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segunda-feira, 9 de maio de 2022

A contribuição do positivismo para que a ditadura não se encerasse em 1985

Há quem alegue que a ditadura brasileira, a qual, resumidamente, foi responsável pela censura, pela restrição dos direitos políticos, pela opressão e uso da força, pela morte de 191 pessoas, pelo desaparecimento de mais 243 e pela tortura de 20 mil pessoas, se encerrou em Março de 1985. Entretanto, as feridas e cicatrizes da ditadura seguem presentes e pior, a cada dia que passa sinto que nos assemelhamos cada vez mais com esse período horripilante e o positivismo tem sua parcela de culpa nisso. 

As semelhanças entre a ditadura brasileira e a atualidade começam desde os primórdios da ditadura, que se estabeleceu perante a desculpa de ser a solução contra uma “ameaça comunista”. O mesmo é visto atualmente, em que o nosso presidente, frequentemente, faz discursos afirmando que caso ele não seja reeleito e a esquerda sim, o Brasil irá ser dominado pelo comunismo novamente e dessa vez ficaremos bem próximos de ser uma Venezuela (em tom pejorativo). O positivismo com sua sede de conservação, precisa de qualquer modo “manter a ordem” e assim permanecer com o capitalismo, que acaba nem percebendo, o quão sem base e fundamento a ameaça é, e que o Brasil nunca nem se quer chegou perto de estabelecer um regime comunista e, consequentemente, acabam por manter e apoiar um lunático no poder a fim de afastar o bicho papão(comunismo), quando na realidade, o bicho papão nem se quer existe. 

A ditadura, como já citado acima, foi responsável pela morte de 191 pessoas e contando com as que desaparecidas, o número sobe para 434, um positivista ao ser confrontado com esses números, provavelmente, faria duas alegações, a primeira delas é que a ditadura apenas matou quem era “vagabundo” e estava colocando em risco a ordem e o progresso e a segunda delas e que isso não ocorre mais atualmente. A respeito da primeira alegação, entre os “vagabundos” estava Alexandre Vannucchi, estudante de Geologia da USP, morto com apenas 22 anos, também fazia parte desse “grupo de vagabundos “o jornalista Vladimir Herzog, o qual com 38 anos teve a morte noticiada como suicídio, mas a verdade é que ele foi torturado ao prestar depoimento e não resistiu aos ferimentos, por fim, não vejo como não citar como exemplo (apesar da dor no coração)Araceli Cabrera Sánchez ,  morta com apenas 8 anos de idade, seu corpo foi achado com marcas de tortura e violência sexual, marcas causadas pelos mesmos que pregam a “ordem e o progresso”. Ainda sobram 431 histórias para contar, fora as que a ditadura escondeu por debaixo dos panos e não entraram para as estatísticas, afirmar que o mesmo não ocorre hoje em dia (mesmo que indiretamente) é utopia, por fim deixo meu questionamento: Quem mandou matar Marielle e Anderson? Por que a violência policial aumentou tanto em 2019 a ponto de somar a morte de 6.357 pessoas no país, sendo assim uma das maiores taxas de mortes pela polícia no mundo – e por que quase 80% das vítimas eram negras?   Quem será responsabilizado pelas 664 mil mortes por Covid em que o fator decisivo para esse número foi a negligência estatal, principalmente devido a declarações, atitudes, decisões e exemplos do próprio presidente? 

Além dos aspectos trabalhados, não há como falar das situações e conceitos que se assemelham com a ditadura e também com o positivismo, sem citar a moral e sacrifício da felicidade individual em prol da sociedade e do seu progresso. Lema positivista esse que esteve em peso na ditadura militar brasileira, uma vez que as pessoas tinham que abrir mão da sua liberdade de expressão, dos seus direitos políticos e viver de acordo com a moral conservadora e opressora da época com a promessa de que esse seria o caminho para o progresso e o bem de todos. No momento atual, apesar de algumas tentativas de censura, como dias atrás, coincidentemente ou não, para quem acredita em destino, as vésperas dos 58 anos que marcaram o início da ditadura militar no Brasil, o presidente Bolsonaro tentou impedir a liberdade de expressão, artística e cultural de artistas em um festival de música conhecido como Lollapaloza, ainda temos nossa liberdade de expressão e direitos políticos. Por outro lado, me sinto aflita quando me pego pensando se esses direitos serão duradouros, tendo em vista que cada vez mais vejo pedidos em manifestações da extrema direita suplicando a volta do AI-5, ato institucional que institucionalizou a tortura, violação dos direitos humanos, assassinatos, perseguições, ato que resultou no fechamento do congresso e instituiu a censura da impressa. Dessa forma, mais uma vez deixo meu questionamento: Até onde vale a pena ir em busca desse tão almejado progresso? Quanto de sangue é aceitável derramar para manter a moral e os bons costumes? E vou além, o que seria essa moral? O que caracteriza os bons costumes? 

Por fim, te peço desculpas, caro leitor, pelo meu pessimismo e falta de esperança, entretanto, mesmo que vivendo nesse período de angústia e de retrocesso mascarado como progresso, ainda vejo a luz brilhando no fim do túnel. Assim como na ditadura tivemos a passeata dos cem mil, greve dos trabalhadores, ativistas dando a cara a tapa contra a ditadura, artistas de todos os ramos utilizando de sua obra, mesmo sabendo dos riscos, para fazer críticas à ditadura e para resistir, ainda há resistência na atualidade, há quem acredite em um progresso a partir de mudanças e não de conservação, que não somos projetados para servir a uma moral, aos bons costumes e aos papéis sociais, há quem não ache que vale tudo pela ordem. E mais do que isso, há quem lute para que 1964 seja só mais uma memória, mas uma memória daquelas admira e mantém aqueles que lutaram para que ,mesmo que com defeitos, tenhamos uma democracia hoje em dia, daquelas memórias que nos servem para não cometermos o mesmo erro. Ainda há luta, ainda há esperança, Marielle e Anderson estão presentes, assim como todas as vítimas do Covid e da violência policial, que sejamos nós a luz no fim do túnel para que fiquemos mais perto de 2023 do que de 1964. 


Anny Barbosa - 1º ano de Direito Noturno.

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