O capítulo “Raça e Racismo”, do
livro “Racismo Estrutural”, escrito por Silvio Almeida, apresenta o racismo
como um fenômeno que transcende as ações individuais e que se faz presente no
âmbito institucional da sociedade, consagrando-se como um sistema estruturante
das relações sociais. O autor apresenta as três principais formas que o racismo
tomou na contemporaneidade – individual, institucional e estrutural – e
trabalha também sobre como a distinção de raças foi utilizada como instrumento
para institucionalizar esse preconceito. De acordo com Almeida, o termo raça
foi cunhado para estabelecer classificações, a qual, durante a modernidade,
estendeu-se ao homem de maneira pejorativa e segregatória. Ao tomar como
conceito universal o homem europeu durante o Iluminismo, houve a diferenciação
entre os indivíduos selvagens e civilizados e, consequentemente, o
estabelecimento de qual era “superior”. O ideal racista foi, por conseguinte,
utilizado como mecanismo para produzir e reproduzir desigualdades sociais, efetivando-se
como um processo que moldou – e molda cotidianamente – as relações e condutas
entre os sujeitos.
Essa análise do advogado e
professor brasileiro dialoga diretamente com o conceito de dominação do
sociólogo e jurista Max Weber. Para Weber, a dominação é um dos fenômenos
sociais que moldam a realidade dos indivíduos, influenciando diretamente suas
ações sociais através das conexões causais. Esse ato de dominar pode ser
definido como a possibilidade de encontrar obediência dentro de relações
sociais ao impor a própria vontade, mesmo contra a resistência dos
subordinados, desde que haja legitimação nessa imposição. A predominância de
uma vontade sobre outra caracteriza-se, segundo o sociólogo, como um fator
coercitivo e com valores fundamentados na própria cultura. O racismo
estrutural, apresentado por Almeida, ao fazer-se presente dentro das
instituições nacionais mais importantes e se valer de práticas socialmente
legitimadas, consagra-se como uma verdadeira dominação weberiana, uma vez que o
grupo que o pratica – dominante – vale-se da naturalização das desigualdades
sociais e da normalização do preconceito dentro das sociedades para manter sua
hegemonia.
As práticas racistas, dessa
forma, foram instituídas como forma de dominação ainda no século XIX com o
espírito positivista da época, infiltrando-se na sociedade a partir de
correntes científicas. Como uma forma de classificar e terminar de desumanizar
os negros, o determinismo biológico e geográfico foram os ideais científicos "capazes" de explicar as diferenças morais e intelectuais entre as diferentes
raças existentes no planeta. Ao ser instaurado na sociedade, esse tipo de
pensamento tomou enormes proporções, obtendo grande prestígio, já que agora era
racionalmente possível institucionalizar e legitimar a inferiorização e
subalternização dos negros na sociedade e enterrar a ideia de igualdade.
Contudo, a dominação consagra-se como uma possibilidade porque, ao considerá-la
como uma certeza, movimentos de resistências e revoltas não seriam
justificados. E foi justamente a Revolução Haitiana reivindicando a liberdade e
igualdade conquistadas pelos franceses – os colonizadores – que resistiram à
tentativa de imposição de uma ordem predeterminada. Ao desafiar a legitimidade
– mecanismo fundamental para a efetivação da dominação – do sistema escravista
e da autoridade francesa, deixaram explícito que, embora haja um preconceito
institucionalizado, haverá sempre uma maneira de contestar a dominação exercida
– demonstrando sua dependência, por parte do domínio, da legitimidade e do poder.
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