A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54, realizada em 2012, garantiu a procedência do aborto de anencéfalos. Dessa maneira, proibindo a condenação tanto da gestante, quanto do médico(a) que realizou o procedimento. No entanto, mesmo com a decisão, a pauta sobre o aborto de anencéfalos continua gerando polarização, Se por um lado acredita-se que a vida tem início já na formação do zigoto e a regulamentação do aborto de anencéfalos poderia causar um processo de eugenia. Por outro, tem-se a garantia da escolha da mulher e de seus direitos humanos, além da taxa no qual 50% dos anencéfalos morrem antes de seu nascimento e não existe um tratamento ou cura para os bebês anencéfalos.
Segundo Bourdieu, a mobilização dentro do próprio direito é possível. No entanto é necessário seguir o ordenamento jurídico e propiciar uma tentativa de neutralidade. De acordo com o ministro Gilmar Mendes a decisão de procedência ao aborto de anencéfalos está prevista no código de Penal (como causa de excludente de ilicitude), devido ao risco que a gestação pode causar a gestante. Assim, a decisão dos ministros segue o ordenamento jurídico e proporciona a sua mobilização.
De acordo com Bourdieu, o direito deve ser universal. A temática do aborto de anencéfalos mostra esta universalização, já que, proporciona o avanço dos direitos humanos e do direito das mulheres para toda a sociedade. A gestação de um anencéfalo promove muito sofrimento para a família e, especialmente, para a gestante, assim, a decisão de manter ou não a gestação deve ser exclusivamente dela, da mulher. Mesmo com a pouca chance de um anencéfalo sobreviver, existe casos de sobrevivência por alguns anos. No entanto, seu cuidado requer um nível de atenção extremamente alto. Dessa maneira, alguns casos, raros, de bebês que sobreviveram até os dois ou três anos de idade requerem a atenção completa da família, sendo esta, obrigada a largar seu serviço e bancar um custo extremamente alto para garantir a sobrevivência do anencéfalo. Assim, o direito mais uma vez não possui o caráter universalista, já que, poucas famílias possuem condições financeiras para manter tal custo. Além disso, a concepção moralista prevista pelo estado, no qual proíbe o aborto de anencéfalos possui um cunho religioso, sendo dessa maneira, excludente para a parcela populacional que não possui uma religião.
O direito, na perspectiva de Bourdieu, não é autônomo. A demanda popular e seus anseios mudam ao longo da história e o direito, quando seguindo o ordenamento jurídico, deve se mobilizar internamente. O aborto na ocorrência de anencefalia não respondeu todos os desejos populares (que buscavam a descriminalização do aborto), mas proporcionou um avanço notório para a universalização do direito.
Giovanna Lima e Silva - Direito Noturno
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