A luta por uma legislação que assegure os direitos da classe
trabalhadora brasileira é antiga e cravejada com ganhos e perdas. Passou, no
século XX por uma evolução um tanto quanto significante, representada pelas
políticas varguistas e tendo sua mais alta expressão na Consolidação das Leis
trabalhistas (CLT). E, atualmente, é justamente essa conquista que está
sofrendo uma das maiores ameaças pelas metamorfoses do mundo do trabalho. Isto
é, metamorfose pois não se pode denomina-las avanço, parecendo, segundo muitos
especialistas um retrocesso forçado ao povo brasileiro. Não são claros os
discursos das autoridades para legitimar essas mudanças, muito menos as
metodologias por eles empregadas durante o estudo e elaboração das novas leis que
modificam as relações trabalhistas, bem como a situação previdenciária
brasileira, muito menos quem são os interessados nessas.
Presidente da Unafisco (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal
do Brasil), o Doutor Kleber Cabral defende a ideia de que foi feito o uso de
ferramentas erradas para estabelecer a reforma previdenciária. Não é feita uma
avaliação tridimensional da realidade brasileira, levando em conta a
conformidade social, a sustentabilidade e normatividade da reforma projetada. A
justificativa daqueles que defendem a PEC 287/16, relativa à reforma da
previdência, é embasada na transição demográfica que o país vem passando, na
inversão da pirâmide demográfica em que a base não mais sustentará o topo,
visto que o Brasil apresenta um sistema previdenciário de repartição simples em
que uma geração arca com os custos da sua antecessora, porém as propostas para
a reação à essa inversão ocorrem espelhadas em sistemas de países que já
passaram por tal fenômeno e apresentam uma infraestrutura totalmente diferente
da brasileira, a começar pela expectativa de vida que nesses países ultrapassa
os oitenta anos e no brasil aparece na casa dos setenta e cindo anos de idade.
Estes fatos servem de embasamento não só para entender o processo de
modificação previdenciário, mas das leis trabalhistas como um todo.
Os sindicatos, uma das principais fontes de luta e conquista
dos trabalhadores, estão perdendo forças frente às mudanças propostas na
reforma trabalhista. Esta prevê o fim da obrigatoriedade da contribuição
sindical, o fim da intermediação do sindicato entre patrão e empregado, entre
outras propostas que visam cercear a atuação sindical. A uma primeira análise
parece justo que o trabalhador seja mais ativo quanto às suas questões particulares
e que escolha se contribuirá ou não com a contribuição sindical, mas projetando
essas práticas na atual realidade brasileira nota-se que os sindicatos irão
perder sua força e as lutas das classes trabalhadoras ficarão mais difíceis e
dispersas. Como dito anteriormente, o aparato sindical foi o responsável por
inúmeras conquistas da classe, isso ocorre devido à capacidade que essa
organização tem de agrupar um conjunto de profissionais e lhes dar voz para que
sejam atendidos em seus anseios e justiçados em sua atuação. Como o operário da
Construção de Chico Buarque que
“morreu na contramão atrapalhado o tráfego”, os sindicatos serão aqueles que
morrerão na contramão atrapalhando a modernidade daqueles que têm o poder.
Quem poderia, então, desejar que tais medidas fossem
aprovadas e aplicadas ao povo brasileiro, que direitos fossem cerceados e
possibilidades diminuídas? Certamente uma classe que não é formada por aqueles
que serão diretamente afetados por estas, por aqueles que em número não chegam
nem perto da classe trabalhadora, mas que em questões de poder estão muito
acima, que distorcem a linha da democracia como se fosse mais uma de suas ações
no mercado. Os interessados nessas reformas são as grandes empresas, os grandes
proprietários que só têm a ganhar com a flexibilização do trabalho, com a
extensão da jornada de trabalho a 12 horas diárias, com a flexibilização das
férias e do período de descanso, bem como a livre iniciativa do trabalhador
para “debater” com seu empregador sobre suas questões legais. Um exemplo disso é que, atualmente, a JBS é
uma dos maiores devedoras da previdência e vem sendo premiada com isso, como
tantos outros, a partir de refis aplicados pelo governo. Como se não bastasse,
o relator da PEC já citada aqui, Henrique Meireles tem vínculos com grandes
bancos internacionais com interesse nessas reformas. Basta uma rápida
observação das propostas de metamorfose dos direitos trabalhistas para
compreender que o trabalhador atualmente não passa de um objeto para a
construção dos projetos das grandes corporações. A análise da canção
“Construção” de Chico Buarque aqui se faz elucidativa para entender a
verdadeira metamorfose em processo, a metamorfose do trabalhador em máquina,
sem férias, descanso ou expectativas de um dia realmente gozar da própria
existência. Para este trabalhador em construção basta o último verso da cansão:
“Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir
Deus lhe pague
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair
Deus lhe pague
Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir
Deus lhe pague”
Felipe Cardoso Scandiuzzi - 1ª ano - Direito
Matutino
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