O sistema capitalista de produção impõe-se majoritariamente em todos os cantos do planeta atualmente. Assim, é identificável no senso comum a ideia de que o capitalismo surgiu e desenvolveu-se linearmente desde a Baixa Idade Média, sem grandes distúrbios ao longo de sua trajetória histórica. Todavia, isso é um grande engano, pois como explicita Max Weber em sua renomada obra A ética protestante e o espírito do capitalismo, o capitalismo passou por gigantescas dificuldades para impor-se mundialmente, principalmente as de cunho moral e religioso. Weber denomina esses obstáculos do capitalismo como “tradicionalismo”, ou seja, um complexo de diversos fatores culturais que tenderam a frear o avanço capitalista. Esse tradicionalismo é mais bem exemplificado, segundo Weber, na figura do catolicismo.
Desde a intensificação da circulação de bens e serviços pela burguesia ao longo do tempo, a Igreja Católica sempre denunciou e tomou medidas contra as práticas essencialmente derivadas do capitalismo, como a usura, uma vez que elas eram consideradas anticristãs nos valores. Esse ponto de vista sobre as atividades comerciais burguesas imperou sobre as sociedades tradicionalmente católicas, fazendo com que o capitalismo se desenvolvesse tardiamente e menos expressivamente nessas localidades, uma vez que havia uma apatia em torno do empreendedorismo.
Por outro lado, para contrabalancear o tradicionalismo vigente e possibilitar a vitória do sistema capitalista, houve a Reforma Protestante do século XVI. Weber analisa as consequências culturais e econômicas que a Reforma proporcionou. Com ela, teve-se o surgimento de uma nova fé, a protestante. Principalmente o seu ramo calvinista conseguiu racionalizar a religião de forma a instigar os crentes a uma nova ética pessoal. Essa ética caracterizaria pela dignificação do trabalho, pela parcimônia no comportamento e pelo incentivo e inovação à acumulação como forma de predestinação. Tais características se fazem presentes, por exemplo, nos axiomas de Benjamin Franklin expostos por Weber em sua obra.
Esse quadro expõe a origem do “espírito do capitalismo”, que seria basicamente o reinvestimento do capital para a geração de mais lucro, graças à ética protestante. Isso explicaria uma maior acentuação do capitalismo primariamente em territórios protestantes, como os EUA, a Alemanha, os Países Baixos e a Grã-Bretanha; enquanto que países mais tradicionalistas segundo a definição weberiana, por exemplo, Portugal, Espanha, França e Itália foram tardios em seus plenos desenvolvimentos capitalistas. O embate cultural presente entre o protestantismo e tradicionalismo foi o teste de sobrevivência do capitalismo, e como já dito antes, de enorme dificuldade, já que a imposição de um valor estranho a indivíduos é um processo lento e árduo. Porém, se pode notar que esse sistema de produção não só conseguiu sobreviver a uma moral oposta a si, como imperar, ainda que não sem várias turbulências, sobre o meio humano.
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