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domingo, 15 de fevereiro de 2015

Judicialização: Ferramenta de Efetivação de Leis ou Fomento à Arbitrariedade Judicial?

  “A obsessão de Eduardo Cunha pelos gays é algo que vai muito além do razoável, até para os padrões de sua turma. Em janeiro, Cunha criticou o que o “movimento gay” faz do Judiciário. As entidades estão, segundo ele, conquistando na Justiça o que não conseguem mudar no Congresso.” (Trecho retirado de matéria em “Pragmatismo Político”).
    Com essa ideia inicial, a pauta em destaque torna-se justamente a ação diferenciada que o Poder Judiciário tem apresentado nos últimos anos, no sentido de tomar parte em discussões muitas vezes evitadas pelo próprio Poder Legislativo – atualmente considerado de direita, e menos conivente com a introdução de leis positivas aos grupos minoritários. Tal mudança ganhou o nome de “Judicialização do Poder”, amplamente discutida em texto de Luis Roberto Barroso, e se define pela abordagem de questões de larga repercussão política ou social pelo Judiciário, antes muito mais função do Congresso Nacional e o Poder Executivo. Ou seja, como citado anteriormente, um grupo que não se vê representado pelo poder que cria leis tem a oportunidade de fazê-lo por meio de quem as julga.
    São fomentadas críticas e benefícios ao processo, principalmente embasadas na ideia da democracia – o que, segundo Barroso, é a grande responsável pelo crescimento da judicialização –, principalmente afirmando-se que, por ser o cargo dos magistrados não resultante de eleições do po-vo, dar-lhe poderes para decisões dessa natureza seria talvez antidemocrático, posto que os verdadeiros eleitos a fim de elaborar leis são os membros do Congresso.
    Vemos um exemplo da judicialização não somente no excerto retirado da reportagem, sobre Eduardo Cunha e o movimento LGBT, mas em todos os julgados estudados até aqui – desde o caso do Pinheirinho, passando pela cirurgia da transexual, e o caso das cotas da Universidade de Brasília –, e vemos como isso pode adquirir expressões singulares, nem sempre favoráveis às minorias. No caso da comunidade de ocupação, o Pinheirinho, a decisão da juíza foi extremamente tendenciosa no sentido de acomodar o direito à propriedade em detrimento aos vários direitos humanos reservados aos habitantes, posicionando-se ao lado da Massa Falida e ordenando o despejo. No caso da transexual, no entanto, o juiz tomou parte da minoria, e reconheceu o direito da jovem de poder realizar sua cirurgia no sistema público. Em ambos os casos, a decisão do magistrado foi embasada em Constituição, ou seja, não foi lei criada arbitrariamente por eles.
    Com mais destaque, tem-se o caso das cotas. A ideia de o Estado se reconhecer deficiente no acesso igualitário dos alunos de escolas públicas às universidades igualmente gratuitas é fundamen-tal para a compreensão da importância dessas ações afirmativas contra a chamada meritocracia. Entender que todos não podem competir em “pé de igualdade” se não lhe são dadas as mesmas oportunidades possibilita a construção de uma noção de necessidade às políticas de cotas, e o envolvimento dos juízes no pedido de reconhecimento de inconstitucionalidade, do Democratas, demonstra mais uma vez a presença desse Poder nas grandes e polêmicas decisões. As normas, em Constituição, serviram de base para a afirmação de que as ações de cota devem ser impedidas de prática, segundo argumentação do Partido; mas os próprios juízes do processo não reconheceram tal ideia ao interpretar a Carta, indeferindo o pedido.
    O grande conflito, nesse contexto de judicialização, é a dificuldade de se limitar a atuação do Judiciário, primeiro a fim de garantir aplicação da democracia; segundo para evitar a arbitrariedade do responsável pelo julgamento – como vemos, também, na liminar de uma juíza de Franca para coibir os “rolezinhos”, o que demonstra novamente como nem sempre a judicialização favorece os princípios democráticos de direito. Dessa forma, entende-se que a judicialização é como uma via de mão dupla, podendo favorecer as minorias ou assentar suas bases nas concepções liberais ou conservadoras, pecando na linearidade de decisões e, principalmente, deixando à sorte do destino os casos encaminhados a julgamento. Somente cabe a questão final se será esse um risco que os próprios brasileiros estão dispostos a correr, posto que não são garantidos todos os seus direitos nos formatos do julgamento estritamente material – ou seja, da matéria da lei, não dos contextos.

Excerto retirado do site “Pragmatismo Político”, acessado em 12 de fevereiro de 2015:

http://www.pragmatismopolitico.com.br/2015/02/qual-e-o-problema-de-eduardo-cunha-com-os-gays.html

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