualitária, acabam sendo suprimidos, dado que ultrapassam a esfera particular, o que culmina nas adversidades inicialmente citadas.

                Portanto, os diversos impasses que se disseminam na contemporaneidade estão intimamente relacionados ao avanço de uma ordem individualista no tecido social global, a qual se opõe à perspectiva da imaginação sociológica. É nesse contexto que o abandono dos paradigmas pré-estabelecidos em favor do apelo à racionalidade, como proposto por Descartes, se constituiria um passo fundamental para a superação da valorização exacerbada do “eu”, a fim de promover uma sociedade solidária, que tenha o bem coletivo como pilar indispensável ao seu funcionamento.

Eduardo Garcia da Silva

RA: 231220324

1° Ano – Direito Noturno

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