Em seu livro "Admirável Mundo Novo", Aldous Huxley expõe a nós o que, em um primeiro momento, se assemelha a uma utopia. Com pessoas felizes, uma realidade recheada por tecnologia e libertações sexuais, a sociedade descrita por Huxley chama a atenção para seu caráter técnico e científico, fundamentado na existência de indivíduos que são escolhidos desde sua concepção para a efetivação de uma determinada função naquele meio. Assemelhando-se ao que conhecemos hoje como um sistema de castas, o livro afasta, contudo, a perspectiva religiosa; colocando em xeque unicamente a questão do progresso. Mas afinal, qual o problema? Estão todos felizes!
Ao longo da obra do escritor inglês percebemos que, na verdade, a sociedade que parecia perfeita é muito mais problemática do que a que vivemos hoje. Ou será que não?
Na eminência da aprovação de uma das medidas provisórias mais detestáveis dos últimos anos, o Congresso brasileiro parece ignorar o anseio de uma população de mais de 210 milhões de pessoas que preza por socorro em meio a uma das pandemias mais mortais que já existiram. Frente a tal análise, cabe a nós o questionamento: Será que estamos, de fato, tão longe das distopias que exprimem a exploração como algo aquém da realidade?
Resgatando elementos de um projeto já derrubado na assembléia legislativa, a MP 1045 é conhecida por especialistas como uma "mini-reforma trabalhista", possuindo entre seus principais pontos a precarização do programa jovem aprendiz e regulamentação da diminuição da jornada de trabalho (obviamente acompanhada pela retração salarial). Nesses pontos em específico, cabe a óbvia invocação da perspetiva de Marx e Engels, que veem a realidade como um processo histórico em constante movimento e que, há tempos, segue uma linha de efetivação unicamente voltada ao capital dominante - ligado à exploração. Atendo-se ainda a tal questão, Engels e Marx buscam evidenciar o erro grave de Hegel em sua análise do Direito, que até o momento era visto por como uma forma de suprir as demandas da evolução do homem em sociedade. Ora, se tal perspectiva estivesse correta, é evidente que um dispositivo legal que visa fomentar a riqueza de meia dúzia de indivíduos em detrimento do resto do povo jamais chegaria ao Congresso. Como é, portanto, que podemos afirmar o direito como uma ferramenta de proteção e efetivação humana quando o vemos apenas destruindo o tecido social brasileiro construído principalmente sob a égide de Vargas?
Em sua análise do que chama de "Novo Capitalismo", Richard Sennet aborda de forma eficaz a questão complexa e paradoxal do capital flexível e sua acumulação, bem como a razão por tal modelo responsável por alienar os interesses humanos nas últimas décadas. Em sua análise, ressalta a dependência global frente ao modelo corporativo, que tem feito o Estado refém de interesses privados, uma vez que torna-se impossível a manutenção de uma estrutura governamental sem o capital que provém de tais estruturas.
O fato é que, frente toda essa análise e ligando seus pontos, o que se mostra de forma muito estridente é que o estágio capitalista no qual nos encontramos é desolador, sendo tal modelo o pilar efetivador dos "vencidos" e "derrotados". Em uma máxima final, chegamos ao ponto crítico de nossa existência como indivíduos. Dia após dia lutamos uns contra os outros, deixando de visualizar a problemática que vai muito além de nossos interesses individuais e nossos caprichos pessoais. Frente a tantos desafios e lutas a serem travadas, ainda é possível acreditar, e mais do que isso, é possível mudar. Resgato aqui Frei Betto, que disse certa vez: "Deixemos o pessimismo para dias melhores", e me permito fazer uma adição final: "Já que se faz necessário viver, que seja então corajosamente".
Pedro Basaglia - 1° Semestre Noturno
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