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sexta-feira, 29 de junho de 2018

CONTRA-HEGEMONIA NO DIREITO CONTEMPORÂNEO



Ao analisarmos o texto do capítulo 6 do livro "As Bifurcações da Ordem" do sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, logo de início faz-se perceber a preocupação do autor com o tema justiça social. Para a solução de problemas históricos relacionados ao tema o autor cita as injustiças praticadas a anos contra diversos grupos minoritários e diz ser mister uma interpretação inovadora do direito que vá contra a rotina e que seja socialmente responsável, o que pode e deve levar algum tempo para ser concretizado, tendo em consideração que isto – a questão da demora – não é um problema tão grave assim, pois, como diz o autor, não importa a quantidade de justiça feita e sim a qualidade da justiça, para que esta se transforme em uma justiça mais cidadã e menos voltada para a defesa dos que economicamente dominam.
Passeando pelo movimento histórico de evolução das ocupações de terras em território brasileiro, Boaventura explica que, após o processo de independência em relação a Portugal, o Brasil passou por um período determinado por juristas agrícolas de “Regime de Posses”, onde, devido à ausência de leis regulatórias, os espaços agrícolas foram sendo ocupados por grileiros e pelos proprietários rurais de antanho, dando origem a essa imensa discrepância que há na proporção entre terras/proprietários que existe nos dias atuais em nosso país. Segundo dados de uma pesquisa realizada em 2015 pelo CNPq/USP, denominada Atlas da Terra Brasil, de todo o espaço geográfico do território nacional, o que equivale a 851,6 milhões de hectares, 318 milhões de terras concentram-se nas mãos de grandes latifundiários. Desse total, 175 milhões são considerados terras improdutivas, todavia, mesmo assim, ainda rendem capitais para os seus proprietários que as deixam como lastro hipotecário em grandes operações financeiras nos empréstimos junto aos Bancos do Brasil.
Nesse ínterim, no final dos anos de 1970, surge o MST – o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – no sul do Brasil com o lema “terra para quem nela trabalha”, logo após um período onde os integrantes da liga camponesa brasileira, que também lutavam por reforma agrária no país, foram duramente oprimidos e dizimados pela ditadura militar, o que só faz reforçar a ideia de Direito Configurativo encontrada em Boaventura de Sousa Santos, a qual afirma que o Direito reflete uma determinada configuração nas relações de poder. Se estas relações forem desiguais e destinadas a produzirem injustiça e opressão, o Direito também será injusto e opressor.
Capítulos posteriores dessa triste novela social brasileira que se arrasta ao longo dos anos, veio trazer para o seio do poder judiciário a questão da Fazenda Primavera situada no Rio Grande do Sul. Integrantes do MST – apoiados no princípio fundamental da constituição federal brasileira em seu artigo 5º, inciso XXIII (o qual diz que a propriedade deve atender a sua função social) – tomaram posse da mencionada fazenda. Munidos dessa prerrogativa constitucional e de todo um aparato jurídico, o MST conseguiu conter um agravo de instrumento impetrado pelos advogados do Sr. Loivo Dal Agnoll, o agravado, diante de recusa em primeira instância do pedido de reintegração de posse feito pelos mesmos. Esse amparo jurídico é de fundamental importância para se obter êxito em lutas como essas, de cunho contra-hegemônico, como bem explica Boaventura de Sousa Santos: “Em primeiro lugar, os grupos excluídos precisam se organizar social e politicamente em movimentos sociais ou organizações não governamentais e em segundo lugar são necessárias estratégias jurídicas e sociais inovadoras nas relações com os tribunais, acompanhadas de pressão política sobre os órgãos do Estado e sobre os próprios tribunais”.
Evandro Oliveira Silva - Noturno

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