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sexta-feira, 15 de março de 2024

DE BACON E DESCARTES A MORO: DEZ ANOS DE LAVA JATO

Iniciada em 2014, a Operação Lava Jato, tratada como a maior investigação de corrupção do Brasil, completa, neste mês de março, dez anos. Dez anos de acumuladas apreensões, condenações e prisões. Dez anos do início de um movimento ritualístico, que consagrou reuniões de família nas salas de estar para assistir ao Jornal Nacional e ver o preso do dia, momento em que se contava até com figuras já carimbadas na televisão brasileira, como a do ex-agente da Polícia Federal Newton Ishii - o “Japonês da Federal”. Dez anos da incorporação de um novo vocabulário para o povo brasileiro, que passou a incluir palavras como delação, receptação e peculato. Mais que tudo isso: dez anos que demonstram a necessidade de um Direito racional e socialmente estruturado.  

Nessa perspectiva, cita-se René Descartes, que, em “Discurso do Método”, revela uma nova forma de produção racional da ciência baseada na dúvida. Depois de duvidar de tudo o que se passa em seu espírito, Descartes percebe que, para duvidar, antes de mais nada, é preciso existir. Logo, a existência vira sua primeira evidência dessa linha de raciocínio racionalista, desbocando em sua máxima: “Penso, logo existo”. Assim, se para o filósofo torna-se imprescindível a manutenção da dúvida para produção da ciência, façamo-nos duvidar da legitimidade com que se conduziu os trabalhos na finada 13ª Vara Federal de Curitiba de Sergio Moro e sua alcateia.

Não se quer, porém, fazer críticas ao combate à corrupção, um mal pungente no Brasil que pensou-se caminhar à extirpação, com a Lava Jato. Quer-se apenas duvidar dos moldes com que se deram os trabalhos durante esses anos. Afinal, pode-se sustentar como justo um sistema em que o investigador, o acusador e o julgador trabalham juntos? Pode-se admitir, sem a menor ressalva ou dúvida, uma Vara Federal movimentando, de forma misteriosa, bilhões de reais? Não se valida o questionamento sobre a legalidade de um julgamento em que o acusado não tem seus direitos resguardados? Talvez o que se deu em Curitiba possa ser visto sob a ótica de Francis Bacon, que, notando pela sua obra "Novum Organum", bem provavelmente teceria críticas à ciência jurídica de Moro, que mais ensejava na vitória sobre adversário político que no resultado da justiça.

Desse modo, o filósofo inglês bem representa uma boa face da produção da ciência que, se tivesse sido utilizada, talvez se estabelecesse uma verdadeira luta contra a corrupção, pautada no estabelecimento de graus de certeza no âmbito da ciência do Direito e utilizando a razão despida de noções pré-concebidas para produzir justiça. Faz-se, portanto, estabelecer, ao modo de Descartes, uma sequência de dúvidas sobre as temáticas suscitadas para que, no futuro, uma verdadeira ciência jurídica, pautada nos termos de Bacon, possa, finalmente, consagrar uma luta anticorrupção voltada para o bem do homem - noção cartesiana - e à consagração de resultados - percepção baconiana.

LUCAS MATSUMOTO
Direito - Noturno

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