Em sua análise
sociológica, Weber entende a modernidade como construção de diferentes
dinâmicas de racionalização, sendo a Racionalização Formal, estabelecida
mediante o caráter calculável das ações e seus efeitos, e a Racionalidade
Material, que se trata da reivindicação que não é apenas formal, mas leva em
consideração valores, exigências éticas, políticas, entre outros, de essencial
importância para a compreensão do Direito dentro do estudo sociológico de
Weber.
Para Weber, no
campo do Direito, a dinâmica de racionalização deveria ir do material para o
formal, reduzindo as decisões a princípios tecnicamente pré-determinados e o
estabelecendo um sistema de regras com lógica interna, de modo que toda decisão
jurídica seja a aplicação de uma disposição jurídica abstrata a uma constelação
de fatos concreta; que para todo fato concreto deva ser possível encontrar, com
os meios da lógica jurídica, uma decisão a partir das vigentes disposições
jurídicas abstratas; e que, portanto, o direito objetivo deva constituir um
sistema sem lacunas.
Apesar de a
maioria dos doutrinadores e comentadores da sociologia weberiana se restringir
a definir o Direito em Weber como sendo somente o que foi exposto acima, o
próprio sociólogo reconhece que esse seria apenas o tipo ideal para o Direito,
sendo completamente utópico uma vez que a vida social concreta e o
desenvolvimento moderno enfraqueceram a possibilidade de concretização do
racionalismo jurídico formal, favorecendo a formação de um Direito Natural Material,
vinculado aos interesses de classe, além da particularização crescente do
Direito e a influência da ética e da pressão de grupos de interesse e ideologia
nas decisões jurídicas.
Essa realidade
pode ser sentida no caso do Pinheirinho, analisado nas semanas anteriores, onde
as convicções pessoais dos Juízes envolvidos no processo, além da pressão dos
grupos interessados, exerceram papel fundamental para a retirada desastrosa e
desproporcional de milhares de famílias em benefício de uma única empresa
falida. Além disso, a complexidade social impede a previsão, pelo Direito, de
todos os fatos passíveis de se realizarem, sendo impossível a inexistência de
lacunas e sendo essa formalidade, defendida por Weber, utilizada, muitas vezes,
de maneira catastrófica pelos juristas, com a aplicação de normas inadequadas
ao caso real ou com a falta da necessária flexibilização das leis em casos não
previstos por Códigos e Constituição.
Não foi esse o
caso da decisão da Vara do Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de
Jales, onde, diante da demanda de um transexual pela cirurgia de mudança de
sexo, bem como a alteração no registro civil, para constar novo nome e
modificação do sexo masculino para o feminino, o Juiz valeu-se da interpretação
das próprias normas e leis do Código Civil e da Constituição, dos Conselhos de
Medicina e Psicologia e dos tratados internacionais firmados pelo Brasil para
não somente conceder os pedidos ao transexual, como também para reconhecê-los como
direitos fundamentais do indivíduo, afastando os preconceitos da sociedade
implícitos na racionalidade material e se aproximando da racionalidade formal
idealizada por Weber. A necessidade da sociedade de se padronizar as
diferenças, encarando-as como patologias, explicitada pelo Juiz em sua decisão,
se relaciona, de certa forma, a visão que Weber tem da modernidade, onde todas
as ações e seus efeitos precisam ser calculáveis e sendo inaceitável aquilo que
foge a essa regra, como é o caso da transexualidade.
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