Total de visualizações de página (desde out/2009)

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Diferença pela igualdade

Boaventura inicia sua obra retomando a brilhante questão abordada por Rousseau: “será que o progresso das ciências ou das artes contribui para a pureza ou para a corrupção dos costumes?” . Tomando por base a indagação do filósofo, o autor constrói a pergunta provocativa que irá nortear e intitular sua obra: “poderá o Direito ser emancipatório?”

Essa questão é extremamente atual e relaciona-se, por exemplo, ao tão polêmico e comentado tema das ações afirmativas, dentro do qual as “cotas raciais” são uma marca forte. Boaventura de Souza e Santos expõe a necessidade de construir uma vertente não-hegemônica do Direito, uma “globalização contra hegemônica”, o chamado “cosmopolitismo subalterno”, cosmopolitismo dos oprimidos a fim de combater as desigualdades no contexto do Neoliberalismo; as ações afirmativas, as cotas raciais seriam um meio para isso. A importância das cotas raciais é potencializada pelo contexto da crise do reformismo, do Estado-providência, do ressurgimento do conservadorismo, pela própria perda, pelo Estado, do papel de regulador social; como Boaventura expõe.

Na obra mencionada, o autor destaca a instabilidade social como condição de assegurar a estabilidade econômica. Podemos remeter essa concepção à problemática da infraestrutura e superestrutura do pensamento marxista e, de forma mais concreta, podemos visualiza-la no próprio processo histórico escravocrata da nossa sociedade: para assegurar uma hierarquia econômica e social da elite, os negros sofreram diversos abusos, foram  explorados e marginalizados, o que resultou na construção de uma sociedade racista e excludente, que relegou aos negros à chamada “sociedade civil incivil”; segundo Boaventura , os indivíduos que a compõe “socialmente, são quase por completo invisíveis.” Nesse ínterim, as cotas raciais seriam legítimas e justas, pois iriam findar com esse círculo vicioso histórico que joga o negro na pobreza, viabilizando, então, sua integração social.

Ademais, retomando a indagação acerca da emancipação do Direito, o autor afirma que enfrentamos problemas modernos para os quais não há soluções modernas; nesse ínterim ele mostra a preocupação em reinventar o Direito longe do modelo liberal e demo-socialista, sem cair na agenda conservadora. Esse último ponto se liga aos chamados “apartheids sociais” que marcam nossa sociedade, destruindo o contrato social; lógica essa que cria “novos estados naturais”, gerando o “fascismo da insegurança”, a subclasse dos excluídos. As cotas raciais não seriam portanto uma solução imediata para isso? As cotas de reserva de vagas nas universidades públicas não seriam um meio de destruir essa tendência de hiper-exclusão? Para analisar essas questões, basta nos atentarmos para o simples fato de que as melhores universidades do país são públicas e ,paradoxalmente, as melhores escolas de ensino fundamental e médio são particulares.


Para confrontar com êxito o fascismo social e dar resposta às necessidades da “sociedade civil incivil” é necessário, sim, um Direito emancipatório, cosmopolita, um “Direito experimental”, que reconheça  a diferença como fundamento da busca pela igualdade, que discrimine positivamente em favor dos desprivilegiados, dos “indivíduos invisíveis”, para ,no futuro, a emancipação social e a igualdade serem concretizadas; para o progresso das ciências contribuírem finalmente para a pureza dos costumes, como outrora Rousseau já apontara.

Victória Afonso Pastori
1º Ano-Direito Noturno

Nenhum comentário:

Postar um comentário