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segunda-feira, 2 de maio de 2011

O progresso coletivo e a ascenção social

No decorrer de um século de inúmeros conflitos e enorme desordem social, Auguste Comte propõe a aplicação de um novo método para o estudo da sociedade, que pudesse auxiliar, de forma realista e com postura científica, na compreensão dos fenômenos sociais, bem como na sanação do caos então vigente.

Para isso, um dos preceitos mais interessantes e, ao mesmo tempo, controversos propostos por Comte encontra-se na metáfora do Corpo Social, segundo a qual a sociedade, comparada a um organismo humano, seria composta por diferentes células e diferentes órgãos, cada qual incumbido de divergentes funções, as quais realizariam única e ininterruptamente, proporcionando, assim, o funcionamento ordenado da sociedade, distanciando-a do caos, da anarquia, e promovendo o seu progresso. Da mesma forma, o ensino da filosofia positiva à classe proletária, mais apta a tal aprendizado por jamais ter sido introduzida ao conhecimento metafísico, se proporcionado de forma correta, levaria-a a reconhecer sua função social, considerada por Comte tão importante quanto qualquer outra, e aceitar plenamente sua posição na sociedade, sedando possíveis instintos subversivos proporcionados pelo conhecimento metafísico.

Analisando o caráter estratificado da sociedade proposta por Comte, é possível relacioná-la em alguns aspectos, e, evidentemente, com ressalvas, àquela descrita um século após na obra de Aldous Huxley, “Brave New World”. No “Admirável Mundo Novo”, uma sociedade de excessiva ordem era controlada pelo sistema em prol de aparente harmonia e felicidade coletiva, sem que houvesse espaço para questionamentos e liberdades individuais. O paralelo mais visível de tal sociedade com a sociedade proposta por Comte encontra-se no fato de que, na obra de Huxley, uma das condições para a ordem e a aparente harmonia social (instituída, no livro de ficção científica, por controle genético e condicionamento mental) era a obrigatória realização pelo indivíduo dos ofícios destinados à sua casta, únicos que permitiriam a felicidade tanto individual quanto coletiva.

Impossível é negar, no entanto, as condições de fato desprivilegiadas de certos grupos sociais, que apesar de também fornecerem sua contribuição ao organismo social, constantemente são submetidos a tratamento desigual em relação aqueles cuja função é considerada, de certa forma, superior. A tentativa de encaixar permanentemente cada indivíduo em uma função social, de forma que proporcionasse a ordem e o progresso ao coletivo, em detrimento de sua ascenção pessoal, poderia gerar, assim como já gerou em inúmeras nações, o cerceamento das liberdades individuais e o desrespeito aos Direitos Humanos, aspectos hoje devidamente consolidados, ao menos na maioria dos países, como primordiais na constituição de qualquer comunidade. Ao meu ver, portanto, não é possível que se defenda, em dias atuais, uma filosofia corporativista tal como a proposta pelos positivistas, que priorizaria o progresso do coletivo em detrimento da mobilidade social.

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