É recorrente no
discurso de Boaventura de Sousa Santos a temática da emancipação social, que
surge como uma tentativa de fazer com que aqueles que não foram contemplados
pelo contrato social possam se inserir nele. Em seu texto, Poderá o direito ser emancipatório?, Boaventura reflete sobre a
possibilidade do direito, um elemento que antes era visto como forma de
manutenção do status quo, passar a ser visto como um
instrumento de mudança.
O
Partido Democratas ajuizou uma arguição de descumprimento de preceito
fundamental contra a Universidade Nacional de Brasília, que instituiu o sistema
de reserva de vagas com base em critério étnico-racial no processo de seleção.
Ao analisar a ADPF 186/DF sob a ótica da teoria do Boaventura, podemos
constatar que o Partido Democratas é contra a emancipação social, esta, que
nesse caso tenta corrigir um passado de quase 300 anos de escravidão, e a não
inserção na sociedade do negro após a abolição. Percebe-se que a UNB
estabeleceu o critério de reserva de vagas para resgatar os negros que estão na
sociedade civil incivil, e assim, tentar garantir a reparação histórica do
legado da escravidão e a pluralidade (além da miscigenação intelectual), já que
esta, no ambiente universitário, é fundamental para o desenvolvimento do aluno.
Boaventura afirma que a exclusão é sempre produto de
relações de poder desiguais, e discorre sobre a estratificação da sociedade
civil em três classes: a sociedade civil íntima, caracterizada pela
hiper-inclusão; a sociedade civil estranha, caracterizada pela inclusão
parcial, com exclusão atenuada por algumas redes de segurança; e a sociedade
civil incivil, habitada pelos totalmente excluídos, composta por indivíduos
invisíveis socialmente.
Ele usa também a ideia de fascismo social, que vem da
sensação de insegurança que enreda a todos e que faz com que tendamos a ver
aqueles que não se mostram aptos, como pessoas que devem ser colocadas de lado,
ou seja, uma forma de darwinismo social. Ele classifica diversas formas de
fascismo social, como: o fascismo do apartheid social, sobre a condição social
necessária; o fascismo contratual, sobre a prestação de serviços públicos como
meras relações privadas de consumo; o fascismo territorial, sobre os lugares
onde há o acesso ao conhecimento; o fascismo financeiro, relacionado à condição
financeira necessária. Na questão da exclusão dos negros, podemos encontrar a
presença do fascismo contratualista, apartheid social, territorial e
financeiro.
Além disso, Boaventura aborda o pós-contratualismo, que
seria o processo por meio do qual, grupos e interesses sociais até aqui
incluídos no contrato social se veem excluídos deste sem qualquer perspectiva
de regresso, como pode-se observar na tentativa do DEM suspender o direito dos
cotistas já aprovados. Nesse caso, a tentativa de exclusão pós-contratualista
encontra-se presente pois ocorre depois do direito ser adquirido, já que
aquelas pessoas haviam passado pelo vestibular e conquistado suas vagas.
Segundo Boaventura, a economia de saberes, ou seja, a
restrição de recursos intelectuais e teóricos para explicar, deve ser
substituída por uma ecologia de saberes, ou seja, se valer de todo um
ecossistema teórico que tem suas raízes plantadas no todo social. Outro ponto
abordado por Boaventura é o cosmopolitismo, ou seja, pensar em um saber que
tanto é válido em diversas realidades, como também advém de múltiplas
realidades. Assim, o cosmopolistismo subalterno é um projeto plural por meio do
qual os movimentos sociais se comunicam entre si e as maiores conquistas se
materializam em um ponto de chegada comum. Ou seja, é importante que o direito
seja também contra-hegemônico, onde possui um ponto de partida plural, mas um
ponto de chegada comum. No caso estudado, da minimização da exclusão, podemos
tomar como exemplo a Central Única de Trabalhadores (CUT), que também apoia o
movimento negro.
O Partido Democratas mobiliza o argumento da democracia
racial para defender suas ideias, e afirma que o Estado é plural e multifacetado.
No entanto, ao olhar para o interior da universidade, percebe-se que a
sociedade não é tão plural assim. Além disso, o Partido Democratas defende que
a exclusão é social e econômica, e não racial, e que ninguém é excluído por ser
negro. No entanto, só por não existir ódio racial, não significa que não há um
racismo. Há um ódio velado, que é tão perigoso quanto o ódio escancarado, já
que pode fingir não estar presente. Como Bauman afirma, quanto mais homogêneo é
o espaço, mais difícil é conviver com as diferenças.
Amanda Barbieri Estancioni
1º ano - direito
diurno
Aula 2.1 (05/11/2015)
Nenhum comentário:
Postar um comentário