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sexta-feira, 16 de agosto de 2019

Campo jurídico: discussão sucinta sobre a dinâmica e a lógica do Direito envolvidas no julgamento da ADPF 54

    A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamento 54 envolveu os ministros do Supremo Tribunal Federal no debate acerca de um tema polêmico, no ano de 2012: o aborto de fetos anencéfalos. Já solicitada anos antes pelo Conselho Nacional dos Trabalhadores na Saúde, o STF, pelo placar de 8 votos contra 2, deu procedência à ADPF 54, possibilitando assim a declaração de inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo é prevista nos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal, não se podendo assim punir o profissional da saúde nem a gestante pela realização da prática.
      Um longo debate fora promovido nos dias anteriores envolvendo setores diversos da sociedade brasileira, como grupos religiosos e movimentos feministas. Tudo isso agrega, dentro do campo jurídico, capitais de origens diferentes que passam a compor o habitus do tribunal, demonstrando que o momento histórico e as pressões externas exercem influência sobre o Direito e é possível estabelecer uma hermenêutica dentro do "espaço dos possíveis", conceitos determinados por Pierre Bourdieu.
      Pode-se observar, por exemplo, votos opostos acerca da ação: o relator Min. Marco Aurélio reúne uma série de evidências científicas para demonstrar a inviabilidade da vida do feto anencéfalo, excluindo qualquer interferência religiosa de sua argumentação e contemplando os direitos da mulher previstos na Constituição, deixando clara a dinâmica do Direito que envolve a lógica positiva da ciência com a lógica normativa da moral, valorizando o racional e a ética; por outro lado, o Min. Ricardo Lewandowski entende que o Poder Judiciário estaria extrapolando suas funções, pois a modificação da Lei seria uma tarefa incumbida ao Poder Legislativo, o que remeteria, assim, na sobreposição dos conflitos de competência sobre a lógica interna do jurídico e consequentemente violaria os limites do "espaço dos possíveis" do campo jurídico (violação não visualizada por Marco Aurélio e outros ministros que votaram favoravelmente).
     Logo, dentro desta e de outras discussões, além da hermenêutica acerca de direitos e regras intrínsecos à cada situação, o campo jurídico e o capital dos indivíduos presentes neles devem inegavelmente buscar respostas correspondentes com a realidade, de modo a estabelecer, em consenso, algo objetivo e universal, sempre procurando respeitar o que é próprio da lógica e da estrutura judiciária.

Eduardo Cortinove Simões Pinto
Direito Matutino - 1ºano  
     

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