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sexta-feira, 15 de março de 2024

Racismo, um problema de caráter privado ou público?

     Ao ligarmos a TV, acessar o Youtube, ou abrir o Google, nos deparamos cada vez mais com notícias sobre episódios de racismo não só no Brasil, mas também em outros países. Estes episódios reacendem debates acalorados de como é possível resolver esse problema que, devido ao passado não tão distante da escravidão na maioria das sociedades ocidentais, parece estar sempre presente em nosso cotidiano, seja de forma velada ou aberta.

    Dentro das possíveis formas de pensar como resolver o problema do racismo na sociedade, as pessoas se dividem em dois grupos ideológicos que são antagônicos entre si: os que refletem o preconceito racial como um problema privado e aqueles que encaram como um desafio público. O principal argumento que o primeiro grupo tende a utilizar para defender a sua tese é a de que os episódios de racismo acontecem devido a existência de pessoas racistas específicas, que atacam por não saberem conviver com o diferente e, nesse tipo de visão, a punição penal seria a única forma de resolver esse tipo de problema. Já o segundo grupo, apesar de também ser favorável à punição de racistas, entende que os crimes raciais acontecem devido a um processo histórico que enraizou a discriminação na sociedade e, para superá-lo, é necessário o investimento e criação de políticas públicas (como cotas, letramento racial e demais discussões sobre o tema), sendo, portanto, um desafio da esfera pública.

    Como forma de asseverar a tese do grupo que entende o racismo como um problema de caráter público, há o relato da professora e pesquisadora da Universidade Livre de Berlim, Grada Kilomba. No segundo capítulo de seu livro “Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano” (2019), ela narra a sua vivência como vítima de comentários e ações racistas no mundo acadêmico da Alemanha que, segundo ela, deve-se ao fato desse ambiente ser, historicamente, um espaço branco que nega a fala de pessoas negras (p.50), que necessitaria passar por um processo de descolonização do conhecimento que encara o caráter discriminatório através de uma abordagem social e não apenas como um problema privado.

    O entendimento de Kilomba encontra respaldo científico no arcabouço teórico da “imaginação sociológica”, perpetrado pelo sociólogo C. Wright Mills. No livro que dá nome à teoria, o autor defende que, com o seu uso, o cientista social passa a compreender que as ações da vida privada do ser humano são moldadas pelas modificações estruturais da esfera pública (p.17), demonstrando que a visão social é importante para enfrentar situações que afligem o ser humano na suas mais diversas conjunturas, como a econômica, sexual ou, em referência ao tema central do presente texto, a racial.

Dito isso, podemos concluir que, com base nos textos de Kilomba e de Wright, a discriminação racial é um problema de caráter público que pode refletir nas interações privadas dos indivíduos, sendo necessário esforço conjunto da sociedade e do setor público para a superação do imaginário racista que assola diversos países, responsável não só por agressões físicas ou verbais, mas também pelo racismo velado e sutil que passa despercebido por aqueles que enxergam esse problema como de caráter individual.


Daniel Nobre Fernandes da Silva, 1º Ano - Noturno. RA: 241221072


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