O século XXI, conhecido como o século tecnológico, das
multitarefas e da instantaneidade, também é palco para uma crise social. Os
antigos espíritos-guias da humanidade – teológico, metafísico,
humanitário-moral e econômico – estão, simultaneamente coexistindo e se
excluindo. Vive-se o tudo e o nada. Tem-se a profusão de ideologias, de
esperança e sistemas que procuram a salvação do homem, e tem-se o niilismo
social e institucional, a ideologia da estaticidade do ser, de sua incapacidade
como agente modificador da realidade. Esse é o belo tempo em que vivemos.
A principal crise, ou de maior intensidade prática, é a do
Contrato Social. A corrosão do regime geral de valores, a deterioração do
sistema comum de medidas da realidade e o questionamento do espaço-tempo,
presente no descompasso do tempo instantâneo informacional do tempo glacial da
vida, são os principais fatores para a modificação da ordem estatal proposta na
constituição dos Estados-Nações. As diferentes sociedades civis perderam sua
garantia de funcionamento e estabilidade e ficaram à mercê dos grupos de maior
poder e influência econômica e política.
O Direito, como instrumento de poder e ação social, é
compreendido como cetro de justificação e comando das classes dominantes, a
coroa legitimadora de injustiças e a espada condenatória que degola as
minorias. O antigo mecanismo de transformação é usado como meio de fixar
valores absolutos de um só grupo, a sociedade civil íntima.
É possível reaver esses símbolos de poder e, como no
passado, transferir o poder do monarca ao povo? Sim. O Direito pode, e deve,
ser executor da emancipação. A mesma caneta que ascendeu a burguesia é capaz de
alcançar os setores mais marginalizados. O Direito consegue regular e transpor
ao debate público questões adormecidas ou escondidas, que tanto geram
desigualdade.
A afirmação da constitucionalidade das cotas raciais é um
grande exemplo da manutenção do direito na liberdade oferecida pelo poder
regulador. A espada, outrora manchada de sangue, serviu como inauguração para
um debate muito mais amplo, e que está tão estratificado na nação brasileira,
como o racismo e a desigualdade racial. Foi responsável pelo ponta pé inicial
para a visibilidade para algo tão retrógrado em plena era da informação e da
velocidade.
A crise do Contrato Social representa a decadência de um
antigo sistema de regulamentação e traz consigo outras propostas de
sistematizações pré e pós contratuais. Teorias, que como no caso da afirmação
das cotas raciais, tendem a aproximar a sociedade civil incivil e a sociedade
civil estranha aos frutos colhidos somente pela sociedade civil íntima, e
corrigir ou amenizar erros do passado histórico ou da presente realidade
capitalista. Por ora, como dito anteriormente, a era do tudo e do nada também
apresenta teorias de manutenção do direito burguês e distanciamento das
garantias fornecidas pela teoria anterior, como as políticas higienistas como
os moradores de ruas nas grandes cidades. Há a busca pelo maior distanciamento
das classes, baseando-se pela meritocracia e pelo liberalismo conservador.
Solidificar a sociedade em suas classes e diminuir cada vez mais as ações
estatais e de direito para reverter esse estado.
Os dois gumes da lâmina estão sendo utilizadas concomitantemente.
É possível emancipar e dominar. Quem determina a ação é quem está no poder,
quem influencia na ação é o povo e quem executa é o Direito.
Rafael Pedro - 1º ano - Matutino
Rafael Pedro - 1º ano - Matutino
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