René Descartes discute que, deve-se fragmentar
o todo para melhor conhece-lo, no entanto, esse pensamento contrasta com as
ideias de Pierre Bourdieu sobre o sistema jurídico. Para ele, o Direito está interligado a vários outros campos, assim, não
se pode olhar isoladamente para uma problemática jurídica, quando ela está envolvida
num contexto socioeconômico, político, psicológico, ou médico, pois mesmo que,
metaforicamente, concerte-se essa peça, quebrará em um segundo, pois se ignorou
o que está conectado a ela. Talvez, o campo jurídico seja maior que os outros
campos, mas é sabido que nenhuma ciência é totalmente isolada, uma influência a
outra. Por isso, o autor contrasta com as teorias cartesianas e Kelsenianas.
Dessa
forma, para Bourdieu, o campo Jurídico está totalmente ligado às mudanças da
sociedade, assim, entender o campo jurídico significa entender os conflitos internos
que o constituem, pois ele é um reflexo direto das relações de força existentes
em seu interior. Não obstante isso, muitas vezes, o direito não está adaptado a
realidade, ocorre então uma luta simbólica dialética, entre as fontes do direito,
doutrina e jurisprudência, e a interpretação feita pelos juízes, que adequam as
normas à realidade contemporânea, influenciando a doutrina.
Vale
ainda ressaltar que Bourdieu também argumenta que, embora não generalizando,
aqueles que estão no campo jurídico têm afinidades com os detentores do poder
temporal (político ou econômico). A proximidade de interesses e a afinidade de
hábitos favorecem uma similitude de visões de mundo, o que explica que as
escolhas do corpo jurídico tem poucas possibilidades de desfavorecer os
dominantes.
Um
exemplo esclarecedor a ser citado é a ADPF 54 de 2012, que tratava sobre a
interrupção da gravidez de feto anencéfalo. A interrupção foi considerada
válida, pois era iminente o risco de vida da gestante, fator este, considerado
como excludente da ilicitude. Dessa forma, o direito apesar de ter certa
autonomia, também depende laudos médicos, ou seja, de questões
médicas e psicológicas, para dar a decisão final. Assim, inúmeras vezes, como
no caso, da definição do que é vida, o campo jurídico, invade o campo da
medicina, ou outros.
Contudo, é visível, que na
contemporaneidade, as mentes estão mais “abertas” para o novo, assim, as questões
discutidas pelo campo jurídico passam a ser mais complexas. Nessa linha, é preciso
que a judicialização continue retirando certas questões polémicas da
invisibilidade, para que, de fato, possam ser resolvidas, impulsionando pautas
que já seriam possíveis, como o aborto de anencéfalos, que só foi possível pois
estava dentro do Espaço dos Possíveis do Campo Jurídico. Assim, o direito mostrar-se-á
cada vez mais sistematizado e interligado com outras ciências, contrariando as
teses de Descartes e Kelsen.
Heloísa C. Leonel
1º ano de Direito Diurno
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