Durkheim buscou superar o positivismo de
Augusto Comte, delineando os aspectos básicos para criar uma metodologia, institucionalizar
a sociologia para que a mesma fosse considerada uma ciência da sociedade, tornando-se
uma disciplina universitária. Dessa forma, Durkheim, em sua análise, faz analogias
com o corpo humano, de modo que cada instituição (como por exemplo o Estado, a
Escola, a Igreja, o Trabalho, a Família, entre outras), cada fato social, cumpre
determinada função dentro da sociedade, assim como cada órgão, cada célula,
cumpre sua determinada função no corpo humano. Por esse motivo, coube chamar a
Sociologia Durkheiminiana de Funcionalismo ou até mesmo Organicismo.
O sociólogo desenvolve o conceito de fato
social como “toda maneira de agir fixa ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo
uma coerção exterior” e defende, ainda, que esses fatos sociais devem ser
observados e analisados como “coisas”. Essa análise dos indivíduos, da
sociedade, como objetos inanimados, foi o método desenvolvido por Durkheim para
tentar desvencilhar esse objeto dos sentimentos e valores do sociólogo
pesquisador. Somente assim, poderia haver um distanciamento entre o analista
social e o objeto de estudo, já que a sociologia é uma ciência peculiar, pois o
sociólogo tem a mesma natureza orgânica e social do objeto que ele estuda.
A importância da análise dos fatos sociais
como “coisas” se dá, também, para romper com as análises ideológicas que haviam
sido propostas até então, que partem das ideias para as coisas e não das coisas
para as ideias, o que permite que os sentimentos e valores do analista
influencie em seus resultados. Na análise ideológica, o estudo social já é iniciado
com pressupostos, aos quais Francis Bacon chama de pré-noções, “ídolos da mente”.
Por esse motivo, Durkheim critica o positivismo de Augusto Comte e o marxismo de
Karl Marx e Friedrich Engels, pois ele visa que a sociologia seja uma ciência
da realidade e não de pressupostos. O positivismo já concebe o sentido da história
como sendo o estabelecimento da ordem com a manutenção das instituições para
que, posteriormente, a sociedade possa caminhar rumo ao progresso. À vista
disso, Durkheim acredita que Comte se distancia da verdade sociológica ao
valorizar a ideia que o analista tem da história e não os fatos em si. Já no
marxismo, temos a pressuposição de que todas as sociedades tendem ao colapso do
capitalismo, toda história é a luta de classes, seja no passado ou no presente,
e o que buscamos para o futuro é a correção das distorções causadas por essas
lutas, visando o equilíbrio dentro do socialismo. Logo, Durkheim defende que o
motor da história não é a luta de classes, mas sim a busca da sociedade em
evitar a anomia, ou seja, a deterioração das regras que mantém a coesão social.
Podemos perceber que a sociologia de
Durkheim vai servir de inspiração para a Antropologia, buscando compreender as sociedades
mais remotas do planeta a partir de sua funcionalidade própria. Desse modo,
entende-se que os indivíduos não necessariamente vão se organizar e se relacionar
para, no futuro, chegar ao progresso técnico e científico, evitando, assim, a
análise das sociedades consideradas primitivas a partir de uma visão
eurocêntrica e desenvolvida de mundo, e sim considerando as singularidades de
cada sociedade.
Para Durkheim, a partir do momento em que um
indivíduo é inserido na sociedade, torna-se impossível que o mesmo se desvencilhe
dos fatos sociais. Isso ocorre justamente pela força coercitiva que os mesmos
exercem sobre os indivíduos, de modo que uma possível tentativa de fuga das instituições
poderia gerar um sentimento de reprovação coletiva, a fim de preservar o
equilíbrio da sociedade e evitar a anomia. Cabe destacar, que os fatos sociais
não são estáticos, eles se modificam na medida que as sociedades desenvolvem
novas necessidades.
Com isso, surge o papel da educação de
forjar o ser social e lhe incutir as regras, os fatos sociais, uma imposição de
visões e comportamentos. Essa educação, não parte apenas da escola, mas também
da família, dos grupos coletivos aos quais os indivíduos se inserem, entre outras
instituições. Assim, as formas de comportamento, mesmo que se expressem no indivíduo,
traduzem hábitos forjados na dimensão do coletivo.
