A compreensão sobre como se formam as ideias, instituições e normas sociais é um dos pontos centrais da teoria sociológica. Na tradição idealista, representada por Hegel, acredita-se que a história da humanidade é guiada pelo desenvolvimento da consciência, das ideias e do espírito. Ou seja, as transformações sociais seriam produto do pensamento humano, que se expressa em formas como a filosofia, a religião e o direito. Em oposição a essa visão, Karl Marx e Friedrich Engels propõem uma concepção materialista da história, segundo a qual são as condições materiais da vida — como a forma como os seres humanos produzem sua existência — que determinam as ideias e instituições. Essa mudança de perspectiva é fundamental para compreender o direito não como fruto de ideias abstratas de justiça, mas como resultado das relações sociais concretas e dos conflitos entre classes.
Um exemplo concreto da aplicação da concepção materialista da história, proposta por Marx e Engels, é o surgimento das leis trabalhistas no Brasil. Com o avanço da industrialização no início do século XX, formou-se uma classe operária urbana submetida a condições precárias de trabalho, como jornadas exaustivas, baixos salários e ausência de direitos. Essa realidade material gerou tensões sociais e mobilizações, como greves e protestos, que pressionaram o Estado a agir. Em 1943, durante o governo de Getúlio Vargas, foi criada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), garantindo direitos básicos aos trabalhadores. Esse processo revela que o direito não surgiu de uma ideia abstrata de justiça, mas foi moldado pelas lutas concretas entre classes sociais, confirmando a tese marxista de que a estrutura material da sociedade é o que determina suas instituições e ideias jurídicas.
Outro exemplo atual que ilustra a concepção materialista do direito é a luta por moradia nas grandes cidades brasileiras, como no caso das ocupações organizadas pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). Diante da escassez de políticas públicas e da especulação imobiliária que mantém imóveis vazios, milhares de pessoas em situação de vulnerabilidade se organizam coletivamente para ocupar terrenos ociosos. A mobilização dessas populações não apenas torna visível o problema, mas também força o Estado a discutir e, por vezes, efetivar políticas de habitação. Esse cenário demonstra que o reconhecimento jurídico do direito à moradia não decorre de princípios universais ou ideias idealizadas, mas de necessidades materiais reais e da ação coletiva dos sujeitos. Assim, reforça-se a visão de Marx e Engels de que é a vida concreta — e não as ideias abstratas — que determina o conteúdo do direito.
Dessa forma, ao contrastar a concepção idealista de Hegel com a concepção materialista de Marx e Engels, torna-se evidente que o direito deve ser compreendido a partir das condições concretas da vida social. Os exemplos das leis trabalhistas durante a Era Vargas e das ocupações urbanas organizadas por movimentos como o MTST demonstram que transformações jurídicas não emergem de ideias puras de justiça, mas da luta entre grupos sociais diante de desigualdades materiais. O direito, portanto, longe de ser neutro ou universal, reflete interesses, disputas e necessidades originadas nas relações de produção e nas estruturas econômicas. Retomar essa perspectiva crítica é essencial para analisar como o direito funciona na sociedade e a quem ele serve.
Nenhum comentário:
Postar um comentário