Havia uma sociedade de gatos a beira de uma rodovia, próspera e ajustada,
pelo fato de seguir uma linha firme de conduta até um tanto quanto conservadora
e tinha como líder um lindo gato branco, gracioso pelo porte e por dar exemplo
de como um gato de verdade deveria se portar, de espirito felino por natureza,
jamais se dedicou a grandes projetos pessoais mas se dedicava integralmente
pela comunidade da qual era líder, naturalmente o gato ao atingir a idade
adulta encontrou uma parceira e com ela constituiu família, pois seu pai já era
velho e logo ele se veria líder daquela comunidade e que tal líder devia ser
exemplo de virtude e tradição e assim aconteceu a morte de seu pai e uma
tranquila ascensão a liderança daquela utópica e pequena comunidade.
A sociedade era feliz e a vida era boa, todos sentiam a mesma
tranquilidade e podiam passar os dias ao sol se lambendo, a noite todos tinham caçavam
gordos ratos e não havia ali gato que quisesse uma vida melhor, era apenas
seguir aquele modelo que já vinha de tempos e aproveitar as nove vidas que cada
um possuía, claro, nem tudo era uma panaceia e haviam gatos que transgrediam os
costumes e normas, mas afinal desde que não fossem muitos gatos esses seriam
até uteis para aplicar alguma punição e mostrar aos demais que a vida dentro
das normas era melhor, mas ainda assim, o líder gato prudente sempre aplicava medidas
voltadas a reparar os desvios e restabelecer a rotina, procurando não deixar reparações
entre a gataiada.
A maior preocupação da vida do líder era mesmo dar continuidade ao que
lhe fora legado, pois aquela organização já se encontrava pronta, já havia o
lugar, os ensinamentos, os costumes, não havia nada para ser mudado e ele também
não desejava mudar nada por la e assim como seu pai seu maior desejo era apenas
manter aquele modelo estável e entrega-lo em segurança ao seu filho que naquela
altura já era um lindo gatinho siamês que o pai tentava fazer pegar gosto e
correr atrás de uma bolinha de lã, a qual o danadinho insistia em ignorar.
O tempo foi passando e o jovem felino não correspondia as expectativas do
pai, que a princípio achava que aquilo era apenas coisa do fulgor da adolescência
e que por si só a situação se resolveria, e ia dando seus pitacos de sabedoria
ao futuro líder da comunidade. O tempo foi passando e as preocupações do líder aumentaram,
pois o jovem gato era muito questionador e muitas vezes não concordava com os
ensinamentos do pai e questionava o porque das coisas, coisas que seu pai nunca
se importou de questionar e que desejava avidamente passar ao filho mas de fato
não sabia a origem dos porquês.
Um dia o jovem gato conheceu uma cadela e se encantou por ela, seu jeito
gracioso de andar, de cheirar as coisas, mas sobretudo sua sede de saber, sua
curiosidade aguçada, tudo cheirava e a cada nova descoberta a serelepe se punha
a latir com tamanha alegria que o bichano percebeu que o latir era um clímax eufórico
da cadelinha curiosa e ele queria muito ser capaz de aprender daquela maneira
de se expressar, chegando em casa ele foi direto ao seu pai contar o que
presenciou e queria que seu pai o ensinasse a latir, pois ao chegar perto da
cadelinha para tentar aprender a mesma fugiu para o meio do mato. O líder quase
teve um treco no coração, pois onde já se viu tamanho disparate, seu filho, seu
sucessor querendo aprender a latir como um cachorro, seu inimigo natural mortal,
a tragédia só não era maior porque a mãe do jovem gato disse que tudo não
passava de brincadeira de criança, contudo o gato não se conformava com aquilo
e fora procurar saber com outros gatos se algum o ensinaria a latir.
Certo dia estava o líder em sua caçada noturna com outros gatos e ao
longe se ouviu um cachorro latir, rapidamente um dos companheiros de caça fez
chacota dizendo que seu filho o estava chamando e todos riram do sério e
imponente líder, fazendo com que o infeliz piadista quase perdesse algumas de
suas vidas com a surra que levou imediatamente, logo todos se calaram, mas nasceu
ali os rumores que o filho do líder era um gato que queria latir.
A situação foi se alastrando de maneira silenciosa, como todo gato sabe
ser, mas em curtíssimo tempo toda comunidade só comentava sobre o gato que
queria latir e isso foi fulminante para o poderoso líder, seu filho, seu
sucessor, sendo piada onde ele e seus antepassados governaram com tanto
respeito e como já era de se esperar descontou sua raiva no pobre o curioso
gatinho, que de maneira triste se viu hostilizado em casa, zombado em seu meio
social e não compreendia que modelo era aquele que não se permitia sair dos padrões
impostos sem ser massacrado por todos, quando saia de casa era seguido por
dezenas de gatos incitando-o a latir, gatos que antes eram seus amigos e
bajuladores querendo cair nas graças do futuro líder, mas que agora gritavam
seu nome e escarneciam do pobre animal.
O gato no auge de seu inconformismo, viu que nunca poderia latir, ou
mesmo cogitar latir, pois fora censurado e cancelado de seu meio e se de fato
latisse não poderia voltar para sua casa pois seria morto dentro ou fora dela,
desesperado o gato não era mais compreendido ou aceito, e num ímpeto ocasionado
pelo frenesi daquela epifania, em que tudo ficou claro na sua frente, não
poderia ser o gato que nascera para latir ou para pensar, e pulou embaixo da
roda de um caminhão de abacaxis que passava pela rodovia naquele momento, seu
pai ao ver a cena respirou aliviado, pois ao se suicidar seu filho enfim tinha
exercido um papel compreensível por aquela sociedade e nunca mais correria o
risco de ser conhecido pelo gato que conseguiu latir, mas apenas pelo gato que
se matou, e com esses pensamentos pôs-se a tratar do enterro de seu amado
filho.
NOME: ANTONIO JAIR DE SOUSA JUNIOR
TEXTO SOBRE: O FATO SOCIAL - DURKHEIM
DIREITO MATUTINO
TURMA: XXXVIII
Nenhum comentário:
Postar um comentário