Durkheim, ainda, trata da solidariedade
mecânica, que é a presente, principalmente, em sociedades pré-modernas,
pré-capitalistas. Nessa, tem-se um ato tido como criminoso quando o mesmo
ofende a consciência coletiva, que corresponde a um conjunto de crenças e
sentimentos comuns à maioria dos membros de uma mesma sociedade, devendo,
portanto, ser punido. O direito aplicado nessa solidariedade era o repressivo,
que punia os atos que ameaçavam a coesão social, que, nessa época, eram aqueles
que contrariavam a força transcendental que rege o funcionamento da sociedade,
e as penas eram muito desproporcionais. O direito não era uma ciência, mas sim
uma força moral e a lei estava inscrita em todas as consciências e, por esse
motivo, o indivíduo age mecanicamente de acordo com a mesma, podendo participar,
também, da aplicação da pena. A pena era destinada ao coletivo e consistia em
uma reação passional, visando fazer com que os indivíduos da sociedade se
sentissem receosos em descumprir a lei, sendo que a mesma poderia ser agravada
pela vergonha (difamação) como, por exemplo, no apedrejamento de uma mulher
adúltera em praça pública.
Já na modernidade, que emerge com o
capitalismo, temos a solidariedade orgânica, na qual os indivíduos não estão
unidos por uma crença comum, mas pela individualidade de suas funções sociais
que faz com que haja uma dependência gerada pela divisão e especialização do
trabalho, de modo que a eliminação de um indivíduo iria criar uma lacuna dentro
da organicidade social. O direito é restitutivo (restitui as coisas ao seu
devido lugar), podendo ser feita uma analogia do mesmo com o sistema nervoso, já
que ambos tem a tarefa de regular harmonicamente as funções do corpo, seja
humano ou social. Nessa solidariedade, só são punidas ações que colocam em
risco a dimensão pública, de maneira que o adultério não precisa mais de pena,
pois apenas afeta a dimensão privada. Essa solidariedade acolhe condutas, seja da
luta LGBTQI+, do feminismo, dos movimentos antirracistas, entre outros, para
manter o equilíbrio, já que a eliminação de uma dessas partes poderia levar a
sociedade à anomia, ao colapso. A especialização é tão grande na modernidade
que observamos até mesmo a divisão do direito, desse modo, ele escapa das
consciências coletivas por ser muito específico, deixando de ser difuso e tornando-se
uma ciência, que passa a expressar técnica e não mais um estado emocional como
na solidariedade mecânica.
Com isso, surge uma dúvida com relação a qual
solidariedade o Brasil se encaixaria. Apesar de estarmos na modernidade e de
nosso país adotar toda essa divisão e especialização das áreas das ciências,
inclusive do direito, ainda observamos movimentos reacionários que afirmam que
a modernidade é incapaz de responder de modo a manter a coesão e isso reflete
no fato do Brasil, por exemplo, ser um dos países com o maior número de
linchamentos. Para eles, a manifestação de preferências sexuais equivaleria a
uma ameaça à família tradicional burguesa e, assim, tentam reprimir os
indivíduos que possuem uma preferência sexual diferente da heterossexual porém,
a sexualidade de uma pessoa se encontra no âmbito privado da sociedade, já que
em momento nenhum, afeta a coesão social da mesma. Outro exemplo, é a revolta
de grupos com a tentativa das mulheres de ressignificar os valores e padrões, questionando
o seu lugar e a sua visão “tradicional” pré-definida de “bela, recatada e do lar”.
Porém, como a sociedade ainda é baseada no patriarcado e no machismo, essa tentativa
de mudança é vista como um comportamento que ameaça o equilíbrio social. Por
último, temos essa mesma reação para com os movimentos negros, que lutam a favor
da igualdade e respeito, já que a sociedade ainda possui enraizado o racismo
estrutural.
Portanto, podemos observar, ainda, um sedimento do pré-moderno que anseia em se sobrepor na modernidade. Entretanto, utilizando a metáfora de comparação da sociedade com o corpo humano, percebemos que esses grupos reacionários que realizam linchamentos e visam a eliminação de outros grupos não devem ter voz na modernidade já que o total e eficiente funcionamento do corpo social (corpo humano) exige a participação e o envolvimento de todos os indivíduos (células) e grupos sociais (órgãos) na sociedade.
Júlia
Martins Amaral – 1º Ano – Direito Matutino
eu queria que formasse respostas sobre esse texto
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