Conforme Sara Araújo, existe um primado do direito que engloba as perspectivas jurídicas atuais, cujo conteúdo se fundamenta em velhos conceitos, repetidos pelo canône, de um cultura eurocêntrica. Assim, a ciência moderna age como um projeto de civilização que estabelece os parâmetros do bem, do mal, do certo e do errado.
Ademais, a autora assinala o fato de que o pensamento moderno age de modo coercitivo em uma perspectiva global, dividindo o mundo em um "lado" e "outro lado". Por um lado, há a Europa e o mundo civilizado, que são àquelas opiniões que realmente devem ser levadas em conta conforme a modernidade. Por outro lado, existe aqueles conhecimentos que não devem ser levados em conta, sendo, inclusive, invisíveis ou inexistentes para o interlocutor do primeiro lado. Nesse sentido, vale ressaltar aquilo que a lógica filosófica chama de "argumentum ad ignorantiam", que designa uma falácia na qual o oponente é acusado de sua afirmação ser falso por um apelo à ignorância, ou seja, afirma-se que algo não é verdadeiro porque não foi provado que é falso e vice-versa.
A ADPF 186 apresenta uma perspectiva contrária a essa modernidade eurocêntrica, de modo que seja possível, por meio de um modelo de ação afirmativa implantado com vistas à amenizar as desigualdades sociais e a marginalização de uma minoria, reverter o preconceito histórico contra os negros. Evidentemente, essa última ideia parece irreal, à primeira vista, já que a história da escravidão e outros exemplos de segregação dos negros demonstram um racismo estrutural, do qual seja aparentemente impossível revertê-lo.
Entretanto, a partir do conceito de Razão Metonímica e Espaço dos Possíveis, o primeiro de Sara Araújo e o segundo de Bourdieu, é possível: transformar uma monocultura do saber, do universal e do global marcado pelo eurocentrismo em uma cultura plural, inclusiva e voltada para às regiões mais marginalizadas também; bem como, tendo em vista os espaços dos possíveis, colocar essa perspectiva no campo jurídico.
Essa última iniciativa é expressa justamente pela ADPF 186, que busca viabilizar a igualdade e garante a proporcionalidade entre candidatos nas universidades. Portanto, conclui-se que a decisão proferida por unanimidade é uma expressão contrária àquilo pregado pela hegemonia moderna, da qual busca a prevalência eurocêntrica e a razão metonímica.
Cauan Eduardo Elias Schettini - Turma XXXIX - Direito matutino
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