O que nos leva a exigir a troca de uma mercadoria comprada, na certeza de que estaria em "perfeitas condições de uso", mas que apresenta defeitos ? O que nos impulsiona a questionar o pagamento de uma tarifa exorbitante que certamente não foi gerada por nós mesmos ? O que nos faz tão indignados ao acompanharmos um desses inúmeros casos de assassinatos, sequestros, roubos, noticiados ampla e diariamente pela mídia, tornando-nos exímios juízes, promotores, delegados sem ao menos possuir formação para tal ? Acaso conhecíamos Mércia Nakashima? Éramos parentes ou amigos próximos do casal Richthofen? Padrinhos da menina Isabela Nardoni? Companheiros de classe de Eloá Pimentel? Vizinhos de Eliza Samudio? Se mesmo não unidos a estes por laços sanguíneos ou afetivos, como nos comovemos, tomando parte da dor que aprisiona seus familiares e conhecidos, e clamamos para que os culpados paguem amargamente pelo que fizeram? Agimos desta forma por estarmos simples e inevitavelmente submetidos à lei, ao poder do Estado?
Trocamos o produto porque não é justo pagarmos por algo defeituoso; recusamo-nos a ressarcir gastos que não foram por nós gerados por um único motivo: não é justo; indignamo-nos com os crimes tão cruelmente cometidos porque não é justo que vidas assim se percam enquanto os culpados permanecem ocultados pelo véu da impunidade. Afinal, temos tais atitudes pelo simples fato de não nos parecer justo.
O direito natural acompanha, portanto, a própria essência humana, tomando os contornos do sentimento de justiça, que se mostra espontâneo. Tal direito foi, aos poucos, deixando-se moldar pelo racional, tornando-se obra do legislador para atender a determinado fim. Mostrava-se necessário assegurar os direitos ligados à natureza do homem, para que todos tivessem protegidas juridicamente suas vidas nos mais diversos aspectos, fazendo também da liberdade, da honra e demais direitos não privilégios de alguns, mas garantias da coletividade. Esse processo de racionalização se deu em uma dinâmica revolucionária, que abraça, consequentemente, mudanças. Revolução Americana, Francesa, Russa e tantas outras que a História afaga trouxeram rupturas e novas visões, porém, será que estas revelam-se efetivas? Revoluções verdadeiramente ou apenas um amontoado de ideias e atos revolucionários?
Necessita sim o Direito de meios racionais. Todavia, o direito tido como natural (integrante de cada ser humano) não pode ser sucumbido pelo "artificial". Em tantos aparatos técnicos, formalidades, instâncias, vocabulário rebuscado, deixa-se pelo caminho o direito à vida, à honra, à liberdade, como migalhas de pão que marcam o trajeto mais rápido rumo a própria essência do homem que pede proteção, mas que logo são comidas pelos pássaros. Passam os juristas, a passos confiantes e ríspidos, olhando somente para a alta copa das normas criadas por suas prodigiosas mãos, sem enxergar pelo chão a efetividade dos direitos (considerados "naturais") que deixou cair ao longo da sua caminhada. Às sargetas ainda estão milhares de indivíduos que lutam por sua dignidade, a acenar para que o Estado se lembre deles e de seus direitos inerentes, que as muitas normas não conseguiram concretizar.
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