Um dos casos que mais problematizam a questão fundiária brasileira é o do Pinheirinho. Nessa ocupação habitacional viviam cerca de 6 mil indivíduos de baixa renda durante 8 anos até que no início de 2012, por processo movido pela massa falida da Selecta SA, a justiça estadual de São Paulo, por determinação da juíza Márcia Loureiro (6ª Vara Cível de São José dos Campos), colocou que a região deveria ser desocupada e ordenou uma reintegração de posse. Entretanto tal decisão levantou questionamentos a respeito de sua validade, tendo em vista as dúvidas quanto: a origem do adquirimento da propriedade pela empresa, a diferenciação entre o conceito jurídico de posse e propriedade, o caráter liminar da ordem de reintegração da posse e a função social da terra. Além do evidente ataque aos direitos humanos que decorreu na ação policial de desocupação, segundo dados do CONDEPE em um único dia foram relatados 507 relatos de casos de violência física ou moral.
Analisando o julgado à luz do sociólogo alemão Max Weber constata-se as influências da idade moderna. Para o pensador a modernidade despontou o crescimento da atuação burguesa nos diversos ramos sociais, exercendo um poder de dominação legitimado pelo ideal de igualdade proveniente das novas relações de trabalho. Essa elevação da classe burguesa ocasiona a debilitação do formalismo jurídico por interesses materiais “o desejo de evitar as formalidades dos procedimentos jurídicos normais, no interesse de uma justiça mais rápida e mais adaptada ao caso concreto.” (p.143). Dessa maneira pode-se concluir que a explicação para a tomada de uma decisão tão contraditória pela juíza está atrelada ao atendimento dos interesses de um segmento social dominante.
Weber também acreditava na existência do direito natural que se refere às qualidades imanentes ao homem. Nele abrangem-se traços da ética e da pressão dos interesses, ambos visam requerer justiça material “A invocação do ‘direito natural’ foi sempre de novo a forma em que as classes que se revoltavam contra a ordem existente conferiam legitimidade à sua reivindicação de criação de direito” (p. 134). Perante o julgado nota-se a violação desse direito, uma vez que não há atendimento dos interesses da maioria ou a garantia de elementos inerentes - e constitucionalmente garantidos- ao cidadão como a moradia e a dignidade.
O sociólogo José Rocha em sua obra “Sociologia Geral e Jurídica: Fundamentos e Fronteiras” argumenta que Weber ao analisar uma sociedade democrática indica que na ação social a coerção juridica da lei se exerce no individuo de acordo com o interesse do individuo, formulando o direito subjetivo já que existe a livre escolha dos agentes sociais. Todavia o caso do Pinheirinho revela que na realidade brasileira o interesse da classe dominante sobrepõe, invalidando a possibilidade de qualquer indivíduo agir em conformidade a seus interesses. Esse cenário faz do julgado em questão um tipo ideal - semelhante a uma caricatura, exagera as principais características e reduz as menos importantes, visando esboçar a verdade subjacente ou analisar as partes complexas da sociedade- afinal expõe a problemática da desigualdade no Brasil e suas repercussões no campo jurídico.
Bruna Morais - direito noturno
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