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quinta-feira, 15 de agosto de 2019

ADPF 54 e Conexões com Bourdieu


A análise da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 54 suscita vários pontos relevantes ao campo jurídico e, portanto, também promove encontros com as teses de Bourdieu sobre o poder simbólico. Se trata de uma discussão polêmica dado a matéria do aborto, mas leva em conta questões como a autonomia jurídica, o papel do judiciário atualmente e quais são os limites do direito.
             É discutido extensivamente durante os votos dos ministros a definição de quando começaria a vida. Se deveria ser levado em conta o Código Civil que considera a respiração como fator determinante, os levantamentos de uma série de organizações médico científicas, a exemplo da OMS que estabelecem a atividade cerebral como tal fator ou ainda a voz de grupos sociais concepcionistas. Lançando mão de Bourdieu, cada grupo com seu ‘‘Habitus’’ - cada um com disposições incorporadas advindas de suas referências de classe - trouxeram diferentes capitais a discussão. Entretanto, quando se fala de um feto anencéfalo é inútil definir qual seria o começo da vida, visto que é materialmente comprovado que tais fetos não irão sobreviver, morrendo antes ou pouco depois do parto. Dessa forma, não são seres humanos em potencial. Ademais, os casos excepcionais tragos à tona em que supostos fetos anencefálicos sobreviveram, tratam-se na verdade de mesofalia.
             Tendo isso em vista, a antecipação terapêutica avaliada, não compete questões como eugenia ou findar vidas em potencial. O aborto se trata da dignidade da vida da mulher e da sua autonomia, explicitado na fala dos Confederação Nacional de Trabalhadores na Saúde (CNTS) seguinte:
“se não há, na hipótese, vida a ser protegida, nada justifica a restrição aos direitos fundamentais da gestante (dignidade, liberdade e saúde) que a obrigação de levar a cabo a gravidez acarreta”, eis que, em tal hipótese – segundo sustenta -, “A incidência da norma penal no caso (...) será inteiramente desproporcional e inconstitucional”.

                Ao fim desse acórdão, é perceptível fenômenos descritos por Bourdieu como a historização da norma e como o direito é formado pela soma da lógica positiva da ciência com a lógica normativa da moral. O primeiro ponto, pois se observava até poucos anos um movimento global de maior reconhecimento pelos direitos femininos, negados por uma perspectiva histórica patriarcal a tanto tempo. Já o segundo se confirma no extenso debate durante a votação opondo a lógica do direito e confirmações cientificas com a moral judaico cristã da sociedade brasileira. 
                A decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal é acertada, pois ela não tem um caráter de obrigatoriedade, mas de possibilidade a gestante. É livre a cada mulher decidir o destino de seu corpo. E nesse sentido, o direito não ultrapassa os limites de seu campo, foram suficientemente sopesadas as reivindicações de cada grupo – cientifico, feminino, cristão etc. Contudo, em concordância com o Ministro Ricardo Lewandowski, essa decisão não cabia ao judiciário, em oito anos de curso que essa ADPF perpassou, deveriam ter sido tomadas outras providências para que a instância do judiciário não suplantasse o legislativo.  

Jaqueline Sayuri Marcola Abe 1ºano Direito Matutino

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