Pierre Bourdieu, um grande pensador que teoriza o poder simbólico, apresenta uma teoria de campos muito interessante na qual coloca o direito como uma área autônoma em relação às outras, com um poder simbólico diferenciado pela posição de destaque e influência sobre outros campos, englobando-os, mas não sendo absorvidos em sua totalidade. Ocorre uma intersecção dos diversos campos entre si que se complementam e, no caso, tornam o direito algo diferente do absoluto formalismo (total independência das pressões sociais) e do instrumentalismo (sempre submisso ao poder dominante). Como folhas que caem sobre a superfície calma de um lago e diversas ondas são produzidas, tocam-se e se comunicam, os campos de poder assim o fazem também..
O campo jurídico, cuja lógica regida externa e internamente por relações de forças específicas e pela força das obras jurídicas, respectivamente, move-se pela dinâmica de conflitos, no qual a legitimidade do seu objeto, o direito, ocorre da perspectiva de ampla proteção de direitos ligados à dignidade da pessoa humana. Os conflitos surgem dessa discordância de matéria em que certas ações humanas violam garantias de outrem, do qual devem se resolver pela hermenêutica jurídica, em seu espaço possível, sem discordar de sua estrutura própria, seguindo sua hierarquização que dificulta o surgimento de divergências profundas e principalmente baseado em uma lógica e ética próprias que garante certa estabilidade da estrutura para possibilitar a solução de conflitos.
Dessa forma, na ADPF analisada sobre o caso de aborto de anencéfalos, ocorre a visível análise do campo jurídico citado anteriormente. Um caso inicial na parte mais baixa da hierarquia jurídica que ao verificar um conflito de preceitos fundamentais, abarca uma instância superior capaz de fazer uma interpretação de diversos pontos fora do âmbito jurídico que enriquece o direito e possibilita pontos de vista diversos de outros campos que se comunicam e permitem uma resposta baseada lógica e eticamente para atender os anseios sociais. Uma decisão política, mas repassada ao Supremo Tribunal Federal por causa da inércia das Casas Legislativas em atender as demandas, ocasionado por uma morosidade e disputa de interesses de particulares e coletivos que acarretam no fenômeno da judicialização, apresentado no texto analisado anteriormente do Ministro Luís Roberto Barroso.
Considera-se o direito à vida nesse caso sob uma óptica biologicista (morte, para a medicina é a morte cerebral. Sem cérebro existe vida?) que leva em consideração a dignidade da mãe que não haverá um filho com vida e, por isso, um aborto de tal natureza torna-se legal para impedir mais sofrimentos à progenitora.
Enfim, Bourdieu, assim como os outros autores estudados durante semestre (Marx, Weber, Barroso e Boaventura de Sousa Santos) apresentam não formas errôneas de análise do Direito, mas complementares entre si, pois abordam ângulos diferentes de um mesmo objeto: o Direito, embalado na pluralidade, um fato consolidado como poder e capaz de se modificar dentro de seus limites para conseguir conciliar a manutenção da ordem e o intenso dinamismo social a que estamos submetidos. Uma tarefa de amplo espectro que necessita mais estudos para melhor compreensão e solução de desavenças que haverá enquanto a sociedade existir.
Leonardo Eiji Kawamoto - 1ºAno Direito/Matutino
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