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quinta-feira, 20 de março de 2025

O Epistemicídio como Desafio a Ser Enfrentado pela Sociedade da Razão

         Augusto Comte (1798 – 1857), considerado o “pai da Sociologia”, defende em suas principais obras a racionalização das ciências sociais. Para o autor, a “Física Social” deveria ser estudada com método e observação, tal qual as matérias biológicas e matemáticas.  

A proposta de Comte foi, de fato, concretizada. Atualmente, a sociedade em geral detém maior consciência a respeito de suas prioridades e defeitos graças à ascensão da Sociologia ao posto de ciência empírica. Entretanto, a modernidade enfrenta um estranho paradoxo: mesmo com a aparente evolução no campo da compreensão social, predominam ainda as antiquadas práticas de exclusão pautadas na cor da pele, em especial dentro do ambiente acadêmico 

A escritora portuguesa Grada Kilomba, no ensaio “Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano”, se debruça sobre o poder de fala do colonizado dentro de uma estrutura dominada pelo colonizador: o negro, inserido em um contexto marcada e institucionalmente racista, se torna silencioso. Não porque não deseja falar, mas porque é forçadamente silenciado diante da violência sistemática imposta por um cenário acadêmico predominantemente branco.  

Nesse espaço, o conhecimento e a participação negros não encontram respaldo: através de uma educação implicitamente racista, na qual os estudantes têm pouco ou nenhum acesso à história da população preta, a versão europeia (ocidentalizada) dos fatos persiste na dominância. Além disso, o direito à educação perde seu caráter universal ao percebermos a predominância de brancos nos espaços de conhecimento. Essa conjuntura, conhecida como “epistemicídio”, nos indica que não há um sistema educacional contemporâneo inteiramente neutro: os negros sofrem um preconceito estrutural dentro das instituições de ensino, o que determina uma desigualdade tanto no acesso ao conhecimento quanto na produção deste.  

Tomando como base o exposto, entende-se que a racionalização positivista de Comte não é sinônimo de progresso. Embora tenha avançado séculos com o estudo aprofundado das ciências sociais, o espaço acadêmico persiste repetindo padrões de preconceito institucionalizados nas épocas coloniais. Quanto mais a sociedade progrediu cientificamente, menos inclusiva pareceu se tornar.  

Tal perspectiva só poderia ser revertida por meio de mudanças profundas no sistema de ensino, fomentando o estudo crítico do racismo contemporâneo e ampliando o acesso de pessoas pretas aos ambientes de conhecimento, transformando-as em sujeito epistemológico. Todavia, esse longo caminho exige uma desconstrução de noções e atitudes historicamente reproduzidas, o que indica que a nossa jornada rumo à verdadeira evolução moral está apenas começando.  

Vitória Alvarenga Pistore - 1º ano - Direito (Matutino)

2 comentários:

  1. Verdade, Vitória. Parabéns pelo texto. Muito bem escrito. É um longo caminho, mas me parece que, nele, como país e como universidade, pelas cotas e pelos subsídios financeiros, estamos iniciando. Chegaremos lá. Com respeito, Alliprandino.

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    1. Concordo plenamente, Alli! O importante é começar. O caminho é longo, mas a mudança nunca é fácil. Muito obrigada pelos elogios.
      Abraços!

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